“A insensatez que você fez
Coração mais sem cuidado
Fez chorar de dor
O seu amor
Um amor tão delicado
Ah, porque você foi fraco assim
Assim tão desalmado
Ah, meu coração quem nunca amou
Não merece ser amado
Vai meu coração ouve a razão
Usa só sinceridade
Quem semeia vento, diz a razão
Colhe sempre tempestade
Vai, meu coração pede perdão
Perdão apaixonado
Vai porque quem não
Pede perdão
Não é nunca perdoado”
(Insensatez – Tom Jobim e Vinícius de Moraes – 1961)
Sumário:
Introdução
I- A Constituição enclausurada (quebre o vidro)
1. Os direitos dos trabalhadores aprisionados e a posição da grande mídia
2. O avanço do Estado de exceção e risco do autoritarismo
3. Direitos sociais, políticos e humanos ameaçados
4. Os seres humanos em teste
II- A culpa é de quem?
1. Rebatendo o otimismo do passado
2. A armadilha do 3º turno
3. Por uma agenda propositiva
4. Combatendo o otimismo do presente
5. Uma “Cruzada” contra o conhecimento
6. As explicações econômicas da crise
7. Os precedentes neoliberais dos governos petistas
8. Para além do econômico
9. A multiplicidade da responsabilidade
10. A ausência de um projeto
11. O ultra neoliberalismo baseado em retrocessos
12. O peso do escravismo na aversão histórica aos direitos trabalhistas
13. A lógica do mal menor a serviço da ineficácia e da destruição dos direitos trabalhistas
III- Até que ponto vai o compromisso com a defesa da democracia?
1. Resistir não é preservar injustiças
2. Interesse econômico versus compromisso social
3. As instituições e a defesa da democracia e dos direitos constitucionais
4. A destruição do Direito do Trabalho em pauta e o risco do progressismo conservador
5. Os poderes instituídos, o poder econômico e a grande mídia vão defender a democracia em toda a sua amplitude?
IV- Conclusão
Introdução
Com a difusão dos discursos curtos e midiáticos foi se perdendo, já há algum tempo, o apetite pela compreensão. Dentro da lógica imediatista da comunicação e também como resultado da ampliação das vias de acesso à explicitação de falas, as pessoas tenderam a restringir suas leituras aos textos que, falando pouco, presumivelmente atenderiam ao seu interesse imediato, concreto e instrumental.
A necessidade da certeza e do “conhecimento” fácil impulsionou, inclusive, uma atitude arredia e repulsiva à contrariedade, que, diante da perda da prática do debate, não deve ser apenas rebatida e sim destruída, adotando-se como tática para se atingir esse objetivo a desqualificação do emissor. A internet, com a especialização e o aprimoramento das “matérias” destrutivas, se transformou em um veículo excelente para a desconstrução do conhecimento e da condição humana, a tal ponto que são maiores os acessos a endereços com as temáticas destrutivas do que aos que procuram trazer alguma informação ou reflexão.
Como efeito de tudo isso, o ato de escrever sobre a conjuntura passou a ser uma atividade de grande risco, que nem mesmo os cuidados expostos na receita do Betinho[i] são suficientes para evitar. Em estratégia de proteção, reforçaram-se os nichos de pensamento e os textos e as falas passaram a se direcionar a públicos determinados, compostos por pessoas que, já se sabia, esperavam certo conteúdo. Tornam-se regra, como se diz, os “discursos para convertidos”.
O preço pago foi um forte abalo na capacidade de reflexão, na disposição para o diálogo e, ao mesmo tempo, na humildade da dúvida.
Muitos valorosos estudiosos contemporâneos, dentre cientistas políticos, filósofos, sociólogos, economistas, têm contribuído ainda assim para a nossa apreensão do real. No entanto, cabe também a reflexão se os textos, dado o apelo ao convencimento, não acabam trazendo afirmações peremptórias e certezas baseadas em generalizações, buscando inserir as abstrações na realidade mais do que explicá-la. As categorias pré-concebidas chegam, inclusive, em muitas situações, não só a reduzir toda a complexidade do mundo a fórmulas extraídas de uma lógica quase programática, como também a projetar o futuro, que é, para abarcar todas as angústias, quase sempre catastrófico.
A gente olha para o lado, conversa com pessoas, sente na pele, fica perdido e se depara com algumas explicações que, com todo o respeito, só servem para nos deixar ainda mais “conscientes” da nossa ignorância: “trata-se, meramente, do efeito de uma onda conservadora que se alastra pelo mundo”; “não é nada além do que mais uma crise do capital”; “é o resultado da reestruturação produtiva”; e por aí vai...
Esses hermetismos intelectuais, vendo tudo como integração lógica a uma grande engrenagem e que até chegam à soberba das certezas com relação ao porvir, têm desprezado a ação e a vontade humanas tanto como fator de explicação dos fenômenos sociais quanto como elemento de movimentação da história. A produção intelectual que se completa em si mesma e que se satisfaz com a coerência interna dos argumentos e a solidez da bibliografia utilizada abandona o desafio do aprendizado constante e da disputa pela consciência, abrindo o espaço para a captura das mentes pelo imediatismo, o egoísmo e o individualismo, que, sem contestação eficaz, dominam o mundo. Nem isso, entretanto, consegue gerar qualquer perplexidade, pois se diz que essas reações já estavam consignadas nas tendências estruturalmente identificadas. Afastam-se, assim, no plano teórico, as responsabilidades pessoais pela construção da realidade, enquanto que, na realidade, as ações humanas, para o bem ou para o mal, mudam o mundo.
E quando o locutor se atrela de forma mais direta à política eleitoral (o que se dá na maioria dos casos, dado o domínio da perspectiva burocrática do convívio) as coisas se complicam ainda mais porque o discurso não busca apenas o mérito pessoal de conseguir se posicionar com segurança acima das nossas incertezas, mas também carrega a intenção velada de transformar em real ou destacar apenas o que interessa aos propósitos eleitorais de sua sigla que são, inclusive, na lógica da mesma perspectiva burocrática, fixados a quatro paredes por seres “iluminados”, sem a necessária interação social.
Nesse contexto, os discursos deixam a busca de explicações e se destinam a engrossar fileiras de um programa já estabelecido. E como a estratégia de poder institucionalizado foi o único alcance que se destinou à política, o que se produziu não foi meramente uma disputa pela narrativa, mas um processo de deturpações fáticas para fins de constituir, de um lado, os aliados, identificando, do outro, os inimigos.
Esse distanciamento da realidade, que gerou um fosso das práticas e dos discursos políticos com relação à vida percebida pelas pessoas, desacreditou a política e desmoralizou a intelectualidade, abrindo espaço à cultura do whatsApp, que retroalimentou e massificou as polarizações que interessam a grupos específicos.
Assim, chegamos a esse momento em que, sem a capacidade de compreensão, as incertezas e o medo tendem a nos dominar e a impulsionar nossos atos ou, mais propriamente, as nossas omissões.
O que estou vendo, conversando com pessoas, lendo notícias e os comentários que lhes acompanham, é uma dificuldade tremenda de apreensão dos fenômenos históricos, sociais e culturais, fazendo com que as reações não sejam fruto de uma formulação racionalmente embasada. Mas é ainda pior porque, de fato, atingimos o momento em que o desprezo pela razão e o compromisso com a verdade das proposições nos conduziram à situação tragicômica em que não se acredita nem mesmo no que está sendo dito e o que se diz não precisa, assumidamente, guardar qualquer compromisso com a realidade palpável ou com os próprios atos.
Esse não é um problema exclusivamente nosso, dos brasileiros e brasileiras, ou que se tenha produzido apenas no momento presente. Não é de hoje, aliás, que venho advertindo para o fato de que o medo da política, da liberdade de expressão e da contrariedade nos empurraria para uma lógica da dissimulação, do disfarce, do desrespeito, da animosidade e, consequentemente, do ódio, que é alimento da falência democrática[ii], sendo que os maiores prejudicados seriam os trabalhadores[iii] [iv] [v].
Não estou falando sobre um ou outro lado, especificamente. Aliás, não estou falando sobre lado nenhum. Estou tentando falar dos seres humanos, para seres humanos.
O fato é que atingimos o ponto em que mais do que explicações geniais e soluções mirabolantes o que precisamos é de sensatez. Da sensatez de tentar explicar o que estamos vivenciando sem apegos a interesses não revelados. Esse, ademais, é o compromisso mínimo que se espera da academia.
Não tenho, por certo, a apreensão da totalidade e a pretensão de trazer explicações e soluções para todos os problemas. Corro, ainda, o risco de reproduzir todos esses mesmos problemas, inclusive de generalizações, que são, ademais, características de nosso tempo. Por isso, deixo claro que minha manifestação se dá, como sempre, dentro de uma perspectiva restrita no campo do Direito, e, mais especificamente, no sentido de tentar examinar os efeitos produzidos nos direitos dos trabalhadores, mas tendo a convicção de que, no presente momento, só o ato de se pronunciar já atende ao propósito de não sucumbir à avalanche do medo.
Para tentar conferir alguns elementos que sirvam ao enfrentamento desse desafio, valho-me de três chamadas jornalísticas publicadas recentemente e que oferecem uma síntese razoável do momento presente: 1) a capa da Revista Veja, de 31/10/18; 2) a capa da Revista IstoÉ, de 31/10/18 (mas que, de fato, foram publicadas, ambas, em 26/10/18, antes da eleição, portanto); e, 3) o editorial da Folha de S. Paulo, publicado no dia 29/10/18 (um dia após a eleição).
I- A Constituição enclausurada (quebre o vidro)
Na Capa da Revista Veja, acima referida, a Constituição da República aparece em uma caixa de emergência, com a chamada: “Em caso de emergência, quebre o vidro”.
O conteúdo da reportagem foi no sentido de que competiria às instituições e, notadamente, ao STF, valerem-se da Constituição para combater as ameaças à democracia, fazendo uma ressalva, que me pareceu meramente retórica, já que desacompanhada de qualquer argumento concreto a respeito, de que com relação aos arroubos autoritários do PT a resistência das instituições teria sido eficiente.
O ato falho da Revista não lhe permitiu perceber a revelação de que, de fato, até agora, durante 30 anos, a Constituição foi colocada em um recipiente fechado, não tendo sido acessível para a imensa maioria da população brasileira.
O pacto firmado em 1988, sobretudo no aspecto da efetividade dos direitos sociais e da ampla redemocratização, se pensarmos na perspectiva dos movimentos sociais em luta pela efetividade desses direitos, foi rompido logo na sequência, a partir de 1988 mesmo[vi], com intensificação do ataque na década de 90[vii], e sem reversão sensível nas duas primeiras décadas dos anos 2000[viii].
Os direitos trabalhistas constitucionalmente consagrados não foram completamente efetivados, mesmo com o aumento da estrutura e do campo de atuação da Justiça do Trabalho, do Ministério Público do Trabalho, da advocacia trabalhista e da auditoria-fiscal do Ministério do Trabalho, tamanha foi a resistência, inclusive dos meios de comunicação em massa, à implementação do estágio de cidadania preconizado pela Constituição Federal.
Mesmo essas instituições, com apoio de boa parte da academia, foram bastante restritas quanto às potencialidades de melhoria das condições sociais e econômicas projetadas pelos direitos trabalhistas. As greves, assim como os demais movimentos sociais, voltados ao cumprimento das promessas constitucionais, continuaram sendo reprimidas também judicialmente.
Foi assim, por exemplo, em junho de 2013[ix]; na Copa das Confederações (2013)[x]; com o movimento dos atletas profissionais de futebol, o Bom Senso[xi]; nas mobilizações contra a Copa, em 2014[xii]; nas diversas greves e atuações coletivas de 2015[xiii]; nas greves dos garis em 2014[xiv] e 2015[xv]; nas greves de professores[xvi]; nas mobilizações estudantis, incluindo a dos secundaristas[xvii].
Na Universidade de São Paulo, por exemplo, a escalada autoritária[xviii], composta de violência e atos de perseguição a estudantes e professores que atuavam pela ampliação das vias democráticas na entidade e contra a privatização e a precarização das condições de trabalho, foi abertamente aplaudida pela grande mídia e contou com o silêncio de tantos os que hoje bradam pela defesa da democracia[xix].
1. Os direitos dos trabalhadores aprisionados e a posição da grande mídia
Em quase todos esses momentos a grande mídia nunca falou da necessidade de se respeitarem as normas constitucionais, tanto no que tange à efetivação dos direitos sociais propriamente ditos, fixados nos artigos 6º a 9º da Constituição Federal, quanto no que se refere aos direitos liberais clássicos, notadamente o da liberdade de expressão e de mobilização para a defesa de interesses abarcados pela própria ordem jurídica.
Mas, se mobilizar pela melhoria da educação pública; por melhores salários; por melhores condições de vida e de trabalho; por moradia; por saúde pública; não é crime. Trata-se de um direito consagrado na Constituição.
Entretanto, o que se tentou construir midiaticamente ao longo dos últimos 30 anos foi uma interdição à compreensão do que consta no pacto firmado em 1988, buscando tornar inviável qualquer reivindicação dos direitos ali fixados.
E muitos veículos de informação não se limitaram a isso, isto é, não se contiveram em “criminalizar” as mobilizações sociais, contribuindo para o aniquilamento concreto da democracia, pois democracia não é apenas uma ideia, é prática constante. Assim, também ecoaram, legitimando-os, os ajustes feitos a quatro paredes (sem qualquer respaldo popular ou acadêmico) para destituir um governo eleito e colocar em seu lugar um que se comprometesse em levar adiante a pretensão específica de grandes conglomerados econômicos das reformas previdenciária e trabalhista. Esta última, inclusive, se concretizou, passando por cima de todos os postulados democráticos e formas institucionalizadas na Constituição, para efeito de elaborar e aprovar uma lei com esse conteúdo e com a amplitude que teve.
A “reforma” trabalhista provocou um enorme retrocesso nos direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras e também na sua condição de cidadania, já que uma das estratégias estabelecidas para se atingir o objetivo abjeto da redução do custo do trabalho por meio da eliminação de direitos foi a criação de obstáculos de acesso ao Judiciário.
Os direitos constitucionais dos trabalhadores, incluindo o de terem acesso à justiça, foram afrontados sob o aplauso da grande mídia e sem qualquer repúdio da sociedade que foi às ruas brandindo as bandeiras da moralização e da legalidade[xx].
Mas a grande mídia, frente a isso foi hipócrita, ou (no mínimo) irresponsável: de um lado, ajudou a desmontar as mobilizações sociais, dando foco apenas nos transtornos que geram, e minimizou e até mesmo criticou as políticas sociais; de outro, enfatizou as mazelas sociais, como o trabalho escravo, a pobreza nas ruas etc. Ou seja, destruiu a possibilidade de melhorar a situação miserável do povo, e em seguida denunciou a situação miserável desse mesmo povo e isso também vale para a defesa que tem, agora, tem feito das liberdades civis, como se, ao longo dos tempos, também não tivesse contribuído para a opressão.
Houve, portanto, por obra e por omissão de uma comunidade inteira, a desconstrução constante da Constituição, que, por conta disso, acabou sendo colocada em uma redoma, enquanto se dizia que estavam passando a limpo e moralizando o país[xxi].
2. O avanço do Estado de exceção e risco do autoritarismo
O apoio incondicional da grande mídia e da opinião pública massificada à desconstrução do projeto constitucional, baseando-se na lógica de que os fins justificavam os meios, permitiu que o Estado de exceção se ampliasse na nossa realidade[xxii], atingindo o ponto culminante da criminalização da política. Neste aspecto, muitos já apontavam isso a partir do desenvolvimento de uma justiça política no Brasil, identificada pela “utilização indevida do processo para fins políticos, via de regra, por artifícios manipulatórios ou atos que invertem a matriz principiológica do direito ou do processo, para destruir os inimigos políticos”[xxiii].
Com a destruição das bases constitucionais realizada pelas próprias instituições responsáveis pela sua defesa – ou, mais propriamente, pelas pessoas que as integram – e admitidas como válidas pela grande mídia e por boa parte da população, sob o argumento de que, diante de um histórico real de impunidade, tudo valeria para moralizar a política e acabar com a corrupção, adentrou-se, de forma aberta, ampla e até assumida, ao estágio mais elevando ainda do Estado de exceção, no qual os ataques explícitos às instituições, à liberdade de imprensa, aos Direitos Humanos, aos direitos trabalhistas e às liberdades democráticas, inspirando sentimentos e práticas fascistas de intolerância e de ódio acabaram sendo referendados eleitoralmente.
Verdade que o resultado da eleição está bastante ligado ao “antipetismo”, sentimento que conduziu muitas pessoas a admitirem qualquer tipo de aliança para verem livre do governo os representantes do Partido dos Trabalhadores, mas o processo histórico de formação do Estado de exceção e da intolerância, do qual participou o próprio Partido dos Trabalhadores, não nos autoriza a dizer que se esteja diante apenas de uma negação ao PT.
É inconteste que o Presidente eleito, com um discurso de extrema-direita, obteve a maioria dos votos e ganhou a eleição. Isso não pode ser negado por qualquer tipo de raciocínio típico de fuga da realidade e reflete um reforço do sentimento conservador na sociedade brasileira.
Porém, cumpre não diminuir a influência negativa – para todos e, sobretudo, para o próprio debate democrático – das “Fake News”, que impulsionaram a condução do processo político em desapego da razão, do conhecimento e da formação de pactos que sejam apoiados na verdade de propósitos, fragilizando a democracia, mas também o próprio alicerce político do novo governo. Uma eleição nacional não pode ser tratada como uma disputa gremial ou reduzida a interesses particulares de um grupo de pessoas. Daí porque, aliás, a política necessita de partidos políticos, com o requisito essencial de que expressem, com clareza, a sua ideologia e os seus programas.
Além disso, não se pode afastar o próprio papel da grande mídia na campanha muito forte que fizeram em favor do antipetismo, dando foco exclusivamente – de forma seletiva - aos fatos de agentes do governo acusados de corrupção.
Assim, entre os 57.797.847 eleitores do novo Presidente há de tudo um pouco. Há pessoas ideologicamente conservadoras, que se alinham ao seu discurso. Mas há, também, as que se desiludiram com os governos petistas; que veem na mudança uma oportunidade para moralizar a política; que se sentiam excluídas e assumiram o voto como uma forma de protesto; e as que, na linha econômica, consideram que a liberdade ampla de mercado deve ser implementada e que o governo do candidato escolhido teria condições de levar adiante esse projeto – sendo que dentre essas pessoas se podem incluir as grandes empresas, que não votam, mas fazem campanha.
Lembre-se, por exemplo, que o colégio eleitoral que elegeu Bolsonaro foi o mesmo que deixou de eleger muitos deputados e senadores que apoiaram abertamente a “reforma” trabalhista[xxiv].
Ademais, uma análise geopolítica exigiria, também, verificar a diversidade de posicionamentos por região, vez que o Brasil é um país continental.
Por outro lado, não se pode exagerar no otimismo frente a esses dados e utilizá-los para uma lógica de “terceiro turno”, não admitido, inclusive, a existência de um avanço do conservadorismo/reacionarismo (ou, do ultra neoliberalismo – se é que uma coisa pode caminhar sem a outra) ou, até mesmo, chegar ao ponto de considerar que os números refletem a existência de um processo revolucionário em curso[xxv].
Ora, dentre os 47.040.906 que votaram no candidato do PT há, igualmente, de tudo um pouco. Há os militantes; os simpatizantes; os que acreditam que o PT fez os governos possíveis. Mas há, também, os que votaram no candidato do PT não como uma forma de concordância com o que representaram ou realizaram os governos petistas, e sim como uma objeção aos valores que o outro candidato expressava nos planos humano, político e econômico.
E não se pode deixar de admitir que há poucos meses da eleição, em agosto de 2018, antes de barrada a sua candidatura, Lula aparecia com 37% das intenções de voto, com possibilidade plena, portanto, de vencer ainda no primeiro turno, o que é indicativo, ao menos, do reconhecimento de parcela muito considerável da população a respeito dos benefícios econômicos e sociais experimentados no período de 2003 a 2012[xxvi].
E é sempre bom lembrar que 42.466.402 pessoas não votaram nem em um, nem em outro candidato.
3. Direitos sociais, políticos e humanos ameaçados
Os números da eleição não explicam tudo e é por demais exagerado tentar entender o país a partir de uma eleição, até porque, resumindo em uma paródia, “a vida não se resume em eleições”. Há uma enorme complexidade a ser desvendada, que carrega elementos ligados à crise econômica, a preferências pessoas, a desilusões e a esperanças, por que não?
Pode-se, até, sem entrar na armadilha do “terceiro turno”, que, inclusive, desmobiliza e joga todas as energias para um futuro completamente incerto, discutir, com boa dose de razão, se a eleição correspondeu a um apoio irrestrito às políticas conservadoras expressas pelo, agora, Presidente eleito, até porque é possível verificar o fortalecimento de muitos laços de solidariedade e de mobilização social, ainda que em uma lógica defensiva.
Neste sentido, mesmo não querendo parecer portador de um otimismo irracional, não consigo deixar de registrar a enorme quantidade de movimentos, organizações e produções manifestadas na realidade brasileira, nos mais variados segmentos, de cunho cultural, artístico e de militância política, voltados à difusão e à construção de valores sociais e humanos, que, concretamente, impedem que o pessimismo seja assimile, de forma generalizada, sem atrair contrariedades.
Certamente, não podemos pintar um quadro tenebroso da sociedade brasileira a partir do resultado das eleições.
De todo modo, o processo histórico em curso há décadas nos obriga a reconhecer que sociedade brasileira não tem sido, historicamente, acolhedora para milhões de pessoas.
Lembre-se, a propósito, da situação de miséria em que vivem 52 milhões de pessoas[xxvii], sendo 14,8 milhões em situação de extrema pobreza (55% no Nordeste)[xxviii]; da violência institucional, e em crescimento, contra negros e negras[xxix], inclusive no trabalho[xxx] [xxxi]; da opressão histórica contra as mulheres[xxxii], inclusive no trabalho[xxxiii]; do preconceito contra a comunidade LGBT[xxxiv]; da violência no campo[xxxv]; da baixíssima expectativa de ascensão social[xxxvi]; e do sofrimento urbano pelo qual passam cotidianamente milhões de pessoas com a precariedade do transporte público[xxxvii], as filas dos serviços públicos de saúde[xxxviii]e a precariedade das escolas públicas[xxxix].
Cumpre lembrar, também, que já caminhávamos na direção da consagração do Estado de exceção, caminhando a passos largos em direção do autoritarismo[xl], com a criminalização dos movimentos sociais, a imposição de silêncio aos opositores, o estabelecimento da censura, inclusive, no âmbito da magistratura e, principalmente, nas salas de aula e nas universidades, que culminou, inclusive, com forte interferência judicial no processo político, que atingiu a própria eleição nacional.
Se a democracia já vinha sendo desprezada e este desprezo abriu espaço para um estágio assumido de “ruptura do processo democrático”[xli], que se pôs a serviço da retração dos direitos sociais (vide a “reforma” trabalhista), e se o novo governo se elegeu com um discurso avesso às liberdades democráticas, inclusive de índole ultra neoliberal, tecendo loas à tortura, o risco da consagração de um regime autoritário não pode ser descartado, até para que não se consolide.
Essa preocupação se justifica, sobretudo, por conta dos diversos casos de violência já manifestados, cabendo entender como tal, por exemplo, os ataques à liberdade de ideias, que, segundo reportagem do jornal Folha de S. Paulo, acumulam 41 casos em um ano, sendo a maior parte proveniente da própria Justiça[xlii], de quem se espera a defesa da democracia e dos direitos fundamentais e sociais.
4. Os seres humanos em teste
Se nem todos (e quero crer que esteja falando, inclusive, da grande maioria) os eleitores do novo governo professam sentimentos ou corroboram práticas antidemocráticas, não se pode negar, diante do processo histórico verificável no Brasil há anos, que a debilitada democracia nacional está em risco, com abertura, consequentemente, ao autoritarismo, ao fascismo e ao macarthismo, representado, este último, pela perseguição aos adversários, que tenham envolvimento político ou que simplesmente manifestem sua opinião de contrariedade e de crítica.
Assumir a existência desse risco está longe de corroborar as práticas de corrupção ou de engrossar o coro de que as pessoas de direita, que expressam valores liberais clássicos, ou mesmo supostamente moralistas, e que, por conta disso, acreditaram na alternativa eleitoral que se apresentou, avalizam sentimentos de índole fascista e suas práticas. Aliás, acho um grave erro estabelecer essa polarização que rótula as pessoas para além do que elas efetivamente expressam.
Mas é, igualmente, um grave erro, primeiro, fingir que a diversidade de visões de mundo não existe; segundo, não reconhecer que, a despeito do debate democrático entre essas diferentes visões, no presente momento, por múltiplas razões, libertou-se a animosidade humana, que é, antes de tudo, contrária à racionalidade e a sensatez; e, terceiro, recusar que se está integrado a essa histórica, seja como protagonista, seja como alvo.
E se não é possível, a partir da análise conjuntural do resultado das eleições, dizer qual é a visão de mundo majoritária da nação brasileira, a forma como nos posicionarmos diante do que pode vir pela frente será determinante para sabermos quem efetivamente somos.
De saída, é essencial entender que se a supressão de direitos sociais, a falência de serviços públicos, a opressão, o arbítrio, a eliminação das formas democráticas de organização e de manifestação geram dor e sofrimento de forma mais direta aos que estão social, cultural e economicamente fragilizados, assim como aos que, por uma avaliação arbitrária, sejam considerados “desajustados”, com a consolidação e a disseminação da lógica da intolerância, da perseguição, da repressão e da imposição do silêncio, todos e todas, indistintamente, acabam sendo atingidos. Aliás, mesmo quem é beneficiado se desumaniza.
Na perda da racionalidade incentivada pelo medo, inicia-se um processo que corrompe os valores humanos.
Em texto publicado em junho de 2013, indaguei: “A democracia está em jogo. Sairemos vencedores?”[xliii]
Agora, em 2018, é o caso, portanto, de questionar: A nossa condição humana está sendo posta à prova. Passaremos no teste?
II- A culpa é de quem?
Há, como visto acima, muitos responsáveis pela situação a que chegamos de fragilização das instituições democráticas e de difusão e aceitação pública de discursos contrários aos Direitos Humanos e Sociais, sendo, por isso, imprópria a capa da Revista IstoÉ, que traz a chamada: “E o PT criou Bolsonaro”, buscando, assim, colocar sobre o PT toda a responsabilidade pela eleição do candidato do PSL, pressupondo, de modo ainda mais impróprio, que os eventuais efeitos negativos dessa situação serão experimentados unicamente pelos “petistas”.
A culpabilização irrefletida não se justifica ainda mais porque uma das maiores responsabilidades (e não culpa, que é um conceito mais moral do que histórico) do PT nessa história toda foi, exatamente, a de ter tentado atrelar, de forma indissociada, a defesa da democracia aos seus propósitos eleitorais. Foi assim no impeachment, foi assim na “reforma” trabalhista, foi assim na eleição presidencial e os resultados foram o de afastar das ruas e das diversas formas de manifestações muita gente que queria defender a democracia, os direitos e as instituições, mas que não queria ser tida como alguém que corroborava a forma de atuação política dos governos petistas.
Esse aparelhamento do discurso, atrelando a defesa da democracia a interesses específicos, sequestrou a esquerda, primeiro, interditando o senso crítico e, depois, exigindo apoio e aliança, de modo, inclusive, a proporcionar a narrativa de uma absolvição histórica, a partir de um revisionismo no qual as conciliações promiscuas realizadas e a efetivação de políticas sociais voltadas ao consumo, desvinculadas de melhorias nas condições de vida e de trabalho dos trabalhadores, além de arredias a práticas democráticas, fossem simplesmente apagadas. A perspectiva exclusivamente partidária, no sentido eleitoral, gerou lógicas tão pervertidas que se adentrou, agora, um debate fratricida de acusações e insinuações pessoais, por atos e omissões, que não levam a lugar nenhum.
Ao longo dos anos, essa prática, que, a partir de determinado momento, preocupada com a preservação da estabilidade do governo, se voltou a tirar a esquerda das ruas em 2013, que massacrou a rebeldia dos jovens e repudiou as lutas sociais e a organização da classe trabalhadora por melhores condições de trabalho, burocratizando a política, acabou abrindo espaço ao crescimento do conservadorismo, assim como ao esvaziamento das utopias.
1. Rebatendo o otimismo do passado
Uma visão excessivamente otimista do período de 2013 a 2016 dirá que se produziu a “democracia possível” dentro de um país ainda oligárquico e que mais do que se fez seria insustentável. Dirá, também, que se consagrou o período de maior inserção social e de experiência democrática na história do país. Mas há evidentes problemas nessa avaliação.
Primeiro, a mobilidade social, como se sabe, foi calcada no consumo, e a estagnação do modelo gerou as crises econômicas e políticas que acabaram vitimando os direitos sociais, a política e a democracia.
Segundo, a opção foi bastante limitada, significando, em concreto, uma desconsideração do pacto firmado na Constituição de 1988, no aspecto da efetiva promoção de um Estado Social Democrático no país. Mais do que políticas assistencialistas, que, com a crise de confiança e de produção, gerou desequilíbrio fiscal, o que se precisava experimentar era uma política de efetivação dos direitos sociais consagrados na Constituição, notadamente no que se refere aos direitos trabalhistas. Evidente que esse descompromisso não foi só dos governos petistas, atingindo, igualmente, várias outras instituições públicas e privadas e é certo, também, que já estava em curso, com bastante intensidade, desde final da década de 80. Mas o direcionamento dado neste sentido na era neoliberal não foi revertido e a esperança que se tinha, em 2002, era a de que o Partido dos Trabalhadores o fizesse.
E, terceiro, como dito, essa desconsideração do pacto constitucional, a ausência de um enfrentamento concreto para a superação das dificuldades estruturais, da adoção da velha política (“mensalão”, com preocupação imediata de sucesso em reeleições sucessivas), a não explicitação clara e pública de qual seria o projeto a ser implementado, conclamando a sociedade como um todo para dele participar (o que, ademais, já estava todo consignado na própria Constituição, sobretudo no aspecto da Seguridade Social) e a difusão de uma postura de diminuição da importância dos movimentos sociais, notadamente, no âmbito da ação sindical, para não gerar instabilidade no governo, desenvolvendo uma prática em que todas as ações deveriam se voltadas às estruturas e aos interesses do próprio governo, dentro de uma lógica de preservação do poder de uma grupo fechado e específico de pessoas, tudo isso acabou burocratizando a vida, engessando a democracia, abandonando o diálogo efetivamente popular e anestesiando as utopias.
2. A armadilha do 3º turno
O grande risco que se corre agora, no momento em que a recuperação da razão se faz urgente, é o de que se tente manter a lógica da irracionalidade burocrática, desviada da realidade, para atender a objetivos restritos não revelados e assim inaugurar um terceiro turno para a eleição, pelo qual, inclusive, se visualize em cada erro do novo governo um argumento para vangloriar os governos petistas.
Fernando Haddad, logo após o resultado da eleição, no discurso então proferido, chegou a ensaiar uma narrativa neste sentido, fazendo menção, já naquele instante, à eleição de 2022 e colocando-se como a alternativa para a defesa da democracia. Assim, a defesa da democracia, novamente, se tornaria uma estratégia para alavancar os interesses do partido.
Essa captura eleitoral tem sido altamente lesiva à formulação da razão crítica e neste instante pode se tornar uma condenação sem precedentes, pois tende a afastar a responsabilidade que todos temos, seja pela ocorrência dos fatos que nos conduziram até aqui, seja pela busca e o implemento de soluções. Até se compreende que assim pensem e ajam os partidos, mas à produção acadêmica impõe-se a busca do conhecimento desapegada de interesses partidários.
Neste sentido, sinto-me bem à vontade para dizer que tentar fazer crer que é do candidato eleito toda a responsabilidade pelo maior acolhimento de valores conservadores no seio da sociedade brasileira só se justifica dentro de uma perspectiva que se mantém meramente eleitoral porque, de fato, não resiste a uma análise em que as questões históricas sejam postas e debatidas.
E cumpre não afastar a responsabilidade da academia, que devia ser propulsora do conhecimento e estimuladora do saber, mas que, por razões diversas, de forma mais evidenciada, ou se manteve alheia a tudo isso, colocando-se em outra dimensão, ou, muito preocupado em defender ou atacar a política econômica e social oficial, produziu um pensamento instrumental, que, para cumprir esse papel, se expressava de forma estigmatizante, excludente e, por vezes, até ofensiva.
Fato é que, com todas as ressalvas já feitas, não se pode desconsiderar ou diminuir retoricamente o avanço do conservadorismo, acoplado, em certa medida, a um movimento, reproduzido por muitos, de intolerância, que, não sendo obra exclusiva de uma pessoa, para ser um enfrentada requer bem mais do que o raciocínio simplista, de índole eleitoral, de que bastam as urnas, em 2022.
Aliás, é importante dizer: quando se aponta a existência de um problema não se está falando da derrota eleitoral do Partido dos Trabalhadores. Longe disso... O problema, que não pode ser negado, é que o Presidente eleito expressou um discurso extremista que a maioria dos eleitores brasileiros, por múltiplas razões, quis ouvir e com ele se identificou, integral ou parcialmente. E o problema não é somente a expressão desses valores, mas, principalmente, o de se ter desenvolvido um ambiente social propício ao acolhimento amplo de um discurso ultra neoliberal, na esfera econômica, e de extrema-direita, no campo das relações humanas.
Um ambiente em que a destruição completa das instituições públicas, dos direitos sociais, das políticas sociais, do meio ambiente, do conhecimento e da democracia é facilmente acolhida. Onde, também, chega-se a invocar o direito de agredir, ofender, discriminar e achar a tortura um ato natural e justificado, indo-se até o ponto de acreditar que se possui o direito de “corrigir” ou “punir”, mediante violência, os que pensam, agem ou adotam culturas, crenças ou ideologias diferentes.
3. Por uma agenda propositiva
É necessário tentar compreender como foi possível chegar a uma sociedade em que tais valores podem ser generalizados. Mas é essencial, também, vislumbrar quais possam ser as saídas.
Neste aspecto, já deixo claro que não possuo uma fórmula mágica para isso, mas, ao menos, expresso posicionamentos firmes no sentido de que não se consertam as instituições, destruindo-as, e de que não se caminha para frente, dando passos em direção ao passado e muito menos para o além.
Devemos empreender esforços para compreender, histórica e dialeticamente, a realidade vivida e buscar soluções a partir das experiências concretas.
Assim, só se resolvem os problemas que envolvem a elaboração e a efetivação de programas progressistas, desde que se considerem que devam ser defendidos, levando-se adiante esses programas, partindo da identificação dos seus problemas e chegando à formulação de propostas reais e honestas de solução, sendo que um dos pressupostos básicos dessa honestidade de análise é o reconhecimento público das limitações das proposições.
Fato é que somente se solucionam os entraves da democracia, com mais democracia; da política, com mais política; do conhecimento, com mais conhecimento; da liberdade de expressão, com mais liberdade de expressão...
Por outro lado, com relação às ideais que se considere que nos remetem a um passado que devia estar superado, exige-se o combate, sobretudo, com a expressão do seu avesso: a intolerância, com mais tolerância; o ódio, com mais amor; a violência, com mais paz; a opressão, com mais liberdade...
Parece-me relevante a prática do aprimoramento e do aperfeiçoamento, não necessariamente dentro das mesmas chaves de pensamento e até de propósitos, cabendo, pois, o acolhimento de novas realidades efetivamente evolutivas, dentro de um pressuposto, ao menos para mim essencial, que é o da construção de uma sociedade em que se possa usufruir, concreta e materialmente, da liberdade e da igualdade, e se relacionar de forma solidária, não discriminatória e não preconceituosa.
Dentro desse contexto, de nada valem as subjetivações. Insisto, pois, em afirmar que não cabe ao candidato eleito a responsabilidade integral por esse quadro, embora não se possa, claro, apagar da história a sua responsabilidade por tê-lo alimentado, sendo que os recorrentes pedidos de desculpas não são suficientes para evitar os danos provocados. E se não cabe ao PT, igualmente, toda a responsabilidade, também não se pode negar que, sem uma política efetiva de integração social, sem abandonar os parâmetros de um renitente projeto de poder, o PT deixou milhões de órfãos por aí.
Além disso, a todos nós, que não conseguimos compreender e explicar esse processo e tivemos limitações no agir, cabe uma parcela de responsabilidade, assim como esta também pode ser identificada no silêncio e na conivência “dos homens bons”[xliv].
De todo modo, pode haver um inegável lado positivo em tudo isso, vez que, diante de tantos assédios, não vinha sendo fácil preservar a dignidade e quem sabe com esses reconhecimentos explícitos se possa conferir maior liberdade ao pensamento e, consequentemente, revitalizar a dignidade.
4. Combatendo o otimismo do presente
E por que dar destaque a problemas, quando tantas pessoas comemoram o resultado eleitoral, afirmando que o Brasil, enfim, está se libertando dos corruptos e do atraso?
Porque o que se preconizou na eleição foi algo bem além de uma reformulação estrutural voltada à melhoria do País. O que se prometeu foi uma perseguição aos adversários, estimulando posturas de violência, de ódio, de intolerância e de censura, que, inclusive, começaram a se difundir na sociedade antes mesmo da conclusão da votação. E, mais ainda, o que se apresentou foi a implementação de um projeto ultra neoliberal, que tende a destruir instituições e direitos sociais, sendo que, para se efetivar, pode estimular o uso concreto das promessas antidemocráticas, passando-se por cima das garantias constitucionais.
Há, portanto, a necessidade de se estabelecer senso crítico a respeito da situação atual e de se manter vigilante com relação aos atos governamentais, sendo que as opressões a direitos, no contexto em questão, podem vir, inclusive, de atitudes de particulares, ou seja, sem qualquer participação de agentes do Estado, a partir da consideração, extraída do contexto conjuntural, de que se detém uma espécie de autorização oficial velada para tanto. A histeria coletiva, promovida nos momentos em que a racionalidade hiberna, produz suas próprias alegorias.
Insisto também em afirmar que esse não é o sentimento que se insere na enorme maioria do povo brasileiro, que é, sim, espirituoso, criativo, inventivo, inteligente, alegre, culto, ao mesmo tempo em que é sofrido, batalhador e, na sua maior parte, explorado.
Mas mesmo que não se possam verificar os pensamentos de extrema-direita na enorme maioria da população, com explanado acima, não são poucos aqueles que os vindicam, e o fazem, agora, de forma assumida. Além disso, diante do cenário político estabelecido, tendem a ser destes as vozes dominantes, que, ao se expressarem, geram efeitos reais (sofrimentos) nas vidas de tantas outras pessoas, independentemente da postura oficial que venha a adotar o governo, ainda mais se o chefe do Executivo, proferindo falas oficiais moderadas, mantiver, nas redes sociais, um discurso militante de conteúdo discriminatório e de confronto.
E não se pode desprezar, também, o potencial multiplicador dos discursos de massa, apoiados nas conveniências e necessidades de pertencimento.
Diz-se que todas essas falas, proferidas em campanha, teriam sido, como se diz, o mero anúncio de mais um, dentre tantos, estelionato eleitoral; mera retórica discursiva, como tem dito o candidato eleito e como muitos de seus eleitos, efetivamente, apostam que era.
Torce-se para isso, mas não se pode ficar na torcida; afinal a presunção, considerados os fatos, não pende em favor dessa tese e também porque os efeitos neste sentido podem se difundir mesmo sem a participação direta do governo. Assim, mais se afastará a lógica autoritária quanto mais, superando interesses pessoais imediatos e o medo, se insistir em preservar a liberdade de expressão, a disponibilidade para o diálogo e a disposição para reagir.
Todos esses reconhecimentos talvez só aumentem a parcela de responsabilidade do PT, no que se refere ao cometimento de desmandos no poder, que muito contribuíram para minar as utopias e o comprometimento de tantas pessoas, além de promoverem a desilusão, sobretudo entre jovens. Ainda assim me parece uma parcial visão da realidade histórica e que, no fundo, sem as devidas inserções de outros elementos, apenas alimenta o imobilismo e o reacionarismo disfarçado de novidade.
Independentemente da identificação de culpados, somados os fatores que servem a uma explicação dialética do momento presente, é real o risco de um abalo profundo das liberdades democráticas no Brasil, sendo que as bases sociais e institucionais de preservação da democracia e do Estado Democrático de Direito ainda precisam se identificar com este papel, até podem se mover em sentido inverso.
Uma grande avaliação a respeito será verificar até que ponto as pessoas que direta ou indiretamente elegeram esse projeto por aversão ao PT estarão dispostas a fazer concessões ao autoritarismo (caso se apresente efetivamente) para não terem que fazer a sua autocrítica e, até mesmo, se estarão dispostas a ver e ouvir, impondo-se a mesma avaliação com relação às instituições e entidades públicas e privadas.
Aliás, a mesma disposição para o diálogo, para ver, ouvir, reconhecer erros e aprender, precisa vir de todos, inclusive daqueles que se identificam como arautos do conhecimento e detentores das dores do mundo.
5. Uma “Cruzada” contra o conhecimento
O risco da disseminação da irracionalidade pode aumentar consideravelmente se aqueles que assumirem o poder se colocarem em uma espécie de “Cruzada” contra o conhecimento, produzindo revisionismo histórico para justificar o pensamento de extrema direita, chegando ao ponto, inimaginável anos atrás, de naturalizar a tortura, o genocídio e o extermínio dos “diferentes”.
Vide, a propósito, a fala da pessoa indicada para o cargo de Ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, no sentido de que o nazismo teria sido uma “ideologia de esquerda”.
A afirmação, embora não tenha tido, quero crer, a intenção de justificar o nazismo, ao tentar reverter toda a história e transformar os horrores do nazismo a uma questão meramente ideológica, acaba proporcionando a abertura de uma via perigosíssima na direção da reconstrução do nazismo. Lembre-se que o nazismo foi baseado em revisionismo histórico, em queima de livros, em massificação desviada da racionalidade e apoiada na figura de um mito.
O mesmo futuro Chanceler defende Donald Trump, tratando-o como um mito e, na mitologia, como explica Paulo Ghiraldelli[xlv], a razão e a história humana são desprezadas. Os mitos possuem uma ligação com Deus e por isso sabem o que fazer, sem a necessidade, portanto, de uma explicação racional ou histórica para os seus atos. Lembre-se que o candidato eleito no Brasil assim tem sido tratado. Mas lembre-se, também, da insistência petista na criação do seu mito, viciando as experiências republicana e democrática, fazendo com que, na cabeça de muitos, o que se produziu foi a substituição de uma mitologia por outra.
Na visualização imposta pela mitologia, as explicações baseadas na relação causa e efeito são totalmente desprezadas. O mito é uma narrativa em si, contrária à lógica.
E acredita-se no mito porque se quer acreditar e essa crença não é fácil de ser mudada, ainda que os fatos históricos, a lógica e a razão apontem para uma conclusão em sentido contrário. E quanto mais amplitude massificada o mito atinge, mais próximo ficamos do estágio extremamente grave da histeria coletiva.
Acho que o processo histórico em que fomos inseridos há décadas foi nos desviando da racionalidade e, agora, não querendo assumir isso e com medo dos efeitos traumáticos dessa admissão, passamos ao momento em que a destruição do conhecimento se torna uma pauta institucional, aproveitando-se, inclusive, para aprofundar a irracionalidade de um debate ideológico completamente vazio de conteúdo.
De fato, retomamos um período da história, que se acreditava já superado, quando, sem qualquer argumento lógico ou necessidade de demonstração empírica, se acusava o estrangeiro ou o adversário político de culpado pelos problemas sociais, econômicos e humanos vivenciados.
Instalou-se na fala de muitos brasileiros que os problemas do Brasil (e do mundo) são provenientes, de forma exclusiva, da corrupção, apontando-se, ainda, que a corrupção, como foi denunciada e somente visualizada midiática e judicialmente em um partido, identificado com a esquerda, é um problema da esquerda. Que bastaria, então, tirar esse partido do governo para eliminar a corrupção.
Mas quando se passa ao enfrentamento concreto dos problemas e se percebe que a questão é bem mais ampla e de difícil solução, passa-se, sem qualquer compromisso com a razão, à plenitude da retórica discursiva. É assim, por exemplo, que, diante da verificação de que a “reforma” trabalhista, que foi “vendida” como a saída para gerar 2 milhões de empregos não produziu esse efeito, se diz que a melhora será paulatina ou que não virá sem a efetivação de outras reformas ou, ainda, que os problemas estruturais do Brasil (sem dizer quais) são tão grandes que só em 20 (vinte) anos poderão ser corrigidos.
Chega-se, então, a uma difusão, generalizadamente aceita, de que nada do que se diz precisa ter correspondência com o real ou ser posta à prova.
Mesmo a corrupção, que foi a base de intensa mobilização social, cai no vazio argumentativo, que se utiliza para explicar o inexplicável quando os sujeitos envolvidos são agentes políticos do novo governo[xlvi] [xlvii].
E se não for nada disso, quanto melhor, caindo, então, no vazio todas essas advertências.
Mesmo assim é importante insistir porque, concretamente, os desvios de rumo do PT parecem estar longe de se constituírem a explicação de todo o processo histórico vivenciado desde 2013. O que se viu, em 2018, de forma mais evidenciada, foi uma forte guinada conservadora e não, meramente, um movimento contra a corrupção e. neste contexto, muitas das ameaças feitas durante a eleição podem encontrar campo fértil para se reproduzirem, tendo como mote, sobretudo, a censura e a supressão da liberdade de pensamento, até por conta da estratégia que se tem utilizado de “criminalização” da razão, do conhecimento e do estudo acadêmico.
Então, é essencial evidenciar os fatos históricos mais relevantes que nos auxiliam à tentativa de encontrar as razões para que se tenha atingido o momento vivido e avaliar quais são os seus riscos, reiterando, como dito inicialmente, que não tenho a pretensão de trazer a explicação absoluta e perfeita, ou mesmo respostas inquestionáveis.
6. As explicações econômicas da crise
De plano, parece importante afastar duas ideias bastante difundidas, mas que são muito pouco elucidativas. Primeira, a de que o PT “quebrou o Brasil”, fazendo transparecer, inclusive, que tudo estava a mil maravilhas na realidade nacional até 2002, antes do PT assumir o governo. Segundo, a de que a reviravolta política se deu porque o Brasil, e, em especial a classe média brasileira, é predominantemente escravista e estava incomodada com os pobres frequentando aeroportos e universidades.
A questão vai muito além dessa polarização e, quero crer, os aspectos econômicos foram bastante determinantes, ainda mais se considerarmos que até 2013, quando a economia andava bem o antipetismo não era uma força evidenciada na sociedade brasileira.
O problema é que as explicações econômicas não são muito simples.
Entre os especialistas, poucos negam os efeitos benéficos da política social realizada pelos governos petistas até 2013, com ampliação das universidades federais; maior facilitação das formas de acesso ao ensino superior; as iniciativas voltadas à moradia popular (em 2012, a ONU chegou a dizer que o Minha Casa Minha Vida era um exemplo para o mundo[xlviii]) e à fixação de uma renda mínima, medidas que, de um modo ou de outro, auxiliaram na recuperação do nível de emprego (que, em 2003, era de 12,4%; em 2013, chegou à menor taxa de desemprego da história, 5,4%[xlix] [l]), proporcionaram condição melhorada de sobrevivência a milhões de famílias que viviam abaixo da linha da miséria, também porque, no período, o salário mínimo teve aumento real de 70,49% (já descontada a inflação, de 2003 a 2013[li]).
Mas, na mesma perspectiva de uma análise honesta, desvinculada da “polarização política”, como preconiza a economista Laura Carvalho[lii], muitos economistas dizem que é necessário lembrar que essa política social foi baseada na lógica de consumo, favorecendo, intensamente, ao setor econômico, notadamente a bancos, empreiteiras, instituições de ensino e alguns segmentos da indústria (estes até 2011, que, tão logo se viram diante da possibilidade de diminuição de lucros, trataram logo de reivindicar a adoção de uma política econômica, conhecida por “agenda FIESP”, que propunha redução de juros; diminuição de custos do trabalho e isenções fiscais).
Os lucros dos bancos[liii] e das empreiteiras[liv], no período, foram recordes. O Minha Casa Minha Vida favoreceu a muitas construtoras e as obras realizadas pouco se preocuparam com um projeto urbano sustentável[lv].
Do pondo de vista educacional, ainda que se tenham criado 18 Universidades Federais e financiado 1,2 milhões pessoas pelo PROUNE, 1,3 milhões pelo FIES 1,3 e 6 milhões pelo PRONATEC, as corporações educacionais foram, de fato, as maiores beneficiadas. Importante fazer a ressalva de essa não foi uma política específica dos governos do PT, mas, neste período, produziu maiores efeitos (talvez em virtude ao maior índice e investimento).
Como explica Roberto Heloani:
“Fica evidente que o Estado brasileiro não tendo força política, tampouco convicção ideológica para investir, de fato, maciçamente, no ensino superior público, aplica o seu dinheiro, ou melhor, o dinheiro da população, em projetos do tipo Prouni (Programa Universidade para Todos) e Fies (Fundo de Financiamento Estudantil). Mas, por quê? A história nos ajudará a entender.
Vale a pena recordar que durante a década de 1970 ocorreu a primeira grande expansão do ensino superior, mas será na segunda metade dos anos 1990 que advirá a ampliação mais marcante, resultado do aumento da educação básica e consequente demanda por vagas reivindicadas pela classe média baixa e de baixa renda (FILHO, R., OLIVEIRA, R. e CAMARGO, R., 1999). Durante os dois governos de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), o setor privado continuou a todo o vapor, ou melhor, ditando regras. Era necessário, consoante a política educacional de ensino superior, ampliar a oferta de vagas, portanto. Contudo, esse crescimento descontrolado encontrou barreiras estruturais a partir da segunda metade da década de 1990. Ou seja, conjuntura econômica avessa, marcada por crises externas (1997-1999) que afetaram o Brasil, gerando alto desemprego e baixo poder aquisitivo da população, mormente daquela que, justamente, demandava o serviço ofertado por esse tipo de instituição de ensino superior particular. Consequentemente, a evasão se fez presente escoltada por considerável inadimplência nesse setor educacional. Assim, como de costume, contrariando toda a bravata neoliberal, recorreu-se ao Estado para aliviar os custos fixos operacionais (empréstimos a juros baixíssimos e/ou o não pagamento de impostos). Foi assim que, no governo Lula, nasceu o Prouni (ALMEIDA, W. de M. de, 2017).
A concepção do Prouni teve fortíssima influência dos donos das universidades privadas. Foi a ‘solução’ para a situação financeira enfrentada por essas instituições. Alterações favoráveis aos interesses dos conglomerados educacionais mercantis se concretizaram mediante a redação de 292 emendas (ALMEIDA, W. de M. de, 2017). Não obstante, o avanço mais significativo ocorreu com a utilização do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), pois este ampliou e descentralizou as vagas na rede federal de ensino, as quais se encontravam estancadas e limitadas, na prática, nas capitais brasileiras no governo de Fernando Henrique Cardoso, ampliando o acesso ao ensino superior para os segmentos da população menos favorecidos. Apesar desse mérito, o governo Lula e, na sequência, o de Dilma, mediante o Prouni e o Fies, mantiveram o financiamento público ao segmento privado da educação superior iniciado na ditadura militar e “anabolizado” no governo de Fernando Henrique Cardoso. Dados do próprio Ministério da Educação (MEC) indicam a transferência de recursos públicos da ordem de R$ 13,7 bilhões para o orçamento do Fies em 2014. Não é sem razão, portanto, que as universidades pertencentes a esses conglomerados mercantis se transformaram em corporações com o maior número de alunos do mundo (ALMEIDA, W. de M. de, 2017).
Embora esses programas (Prouni e o Fies) possam estar eivados de boas intenções, os estudiosos têm demonstrado que para o alunado cliente dessa ‘solução’ o êxito no mercado de trabalho é pífio, mas o sucesso das ações dos grandes grupos econômicos que se beneficiam dessa empreitada é certo, como se pode constatar pelas palavras de Valdemar Sguissardi (2015, p. 870):
‘Ao longo dos últimos dois ou três anos e até o final de 2014 ou até a edição das Portarias 21 e 23 do Fies, de 29/12/2014, o setor educacional do mercado de ações foi o mais lucrativo dentre os 15 ou 16 setores da economia presentes na Bovespa. De agosto de 2012 a agosto de 2014, por exemplo, enquanto o Ibovespa (índice do total de cerca de 350 empresas) teve uma redução de 3,67%; a Vale (VALE5), redução de 13,48%; e a Petrobras (PETR4), valorização de 9,32% de suas ações; a Kroton (KROT3) teve uma valorização de 314% e a Estácio (ESTC3), 240,97% de suas respectivas ações.’
Para que dúvidas não pairem a respeito dos verdadeiros beneficiários dessa política de ‘Estado privatizado’, o Fies responde por 49% das receitas totais da Ser Educacional, 44% da Kroton, 40% da Estácio e 38% da Anima (UMPIERES, R. T., 2015). Aliás, José Roberto Loureiro, presidente de operações da Laureate do Brasil (que faz parte do conglomerado transnacional Laureate), com comovente sinceridade, assim opina sobre o ‘regime de colaboração público-privado’ que se instalou no Brasil: ‘É difícil encontrar outro país no qual o governo trabalha tanto, em cooperação com o setor privado, para expandir o acesso à educação superior’ (HORCH, D., 2014).”[lvi]
Ao mesmo tempo, já como efeito do desajuste econômico, verificou-se um crescimento exponencial do endividamento das famílias a partir de 2014[lvii] [lviii], provocando a diminuição do consumo, e, de forma reativa, a retração da produção e o aumento do desemprego.
Além disso, em 2013, a crise mundial de 2008 começou a afetar de forma mais direta a economia nacional, abalando ainda mais a fórmula adotada baseada em consumo e nos juros elevados, sendo que, efetivamente, desde 2009, com a perda de valor internacional das mercadorias exportadas pelo país, essa crise já se anunciava, sobretudo em razão do modo como foi tratada, ou, mais precisamente, não tratada, vez que o governo, àquela altura, até 2013, manteve a mesma lógica da inserção de dinheiro no mercado por meio das políticas públicas, buscando ampliar o consumo.
Com o aprofundamento da crise e mantendo a mesma política econômica, o governo, então, buscou promover, de forma cada vez mais ampliada, redução dos custos de produção, desonerando a folha de pagamento e concedendo isenções fiscais[lix]. Foram beneficiários a construção civil (Lei 12.546/2011, MP 601/2012, MP 612/2013 e Lei 12.844/2013) e o setor automobilístico[lx]. Mas, de fato, em setembro de 2012, a lista de beneficiados já atingia 25 setores (transportes: aéreo, rodoviário, marítimo e fluvial; alimentos: aves, suínos, pescado, pães e massas; farmacêuticos; linha branca: fogões, refrigeradores e lavadoras etc.
A previsão inicial era a de que se atingiria uma diminuição de arrecadação equivalente a R$13 bilhões, em 2013, mas o resultado foi o de uma perda de arrecadação na ordem de R$77,8 bilhões[lxi].
Somem-se a isso as imensas perdas de arrecadação, que geram, sobretudo, impacto nas contas da Previdência Social, provenientes de um duplo defeito, que, somados, refletem, inclusive, a quebra institucional do pacto social fixado na Constituição Federal: sonegação[lxii] e falta de fiscalização (vide item 10). E servem para demonstrar que no aspecto econômico o número de “culpados” é infinitamente maior[lxiii] do que aquele que a compreensão massificada que acreditar que seja, compreendendo-se a sonegação como corrupção, ou não.
Essas isenções, vale lembrar, foram feitas sem qualquer garantia de retorno concreto para os trabalhadores em termos de geração de empregos, pois, por exemplo, conforme destaca Washington Luiz Moura Lima, “para as montadoras foram R$ 12 bilhões de renúncia fiscal em 2014, e mesmo assim elas demitiram 12,4 mil trabalhadores”[lxiv]. Parte dessas reduções, R$13,2 bilhões, atingiu diretamente o patrimônio dos trabalhadores, pois, segundo a Receita Federal, advieram da desoneração da folha de pagamento. Essas iniciativas, ademais, vêm sendo tomadas há vários anos[lxv] e continuaram em 2014[lxvi].
Ainda que um pouco reduzidos a partir de 2014, os aportes do governo à economia foram intensos. No período de 2003 a 2016 o total dos aportes foi da ordem de R$3,5 trilhões[lxvii] (valendo lembrar, inclusive, do gasto de R$39,5 bilhões para a realização da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016[lxviii]).
A iniciativa não consegue evitar os problemas econômicos, seja porque o endividamento das famílias já era grande, seja por conta das incertezas quanto ao futuro que desencorajam o consumo[lxix].
A retração da produção e o nível dos preços dos produtos, inclusive, se mantêm mesmo com a renúncia fiscal, pois as empresas utilizam as isenções para preservarem sua margem de lucro
Com tudo isso somado, os efeitos econômicos inevitáveis foram: déficit primário das contas públicas (saindo de um superávit de 91,3 bilhões, em 2013, para um déficit de R$32,5 bilhões em 2014; R$111,20 bilhões, em 2015; e R$155,80, em 2016[lxx]); crise fiscal e aumento do desemprego (no final de 2014 a taxa de desemprego era de 4,5; no final de 2015, 8,5%; e, em 2016, 11,5%, estimulado também pela influência da Lava Jato[lxxi]).
Segundo o professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Istvan Kasznar, o Brasil adotou um modelo de reação à crise que gerou uma grave crise fiscal, que foi o maior problema verificado. Conforme dito à reportagem feita por Kelly Oliveira, Pedro Rafael Vilela e Wellton Máximo, da Agência Brasil, “Embora tenha havido uma política monetária austera e correta, a política fiscal é uma das piores heranças que temos hoje, decorrente de uma forma equivocada de se interpretar a evolução cíclica da economia” [lxxii].
Como observam os autores da reportagem que “para tentar manter a economia aquecida em meio à crise que tomou proporções mundiais, o governo brasileiro adotou uma série de medidas, como redução de impostos para estimular o consumo, congelou preços do petróleo, subsidiou as tarifas de energia elétrica e ampliou as desonerações”.
E acrescentam: “Em meio à crise internacional, o governo anunciou a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis, eletrodomésticos e materiais de construção. Diante da escassez de crédito, houve redução dos depósitos compulsórios (dinheiro que os bancos são obrigados a recolher ao Banco Central) e do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), além de estímulo ao crédito por meio de bancos públicos.”[lxxiii]
Nas palavras de José Eustáquio Diniz Alves: “Em 2014, o déficit primário foi de R$ 32,5 bilhões, representando -0,6% do PIB. Em 2015, o déficit explodiu para R$ 111,2 bilhões, representando 1,9% do PIB. Desta forma, a Dívida bruta do governo geral que estava em R$ 2 trilhões em dezembro de 2010, passou para R$ 2,7 trilhões em dezembro de 2013, para R$ 3,3 trilhões em dezembro de 2014 e R$ 3,9 trilhões em dezembro de 2015. Isto é uma trajetória explosiva, pois a dívida bruta absoluta cresce enquanto o PIB diminui.”[lxxiv]
Já a economista Laura Carvalho não nega, por completo, a tese defendida por Paul Krugman[lxxv], prêmio Nobel da economia, no sentido de que houve de má sorte, no aspecto da alteração, a partir de 2009, do preço internacional dos produtos exportados pelo país, e um erro básico na reação do governo, que, assustado teria cortado efetivado cortes de gasto público e aumentado a taxa de juros, quando teria que ter feito exatamente o contrário, para a ocorrência da crise econômica brasileira.
Reconhecendo que houve uma boa dose de má sorte quanto à conjuntura internacional e adicionando questões internas como a crise hídrico-energética de 2013-2015 e os “impactos de curto prazo da Lava Jato”, afirma que ainda assim restariam cerca de 40% de responsabilidade da política econômica do governo. Destacando que os gastos públicos continuaram elevados, tendo sido reduzidos apenas em 2015 (e lembrando, eu, que a taxa de juros somente teve queda sensível em 2012/2013, sendo que, em 2014, voltou a subir[lxxvi]), Laura Carvalho conclui:
“Os erros de política não começaram, portanto, no segundo mandato de Dilma: a resposta à desaceleração da economia, causada inicialmente por choques externos e internos, foi conceder valores cada vez mais altos em desonerações de impostos e expandir o crédito de bancos públicos, em vez de investir diretamente em infraestrutura, por exemplo.
Sem perspectiva de retomada do dinamismo do mercado interno, investidores e consumidores endividados passaram a cortar seus gastos, contribuindo para aprofundar a crise e a perda de arrecadação.
Além disso, o represamento de tarifas energéticas e outros preços administrados para controlar a inflação – que acelerava pela desvalorização do real em meio ao choque externo – acabou sendo sucedido por um reajuste brusco nesses preços, que responderam por 38% da inflação de 2015, segundo relatório do Banco Central.
Subir tanto os juros em meio a esse quadro foi um erro grave, mas represar os preços se mostrou má ideia.”[lxxvii]
Há quem diga que não foi só isso, afirmando que, em verdade, o Brasil só avançou na economia no período de 2003-2013 porque teria sido favorecido pelas condições econômicas mundiais e que, mesmo assim, avançou menos do que poderia, se comparados os números com os de países do mesmo grupo[lxxviii].
Dizem outros, ainda, que as políticas sociais e até o aumento do salário mínimo, que elevaram bastante o nível de rendimento dos mais pobres[lxxix], não representaram uma transferência efetiva da riqueza produzida para os trabalhadores, pois estes, ao final dos acertos, tributados (em um sistema tributário invertido[lxxx]) e endividados, mantiveram inalterada sua proporção de riqueza no PIB nacional. Como adverte Fernando Augusto Mansor de Mattos, “parcela crescente dos ganhos de renda auferidos pelas famílias, entre 2004 e 2013, foram transferidos para o setor financeiro, no contexto de mercantilização de serviços públicos”[lxxxi].
Bem se vê, portanto, que as explicações econômicas são complexas e os dados trazem aspectos positivos da política do governo de 2003 a 2013, mas também demonstram, já nesse período, a formação de problemas econômicos de difícil solução, mas que, ao ver de muitos, não podem ser debitados, exclusivamente, na conta das iniciativas adotadas pelo governo.
Não tenho, como assumido, condições técnicas para adentrar nesse debate, até porque me soa certo exagero, carregado de uma pouco de soberba, quando alguém expressa, com precisão, quais teriam sido as medidas que poderiam ter sido tomadas para estancar a crise. Além disso, toda essa discussão afasta outra, extremamente necessária, acerca dos limites do próprio modelo econômico para suportar a expansão do mesmo patamar de vida, de preparação educacional e de nível de consumo, vez que sem uma industrialização compatível com a nova demanda, o que é praticamente impossível, tende-se à elevação de preços e a formação de um processo inflacionário que corrói os ganhos e mantém o nível da desigualdade. Isso sem falar no potencial destruidor das reservas ecológicos de uma produção desenfreada e do quanto uma concorrência internacional entre os diversos países impulsiona uma geopolítica que impede a distribuição da tecnologia e da riqueza, de forma igualitária, entre todas as nações.
As soluções econômicas não me parecem nada simples, portanto. E mesmo sem adentrar essa discussão que diz respeito à superação do modelo atual, que também não é nada simples, porque ninguém ainda encontrou a fórmula racional para se chegar a um mundo não capitalista e de como ele se organizaria (ainda que seja esse exame cada vez mais urgente), o fato é que se trata de uma simplificação muito grande dizer que “o PT quebrou o Brasil” ou, pior, que foram as políticas de esquerda que o fizeram, pois nada, mas nada mesmo, se fez fora dos padrões da ortodoxia do modelo de produção capitalista, com características, inclusive, neoliberais, se pensarmos, sobretudo, no marco da legislação trabalhista que foi adotada na década de 90 e que foi integralmente mantida no período petista, assim como no aspecto da introdução da lógica de mercado na gestão da administração do Estado, notadamente no Poder Judiciário, com a introdução das estratégias de gestão, vislumbrando uma atuação jurisdicional a pautada pelo cumprimento de metas, a partir de 2009.
O fato inconteste é que, por obra de muitas mãos, sobressaindo, por óbvio, as dos governantes e integrantes das instituições públicas, se chegou a uma crise econômica diretamente ligada à crise fiscal, que constituiu o alimento para o advento da crise política.
7. Os precedentes neoliberais dos governos petistas
Do ponto de vista trabalhista, a preservação de uma concepção neoliberal nos governos petistas pode ser identificada nos discursos proferidos pelos integrantes do governo ou seus aliados no sentido da desconsideração da própria relevância da legislação trabalhista, nos mesmos moldes do governo anterior e daquele que se sucedeu.
Com efeito, em 2003, o próprio Presidente Lula chegou a defender publicamente a flexibilização das leis trabalhistas e, pior, disse a operários, em manifestação em fábrica do ABC, que eles eram privilegiados por já terem emprego, buscando com isso deslegitimar a reivindicação que faziam por melhores salários, qualificando-a como um ato egoísta.
O Ministério do Trabalho, na mesma linha, inaugurou, em fevereiro de 2004, um movimento de “faxina” da CLT, aludindo ao fato de que a CLT teria várias disposições que seriam verdadeiros lixos. Criou-se um Conselho para pôr em discussão a legislação social, o que, por si, permitiu que a legislação trabalhista fosse, mais uma vez, alvo de ataques. Pautou-se uma reforma sindical, que, partindo do pressuposto de que a reforma fortaleceria os sindicatos, retomava a ideia do negociado sobre o legislado.
No mesmo ano de 2004, após a edição da Emenda Constitucional n. 41/03, que aumentou o tempo para a aposentadoria, substituindo o requisito do tempo de serviço para tempo de contribuição, o governo federal utilizou todas as suas armas para influenciar decisão do Supremo Tribunal Federal acerca da constitucionalidade de taxação dos inativos.
Cumpre relembrar que a EC 41 (que trazia também, a implementação imediata do teto remuneratório criado pela EC 19/98 e a implementação da contribuição previdenciária dos servidores públicos inativos) estava inserida no contexto de uma Reforma do Estado iniciada em 1998, com a EC n. 19/1998, seguida da EC 20/1998 (com foco na Previdência).
Em 2005, adveio um dos maiores baques aos direitos trabalhistas, a Lei n. 11.101, da recuperação judicial, que retirou do crédito trabalhista (superior a 150 salários mínimos) o caráter privilegiado com relação a outros créditos, buscou eliminar a sucessão trabalhista e tem sido utilizada até hoje como forma de institucionalização do calote trabalhista.
Em março de 2007, chegou a ser aprovado no Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar (PLC n. 7.272/05), que criou a denominada “Super Receita”. No bojo dessa lei se inseriu, pela Emenda aditiva (n. 3), de autoria do Senador Ney Suassuna, apelidada de Emenda 3, a retirada do poder de fiscalização dos fiscais do trabalho.
Por disposição da referida Emenda, o § 4º, do art. 6º, da Lei Complementar, teria o seguinte teor: “No exercício das atribuições da autoridade fiscal de que trata esta lei, a desconsideração da pessoa, ato ou negócio jurídico que implique reconhecimento de relação de trabalho, com ou sem vínculo empregatício, deverá ser sempre precedida de decisão judicial."
Como legado da Copa, em 2014, o que se viu foi a imposição de um grave retrocesso, notadamente no que se refere ao processo de reversão da terceirização, por conta do número de acidentes gerados nesse modelo de exploração do trabalho e também por conta da precarização promovida nos ganhos e nas condições dos trabalhadores.
Para se ter uma noção, em 27 de abril de 2012, por influência da atuação do Ministério Público do Trabalho, que via no combate à terceirização o ponto essencial para a redução dos acidentes do trabalho, sobretudo na construção civil, foi encampada pelo Governo Federal aderiu ao Plano Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho. Mas como a realização da Copa, da forma como foi feita, dependia da realização de muitas obras em todo o país e a toque de caixa, o governo fez vistas grossas ao modo como as obras foram realizadas, apoiando, de certo modo, as intermediações de mão-de-obra promovidas pelas grandes construtoras, chegando-se mesmo ao cúmulo do próprio Superintendente Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo, vinculado ao Ministério do Trabalho e Emprego, Luiz Antônio Medeiros, um ex-sindicalista, declarar, sobre as condições de trabalho no Itaquerão, que: “Se esse estádio não fosse da Copa, os auditores teriam feito um auto de infração por trabalho precário e paralisado a obra. Estamos fazendo de conta que não vemos algumas irregularidades” (entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, em 03/04/14).
Não foi à toa, portanto, que a discussão em torno do PL 4.330, de ampliação irrestrita da terceirização, voltou com tudo no ano de 2015, fortalecida pela própria fragilização do projeto constitucional baseado na prevalência dos Direitos Humanos e na essencialidade dos direitos trabalhistas e sociais.
Lembre-se que a realização da Copa foi baseada na implementação da lógica do Estado de exceção, ou seja, em supressão do Estado de Democrático de Direito.
A Lei Geral da Copa (Lei n. 12.663/12) estabeleceu um Estado de Exceção na ordem constitucional brasileira, “legitimando”:
- criação de um “local oficial de competição”, que abrange o perímetro de 2 km em volta do estádio, no qual será reservada à FIFA e seus parceiros, a comercialização exclusiva, com proibição do livre comércio, inclusive de estabelecimentos já existentes no tal, caso seu comércio se relacione de alguma forma ao evento;
- institucionalização do trabalho voluntário, para serviços ligados a atividade econômica (estima-se que cerca de 33 mil pessoas terão seu trabalho explorado gratuitamente, sem as condições determinadas por lei, durante o período da Copa no Brasil);
- permissivo, conferido pela Recomendação n. 3/2013, do CNJ, da exploração do trabalho infantil, em atividades ligadas aos jogos, incluindo a de gandula, o que foi proibido, ainda que com bastante atraso, em torneios organizados pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol), desde 2004, seguindo a previsão constitucional e o Estatuto da Criança e da Juventude (ECA);
- liberdade de atuar no mercado, sem qualquer intervenção do Estado, podendo a FIFA fixar o preço dos ingressos como bem lhe aprouver (art. 25, Lei Geral da Copa);
- eliminação do direito à meia-entrada, pois a Lei Geral da Copa permitiu à FIFA escalonar preços em 4 categorias, que serão diferenciadas, por certo, em razão do local no estádio, sendo fixada a obrigatoriedade de que se tenha na categoria 4, a mais barata (não necessariamente com preço 50% menor que a mais cara), apenas 300 mil ingressos, sem quórum mínimo para cada jogo, e apenas dentre estes é que se garantiu a meia entrada para estudantes, pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos; e participantes de programa federal de transferência de renda, que, assim, foram colocados em concorrência pelos referidos ingressos;
- afastamento da aplicação do Código de Defesa do Consumidor, deixando-se os critérios para cancelamento, devolução e reembolso de ingressos, assim como para alocação, realocação, marcação, remarcação e cancelamento de assentos nos locais dos Eventos à definição exclusiva da FIFA, a qual poderá inclusive dispor sobre a possibilidade: de modificar datas, horários ou locais dos eventos, desde que seja concedido o direito ao reembolso do valor do ingresso ou o direito de comparecer ao evento remarcado; da venda de ingresso de forma avulsa, da venda em conjunto com pacotes turísticos ou de hospitalidade; e de estabelecimento de cláusula penal no caso de desistência da aquisição do ingresso após a confirmação de que o pedido de ingresso foi aceito ou após o pagamento do valor do ingresso, independentemente da forma ou do local da submissão do pedido ou da aquisição do Ingresso (art. 27).
- remoções violentas e abruptas de milhares de famílias de suas casas;
- ausência de fiscalização efetiva das condições de trabalho nas obras dos estádios, das quais decorreram oito mortes e inúmeros acidentes (não contabilizados);
- isenção tributária à FIFA, que lhe permitiu obter o lucro recorde de R$16 bilhões[i];
- restrição à atividade dos ambulantes, que detinham direito adquirido para o exercício de seu mister;
- incentivo à formação de relações de trabalho por intermédio da terceirização, superando os próprios limites jurisprudenciais estabelecidos.
8. Para além do econômico
Se é bastante complexo dizer quais foram os erros e acertos da política econômica do governo[lxxxii] e mais ainda arriscar nos palpites em torno do que poderia ter sido feito para que os números da economia não tivessem deteriorado tanto a partir de 2015, no plano das relações de trabalho não há muita dificuldade em apontar o quanto o governo dificultou a maior inserção política e ascensão econômica da classe trabalhadora do período.
Para manter um projeto de poder, favorecendo setores econômicos estratégicos e preservando relações partidárias de oportunidade, o envolvimento com a lógica da corrupção foi concreto, gerando perda de credibilidade, que tanto aumentou a crise econômica quanto gerou instabilidade política.
O governo, no entanto, persistiu na narrativa de negar a realidade, construindo sua própria versão dos fatos, para conseguir dividendos eleitorais.
Teve a oportunidade, no bojo do movimento de 2013, de conseguir apoio popular para alterar sua política assistencial e de alianças com o poder econômico e, com isso, fortalecer as instituições, promovendo uma maior eficácia dos Direitos Sociais, mas não o fez. Diante da crise fiscal, teve a oportunidade de conduzir um processo, também com apoio popular, de auditoria da dívida pública, mas também não o fez. Bem ao contrário, em janeiro de 2016, a Presidenta Dilma vetou a realização da auditoria da dívida pública, que “havia sido incluída no Plano Plurianual (PPA 2016-2019), por meio de emenda do Deputado Edmilson Rodrigues (PSOL/PA), acatada pela Comissão de Finanças e Tributação, que é o principal Órgão Colegiado da Câmara dos Deputados sobre o orçamento público”[lxxxiii].
E foi trilhando esse caminho, de uma realidade paralela, que se chegou à denominada “pedalada fiscal”. Para evitar a demonstração de um déficit primário em ano de eleição (2014), o governo deixou de repassar, contabilmente, o dinheiro dos programas sociais para os Bancos e fundos públicos (CEF, Banco do Brasil, BNDES e FGTS), os quais, então, pagavam os programas sociais, como se estivessem fazendo uma espécie de empréstimo ao governo e, durante esse tempo, até o pagamento, as contas do governo apareceriam sem o déficit[lxxxiv].
Mais do que erros econômicos, portanto, o governo cometeu sérios deslizes éticos, que favoreceram o crescimento da visão de mundo conservadora, dado que esses problemas foram vinculados à esquerda, que, embora não estivesse representada pelas ações e concepções dos governos petistas, não foi completamente isenta de culpa, pois, no plano da produção acadêmica, não se dedicou à formulação de um senso crítico consiste e consciente sobre os atos do governo, sob o eterno argumento de que “não era o momento adequado para tanto”.
E por mais que as questões econômicas fossem complexas e discutíveis, esses desvios constituíram uma dura pena para os governos petistas, pois, ainda que desprezada nas análises técnicas acima reproduzidas e em tantas outras, a corrupção, em pesquisa realizada em 2015, aparecia como a principal causa da crise para 67% dos brasileiros[lxxxv]. Em 2017, superado o objetivo principal da crise política, que era o de retirar, o Partido dos Trabalhadores do governo central, o percentual de pessoas que atribuíam esse peso à corrupção caiu para 48%[lxxxvi]. Claro que, sob esse aspecto, foi grande a influência da grande mídia (e da Lava Jato), que pautou essa questão com viés partidário, fazendo crer à população que a corrupção seria exclusividade e a única característica dos governos do PT.
Além disso, independentemente de qualquer racionalidade econômica, no sentido da avaliação em torno de erros e acertos, o fato é que milhões de pessoas se viram atingidas pelos efeitos da crise, vivenciando o desemprego, o aumento da insegurança pública, aumento de preços, redução de ganhos etc.
A vida ficou pior para milhões de pessoas e para todos os efeitos a “culpa” só podia ser mesmo direcionada ao governo, ainda mais diante das notícias, que não deixavam o noticiário, relativas as acusações de corrupção.
9. A multiplicidade da responsabilidade
Ainda que vários erros possam ser identificados nas ações e omissões dos governos petistas, nada muito diferente se pode fazer com relação aos seus algozes, ligados a setores econômicos e midiáticos.
Durante mais de uma década vários setores da sociedade, em especial os setores econômico e financeiro, se beneficiaram da organização política, não manifestando objeções.
Lembre-se que durante todo esse percurso foram mantidos os ganhos das empresas, sendo que em alguns segmentos os lucros foram recordes[lxxxvii]. Muitos, inclusive, aumentaram os seus lucros no período da crise, apropriando-se, para proveito privado, do benefício das isenções fiscais[lxxxviii].
Foi somente com a extensão das incertezas provocadas pela crise econômica que o setor econômico, expressamente, se envolveu com a questão política, posicionando a favor do impeachment da Presidenta Dilma apenas a partir do final de 2015: FIESP e CIESP, em 14/12/2015[lxxxix]; CNA, em 06/04/2016; CNI e CNT, em 14/04/2016, ou seja, três dias antes da votação na Câmara, que se deu em 17/04/16. A FEBRABAN não se pronunciou a respeito (o que não significa que estive contra, por certo).
Ocorre que, segundo notícia veiculada pelo site da Revista Exame, em 08/04/2016, o ano de 2015 embora tenha sido um ano amargo para muitas empresas no Brasil, várias outras, “na contramão da crise”, registraram ganhos recordes no período.
A reportagem lista as 25 empresas com os maiores lucros de 2015 e aponta o Banco Itaú como a empresa que teve o maior lucro anual já visto no Brasil, de R$23,35 bilhões de reais. Em segundo lugar vem o Bradesco com lucro de R$17,18 bilhões, e, em terceiro, o Banco do Brasil com R$14,39 bilhões. Na sequência vêm: AmBev, R$12,42 bilhões; Santander, R$6,99 bilhões; BTG Pactual, R$5,62 bilhões; JBS, R$4,64 bilhões; BB Seguridade, R$4,20 bilhões; Cielo, R$3,51 bilhões; Telefônica Vivo, R$3,42 bilhões; Braskem, R$3,14 bilhões; BRF, R$3,11 bilhões; Cemig, R$2,49 bilhões; BM&FBovespa, R$2,20 bilhões; TIM, R$2,07 bilhões; Ultrapar, R$1,50 bilhão; Tractebel, R$1,50 bilhão; Kroton, R$1,39 bilhão; EDP Brasil, R$1,26 bilhão; CSN, R$1,25 bilhão (que havia registrado prejuízo de R$ 105,21 milhões em 2014); Copel, R$1,19 bilhão; WEG, R$1,15 bilhão; Porto Seguro, R$1,00 bilhão; Taesa, R$909,42 milhões; e CCR, R$ 874,36 milhões.
Os dados de quatro dessas empresas chamam atenção, vez que tiveram enorme variação entre o lucro de 2014 e o lucro de 2015, com vantagem para 2015: JBS, com 128,57%; BM&FBovespa, com 125,17%; Banco Santander, com 223,60%; e Braskem, com 263,40%[xc].
É possível, ainda, verificar, na internet, a enorme sucessão de notícias de lucros das empresas em 2015, sobretudo dos Bancos:
- “A Nova Fronteira Bioenergia - joint venture do Grupo São Martinho e da Petrobras Biocombustível que controla aUsina Boa Vista, em Quirinópolis (GO), relatou lucro líquido de R$ 148,15 milhões na safra 2015/2016, encerrada em 31 de março deste ano. O valor é 204,6% superior ao lucro líquido de R$ 48,63 milhões do período anterior, de acordo com as demonstrações financeiras da companhia.”[xci]
- “Ford tem lucro líquido cinco vezes maior em 2015. Ganhos chegam a US$ 7,37 bilhões no ano contra US$ 1,23 bilhão de 2014. A Ford superou suas próprias expectativas ao quintuplicar o lucro líquido em 2015 com ganhos de US$ 7,37 bilhões sobre US$ 1,23 bilhão apurado em 2014, em parte pelo forte resultado do quarto trimestre, quando a empresa teve lucro líquido de US$ 1,9 bilhão, recorde para o período e maior do que o valor de todo o ano anterior. A empresa atribui o desempenho em parte à alta margem no segmento de SUV’s nos Estados Unidos em ano recorde para aquele mercado”.[xcii]
- A Globo, que anuncia, diariamente, a existência de uma crise econômica, só superável pelas tais reformas estruturais, teve um lucro líquido superior a R$3bilhões em 2015[xciii].
- “Em balanço anual divulgado pela BRF, a empresa registrou lucro líquido de R$ 3,1 mi em 2015, alta de 46% em relação a 2014. O EBITDA, por sua vez, atingiu R$ 5,7 bilhões no mesmo período, o que significa um crescimento de 21,9% em relação a 2014. A Receita Operacional Líquida (ROL) chegou a R$ 32,1 bilhões, cifra 11% maior ao registrado em 2014. O desempenho provém da expansão das operações globais da companhia, crescimento dos pontos de venda no Brasil e à maior qualidade no atendimento ao cliente. No Brasil, a venda de produtos de maior valor agregado avançou 7,4% em 2015, totalizando R$ 12,2 bilhões. No período, foram comercializadas 1,7 milhão de toneladas de itens processados na região, um avanço de 4,92% ante o resultado obtido em 2014.” “O Brasil segue como principal mercado da empresa, respondendo por 50% do faturamento total”[xciv].
Vide também: “Grendene tem lucro líquido de R$ 454 milhões em 2015. O valor é 13,7% maior em relação ao ano anterior”[xcv]; “Triunfo obtém lucro líquido de R$ 97 milhões em 2015”[xcvi]; “Porto Seguro obteve lucro líquido de R$1 bilhão em 2015”[xcvii]; “Revista Apólice tem maior lucro líquido da história”[xcviii]; “BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul) registra lucro líquido de R$263 milhões em 2015”[xcix]; “Caixa Econômica Federal tem lucro líquido de R$72 bilhões em 2015”[c]; “Lucro líquido da Deten Química aumentou quase 29% em 2015”[ci]; “Light tem lucro líquido de R$424 milhões em 2015”[cii]; “BMG teve lucro líquido de R$189 milhões em 2015”[ciii]; “Grupo Fleury cresceu 108,7% no quarto trimestre de 2015”[civ]; “CEMIG tem lucro líquido de R$25 bilhões em 2015”[cv];“Friboi teve lucro líquido de R$228 milhões em 2015”[cvi]; “Banrisul obteve R$848,8 milhões de lucro líquido em 2015”[cvii]; “EMBRAER encerra 4º trimestre de 2015 com lucro líquido aos acionistas de R$425,8 milhões”[cviii]; “Andrade Gutierrez reverte prejuízo e lucra R$647,7 milhões em 2015”[cix]; Coca Cola fecha 4º trimestre de 2015 com lucro acima de R$1 bilhão[cx]; Lucro da Unilever cai 5%, para R$4,91 bilhões, em 2015, mas melhora em países emergentes[cxi]; Lucro da Procter & Gamble sobre R$2,75 bilhões no trimestre fiscal encerrado em março de 2016[cxii].
A realidade é que esse envolvimento do setor econômico com a crise política se deu, sobretudo, para apoiar a formação imediata de um novo governo, que pudesse levar adiante reformas que lhe garantisse a manutenção do nível de ganhos.
Na perspectiva do setor econômico, o resultado foi proveitoso, pois os lucros das empresas foram preservados em 2016[cxiii] e 2017[cxiv], tendo até aumentado, consideravelmente, em 2018[cxv], já experimentando os efeitos da “reforma” trabalhista, que precarizou as condições trabalho.
Em contrapartida, no mesmo período, depois da vigência da “reforma” trabalhista, a renda média do brasileiro caiu[cxvi]. O desemprego não diminuiu, o desalento aumentou, a informalidade disparou, a renda ficou ainda mais concentrada, a precariedade disseminou e cresceu a evasão de dividas...
Não é por acaso, portanto, que se viu nos jornais outro dia a seguinte notícia: "As remessas de lucros e dividendos feitas por empresas estrangeiras com sede no País somaram US$ 5,109 bilhões em agosto, segundo dados divulgados nesta sexta-feira (23) pelo Banco Central (BC). O resultado representa o maior volume de remessas no mês desde o início da série histórica, iniciada em 1947."[cxvii]
Enquanto isso, no Brasil, o que se constata, além do aumento do desemprego e do subemprego, é o aumento da miséria[cxviii] e, consequentemente, o aumento da desigualdade social[cxix], sendo que, precisamente, já se chegou, aqui, no último período, ao resultado de que a renda dos 1% mais ricos foi 36 vezes superior à média dos mais pobres, sendo que nem mesmo esse acúmulo fica no país, já que os ricos aumentaram, de forma recorde, o volume de suas remessas ao exterior[cxx].
As explicações, portanto, são bastante complexas, vez que, de fato, houve uma multiplicidade de fatores que, produzidos também pela interferência humana, nos conduziram até o presente momento, e isso, sobretudo, do ponto de vista econômico porque, na perspectiva política, as responsabilidades também foram múltiplas. Lembre-se, como já manifestado, a aceitação massificada, incentivada pela grande mídia, do percurso de criminalização da política e da escalada antidemocrática.
Aliás, dentro de uma perspectiva crítica, visualizando identificar responsabilidades, não se pode deixar de apontar a postura da esquerda, enclausurada em soberba ou feita refém do governo, que foi incapaz de estabelecer diálogo com a realidade social, notadamente, com os setores populares, o que, por certo, embora não constitua obstáculo algum para que se desenvolva uma cultura popular apoiada em um sabedoria cada vez mais consciente, acaba abrindo espaço para a disseminação também no seio popular de um pensamento reacionário, baseado, precisamente, na sensação de exclusão, no distanciamento e na percepção da elitização do pensamento de esquerda.
10. A ausência de um projeto
Como visto, é impossível apontar um motivo determinante para que se atingisse o momento presente, mas arriscaria a propor que se extraiam algumas lições e a mais importante parece ser a que nos remete à constatação da perda completa de sociabilidade, provocada pela ausência de um projeto político e econômico claro, que permita a cada pessoa compreender a sua participação no todo social.
A explicitação de um projeto é de extrema relevância porque, como também se viu, o crescimento/desenvolvimento econômico, embora fundamental, é incapaz de gerar, por consequência imediata e lógica, desenvolvimento social e humano. E sem um gerenciamento muito bem conduzido e claro ao conjunto da sociedade não é possível transformar crescimento econômico em justiça social.
Dentro dos padrões do modelo de sociedade determinado pela produção capitalista, é preciso que existam regras que possibilitem uma distribuição da riqueza coletivamente produzida; que fixem políticas públicas (tributos e gerenciamento) voltadas aos serviços sociais essências; que concebam como fundamental o padrão de humanidade requerido pela construção histórica democrática; que estabeleçam obrigações juridicamente exigíveis, perante instituições com funcionamento regular, voltadas a fixar limites aos interesses estritamente econômicos numa lógica particularizada e, assim, a possibilitar a preservação e a elevação da condição humana.
Sem a construção de um projeto de Estado Social e sem a compreensão da sua existência não é se efetiva uma integração social e, portanto, não há qualquer tipo de governabilidade, fazendo com que os atos de governantes e governados se apresentem em constante conflito, ambos na lógica de se aproveitarem uns dos outros para propósitos não revelados. Os governantes se voltam aos seus planos de preservação da posição política adquirida pelo voto; enquanto que os governados querem dos governantes apenas os retornos que lhes favoreçam nos seus interesses individuais imediatos.
Na anomia, desenvolvem-se relações não sinceras e ao mesmo tempo irracionais de todos os lados.
O que é mais grave, e não percebido pela enorme maioria da população que prega o liberalismo econômico pleno (que não existe em lugar algum do planeta, na realidade atual), partindo do pressuposto de que consegue sozinho satisfazer os seus interesses, é que, nesse contexto, de perda da noção de Estado Social, os setores com poder econômico conseguem impor aos governos a realização de políticas que colocam os seus interesses em primeiro plano, pouco se importando com o resultado social disso. Tornam reféns os governantes por meio de autênticas chantagens, que se reforçam, sobretudo, quando ao poder econômico se acoplam as pressões internacionais determinadas pela geopolítica, constituindo, o conjunto dessas relações, a origem da corrupção.
Por tudo isso é que a existência de um projeto de Estado Social, publicamente conhecido e assimilado, se faz essencial e os maiores responsáveis pela sua execução são, inegavelmente, os governantes, que, inclusive, agindo com verdade e ética, devem deixar claro o horizonte limitado de suas possibilidades. Vista a questão de outro ângulo, e de forma mais concreta, quem paga imposto tem o direito de saber porque o faz e o que isso representa no todo social, ressalvando-se que não vale o argumento que tenta legitimar a sonegação em razão da “alta carga tributária”.
E não se está falando aqui de um projeto inovador ou que precise ser elaborado por alguma inteligência genial. Trata-se, de forma clara, como destacado neste texto, do projeto já consignado na Constituição Federal de 1988, que, no entanto, tem sido solenemente ignorado.
A forma auto referencial dos governos petistas, que gerou uma quase completa distensão entre o governo e o todo social, em todas as frações, foi, por conta isso, possivelmente, o maior motivo das crises econômicas e políticas.
Mas, dos fatos verificados, é legítimo igualmente atribuir boa parcela de responsabilidade a todos aqueles que se valeram – e que, por isso mesmo, auxiliaram na sua formação – da crise política para satisfazerem os seus interesses pessoais. Esses, aliás, foram os mesmos que se beneficiaram durante o período de estabilidade econômica, que obtiveram dividendos com as políticas econômicas que contribuíram para a crise, e que, na crise, pautando seus interesses antes de tudo, mantiveram sua margem de lucro.
Vale perceber, também, a insistência dos grupos econômicos na realização da reforma da Previdência, como fator principal, do ajuste das contas públicas e solução para a crise econômica, mas que, no fundo, representa a defesa de interesses privados determinados, já que, sem a realização de uma auditoria pública da Previdência não se pode, seriamente, tratar do assunto.
Como consignado, em texto publicado em fevereiro de 2017[cxxi]:
“E a reforma em questão nem mesmo matematicamente se justifica.
Conforme esclarecem José Dari Krein e Vitor Araújo Filgueiras, seria possível aumentar a receita da Previdência Social com o mero respeito à lei trabalhista: formalização do trabalho assalariado sem carteira assinada, R$ 47 bilhões; fim das remunerações "por fora", R$ 20 bilhões; reembolso pelas empresas das despesas com acidentes de trabalho, R$ 8,8 bilhões; extinção do enquadramento de acidentes de trabalho como doenças comuns, gerando R$ 17 bilhões; eliminação das perdas de arrecadação por subnotificação de acidentes, R$ 13 bilhões.
Os critérios de gestão governamental devem, igualmente, ser questionados. Ora, em cálculo bastante conservador, é possível verificar que apenas em 2014 foram extraídos do patrimônio da classe trabalhadora: R$ 1,1 bilhão, com isenção para a Fifa; R$ 2,1 bilhões, em desvios na Petrobrás; R$13,2 bilhões, com desonerações na folha de pagamento; R$ 2 bilhões, não recolhidos nas lides trabalhistas; R$ 104 bilhões, em isenções tributárias.
Nesse cálculo não foram incluídas as sonegações que se praticam diariamente (e que tantas vezes sequer são contabilizadas), assim como o montante oficial da dívida R$ 426 bilhões que algumas empresas possuem, declaradamente, com a Previdência Social.
Aliás, não se considerou também o valor que o próprio Estado, enquanto contribuinte obrigatório, deve à Previdência Social, pois desde a década de 90, por meio do mecanismo das Desvinculações de Recursos da União (DRU), vem desviando, para o pagamento da dívida pública, receitas que seriam da Seguridade Social. Só em 2015, essa desvinculação foi da ordem de R$ 63 bilhões, segundo a ANFIP.
Lembre-se, ainda, que além de não realizar a fiscalização das relações de trabalho, isentar o capital do pagamento de contribuições sociais e não arrecadar valores declaradamente devidos, o governo ainda agride a classe trabalhadora deixando, deliberadamente, de pagar seus benefícios previdenciários. Com efeito, em todo país, visualizando os dados de 2011 e considerando os processos então em curso, o INSS apresentava-se como réu em 5,8 milhões de ações, que tiveram origem, sobretudo, com a regra a alta programada. Segundo estimativa do Sindicato Nacional dos Aposentados e Pensionistas da Força Sindical (Sindinap) entre 50% e 70% desses processos previdenciários são motivados por problemas com os auxílios, entre eles o auxílio-doença.
O que se tem, em concreto, é um histórico de atuação do Estado em favor da acumulação da riqueza por meio da exploração e do sofrimento da classe trabalhadora.”
Além disso, considerando a enorme quantidade de pessoas que se beneficiava, silenciosamente, das políticas econômicas e sociais adotadas, é necessário repartir, de forma muito mais ampla, o quadro das responsabilidades.
Com isso, inclusive, se esvaziem os argumentos da moralidade e da corrupção, dos quais, dentro dessa perspectiva de análise, sobressai a conveniência, em detrimento da seriedade de propósitos (e não falo das milhões de pessoas que almejam, honestamente, a moralização na política e o fim da corrupção e que se envolveram ativamente, buscando fazer a sua parte, em todo esse processo político, e sim daqueles que, detendo poderes econômicos e midiáticos, incentivaram esse envolvimento popular para a defesa de seus interesses imediatos e não em prol de um projeto social claro e definido, que eles também não possuem).
É interessante verificar que como, agora, tais argumentos não cumprem mais uma função política e não mais representem interesses econômicos específicos, perdem centralidade, entrando na pauta, em substituição, a introdução das políticas econômicas ultra neoliberais, que nada tendo a ver com as razões da crise e as soluções possíveis, destinam-se à satisfação dos interesses econômicos da mesma fração da sociedade até aqui beneficiada. Aliás, oportuno lembrar que foi a experiência neoliberal que nos levou a recessão da década de 90.
11. O ultra neoliberalismo baseado em retrocessos
Ainda que se busquem explicações no processo histórico para se compreender o momento presente, o fato é que chegamos ao ponto em que não se trata de mera reprodução da mesma realidade já vivida, já que as iniciativas econômicas, no sentido da destruição do projeto de Estado Social, são bem mais profundas, e os meios para se chegar a isso tendem a ser muito mais repressivos, seletivos e, consequentemente, rompedores do tecido social e das bases jurídicas constitucionais.
Ora, para auxiliar no convencimento em torno da pertinência dessas medidas econômicas, que preconizam a destruição plena do Estado Social, tem se tentado construir a narrativa de que tudo o que passamos foi culpa da esquerda, de modo a favorecer a disseminação de um conservadorismo culturalmente retrógrado, apoiado na figura de um líder mitológico. Assim, tenta-se fazer acreditar que é natural, inevitável e, até mesmo, necessária a promoção dessa destruição e dos retrocessos políticos e humanos preconizados.
O que se avizinha é: a adoção de medidas econômicas ultra neoliberais, regadas de um conservadorismo cultural que ataca o conhecimento, abomina a diversidade, criminaliza a política e aniquila a democracia.
E vale insistir no argumento de que os experimentos antidemocráticos e o descompromisso com um projeto social efetivados pelos governos anteriores, desde 1988, para falar apenas do momento de vigência da Constituição Federal atual, contribuíram enormemente para que se chegasse até aqui.
Mesmo assim, me parece um tanto quanto equivocado dizer que vivenciamos mais do mesmo.
Para melhor compreender o que vem a ser uma política econômica ultra neoliberal, verifique-se que nem bem se efetivou uma das regressões mais profundas dos direitos trabalhistas com a entrada em vigor, em novembro de 2017, da lei da “reforma” trabalhista (Lei n. 13.467/17), já se fala, abertamente, da realização de uma nova “reforma”, em que a pauta da ausência concreta de direitos nas relações de trabalho se apresenta com naturalidade, com apoio velado do setor econômico.
12. O peso do escravismo na aversão histórica aos direitos trabalhistas
O apoio do setor econômico a mais uma onda de destruição dos direitos sociais pode ser explicado, historicamente. De fato, não é de hoje que o setor econômico, auxiliado pela grande mídia, ataca os direitos dos trabalhadores, acusando-os de constituírem impedimento para o desenvolvimento econômico, deixando transparecer, inclusive, que resquícios escravistas ainda rondam, infelizmente, as relações de trabalho no Brasil, afinal, foram esses mesmos argumentos os utilizados para resistir ao fim da escravidão e ao advento das primeiras leis trabalhista na década de 20 do século passado.
Essa constatação permite compreender, inclusive, o peso que os poucos avanços trabalhistas verificados no plano jurisprudencial, desde 2002, e no plano legislativo, de 2011 a 2013, tiveram na consagração da crise política e da sua consequente quebra do regime democrático, que se mostraram, a partir de determinado momento, como uma grande oportunidade para o setor econômico impor retrocessos trabalhistas (o que de fato ocorreu, como visto, com a Lei n. 13.467/17, que foi concebida a aprovada fora de quaisquer parâmetros democráticos[cxxii]).
Desse ponto de vista estritamente trabalhista, se poderá dizer que, embora a política legislativa dos governos petistas não tenha sido a de reversão da linha regressiva iniciada na década de 90, tanto que todas as leis editadas naquele período continuaram em vigor, e mesmo com a publicação de mais algumas leis regressivas, não se verificou, no período de 2003 a 2013, o desmonte total que se anunciava até 2001 e que foi retomado a partir de 2016, após a retirada da Presidenta Dilma do poder.
No aspecto legislativo, no período de 2011 a 2013, ou seja, antes da desestruturação política, as leis trabalhistas editadas foram o sentido da ampliação de direitos trabalhistas:
a) Lei n. 12.440, de 07 de julho de 2011, que introduziu o Título VII-A à CLT, pertinente à prova da inexistência de Débitos Trabalhistas;
b) Lei n. 12.551, de 14 de dezembro de 2011, que alterou a redação e acrescentou o parágrafo único ao artigo 6º da CLT, a fim de reconhecer o vínculo de emprego pelo trabalho exercido à distância e pelo trabalho executado no domicílio do empregado, bem como considerar que “os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio”;
c) Lei n. 12.619, de 30 de abril de 2012, que acrescentou à CLT a Seção IV-A – Do Serviço do Motorista Profissional, artigos 235-A, 235-B, 235-C, 235-D, 235-E, 235-F, 235-G E 235-H e ao Capítulo I do Título III acrescentou o § 5º ao artigo 71;
d) Lei n. 12.740, de 08 de dezembro de 2012, que alterou o artigo 193 da CLT, a fim de redefinir os critérios para caracterização das atividades ou operações perigosas, e revogou a Lei nº 7.369, de 20 de setembro de 1985, que havia instituído o salário adicional para os empregados no setor de energia elétrica, em condições de periculosidade.
e) Lei n. 12.761, de 27 de dezembro de 2012, que instituiu o Programa de Cultura do Trabalhador, criou o vale-cultura e acrescentou o inciso VIII ao § 2º do art. 458, entre outras providências;
f) Emenda Constitucional n. 72, de 2 de abril de 2013, que assegurou, expressamente, “a igualdade de direitos trabalhistas entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais”;
g) Lei n. 12.812, de 16 de maio de 2013, que acrescentou o artigo 391-A à CLT, a fim de dispor sobre a estabilidade provisória da gestante, “Art. 391-A. A confirmação do estado de gravidez advindo no curso do contrato de trabalho, ainda que durante o prazo do aviso prévio trabalhado ou indenizado, garante à empregada gestante a estabilidade provisória prevista na alínea b do inciso II do art. 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.”
h) Lei 12.873, de 25 de outubro de 2013, que alterou a redação dos artigos 392-A, caput e § 5º, 392-B e 392-C da CLT, para efeito de garantir à empregada adotante, ou que obtenha guarda judicial de adoção, o direito à licença-maternidade.
De forma muito reduzida e generalizada, pode-se inclusive admitir que até 2013, constata-se o desenvolvimento de uma lógica progressista mitigada, que chega a impulsionar as instituições no sentido de uma tentativa de melhorar a percepção dos direitos sociais constitucionalmente consagrados.
De grande relevo, a propósito, a atuação do Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério Público do Trabalho no combate ao trabalho escravo e também da Justiça do Trabalho na elaboração de uma jurisprudência que, mesmo não dominante, começava a dar maior guarida aos Direitos Humanos, coibindo práticas fraudulentas, punindo a ilicitude reincidente e rejeitando acordos lesivos.
Nesta perspectiva, pode-se apontar, como já dito, o desenvolvimento de uma racionalidade social, responsável por uma recuperação do pacto constitucional que havia sido desconsiderado, plenamente, na década de 90 e das qual resultou o resgate de direitos dos trabalhadores, tanto no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, quanto no próprio STF, sendo, neste último, especificamente, com relação ao direito de greve, desde o julgamento do MI 712, proferido em 25/10/07.
Essa postura da Justiça do Trabalho, inclusive, foi refletida na edição da Lei n. 12.619, de 30 de abril de 2012, que avançou na proteção jurídica dos motoristas, notadamente no aspecto da limitação da jornada de trabalho, por se tratar, inclusive, de uma questão de saúde pública, dado o enorme índice de acidentes nas estradas envolvendo motoristas de caminhão. No entanto, a reação do setor econômico logo veio e, em 02 de março de 2015, foi publicada a Lei n. 13.103, que revogou vários dispositivos da Lei n. 12.619/12, retomando a lógica de uma exploração quase sem limites do trabalho desses profissionais.
É também desse período a Emenda Constitucional n. 72, aprovada em 2 de abril de 2013, que assegurou, expressamente, “a igualdade de direitos trabalhistas entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais”. Entretanto, diante da forte pressão de parcela da sociedade, o Brasil não apenas deixou de ratificar a Convenção 189 da OIT, que estabelece a igualdade de direitos para a trabalhadora doméstica (o que só veio a se concretizar, em 31 de janeiro de 2018), como também aprovou, em 1º de junho de 2015, a Lei Complementar n. 150, que, sorrateiramente, contrariou a Emenda Constitucional n. 72, para efeito de tentar negar vários desses direitos.
Esses avanços normativos bastante limitados, que, em verdade, nem avanços foram, vez que não passaram de uma tentativa de conferir vigência aos dispositivos constitucionais de índole trabalhista e social, já foram o suficiente para aumentar a rejeição de segmentos mais abastados da sociedade ao governo, estendendo-se a crítica à Justiça do Trabalho.
Não é desprezível, pois, como fator de explicação da formação de uma reação do setor econômico ao governo anterior, a ocorrência de um movimento jurídico trabalhista na direção de uma melhor percepção dos direitos sociais constitucionalmente consagrados, embora ainda bastante mitigada.
Tanto isso é verdade que, em 2012, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou um paper com o título, “101 Propostas para Modernização Trabalhista”, tendo por objetivo explícito defender a redução dos “altos custos” do emprego formal, vistos como um dos mais graves entraves ao aumento da competitividade das empresas brasileiras. O documento teceu críticas expressas à “vetusta CLT” e se pôs ao ataque das posições assumidas pelo Tribunal Superior do Trabalho nos últimos anos, acusando-as de “irracionais”.
Irracional, de fato, era a objeção da CNI, pois as posições jurisprudenciais da Justiça do Trabalho, mesmo com alguns “avanços”, estava muito aquém dos compromissos firmados no pacto da Constituição de 1988.
Contrariando o projeto constitucional de melhoria da condição social dos trabalhadores e de proteção da dignidade humana, a Justiça do Trabalho insistia em: a) validar a terceirização na atividade-meio, com fixação de responsabilidade apenas subsidiária da tomadora dos serviços; b) não reconhecer o princípio da sucumbência no processo do trabalho; c) acolher o regime de 12x36; d) declarar a constitucionalidade do banco de horas, fazendo letra morta da norma constitucional que estabeleceu o limite de 44 horas semanais; e) conceber a regularidade das horas extras ordinariamente prestadas e que ultrapassam, inclusive, o limite de duas horas ao dia; f) permitir a terceirização no setor público; g) acatar a tese da responsabilidade subjetiva pelos acidentes do trabalho, acolhendo, tantas vezes, o argumento da culpa exclusiva da vítima; h) afastar a configuração do acidente do trabalho com base no pressuposto da necessidade da prova do nexo causal, não reconhecendo as presunções do Nexo Técnico Epidemiológico e fazendo sobressair os caracteres degenerativos; i) não considerar acumuláveis adicionais de insalubridade mesmo quando presentes distintos agentes nocivos à saúde no ambiente do trabalho; j) adotar o salário mínimo como base de cálculo do adicional de insalubridade apesar da proibição constitucional e da referência expressa da Constituição a “adicional de remuneração”; k) não deferir a acumulação dos adicionais de insalubridade e de periculosidade; l) fixar valores quase sempre muito baixos para as indenizações por acidentes do trabalho e por danos morais, irrisórios se comparados, por exemplo, às reparações que se vêm concedendo por perdas de bagagens por companhias aéreas; m) homologar acordos sem respeito ao caráter imperativo da legislação do trabalho, legitimando autênticas renúncias a direitos; n) consignar nos acordos cláusula com quitação do extinto contrato de trabalho, promovendo vedação do acesso à justiça; o) pronunciar, sistematicamente, a prescrição quinquenal com base em interpretação extremamente restritiva da norma constitucional; p) rejeitar a eficácia da norma constitucional que garante aos trabalhadores a relação de emprego protegida contra a dispensa arbitrária; q) negar a teoria da subordinação estrutural e reticular para efeito do reconhecimento do vínculo empregatício; r) recusar a aplicação dos preceitos legais pertinentes ao dano social, cuja função é punir de forma adequada a prática das agressões reincidentes e deliberadas da legislação trabalhista, eliminando a vantagem econômica do agressor; s) não garantir às trabalhadoras domésticas a integralidade de direitos; t) impor limitações inconstitucionais e ilegais ao exercício do direito de greve etc.
Ao mesmo tempo, nos treze anos dos governos petistas a atividade de auditoria fiscal do Ministério do Trabalho havia sido sucateada[cxxiii] e aumentou, consideravelmente, o número de trabalhadores terceirizados, que passa de 4,1 milhões, em 2005, para 12,7 milhões, em 2013[cxxiv], boa parte no serviço público federal. Em 2013, segundo o Tribunal de Contas da União, a despesa com 222 mil trabalhadores terceirizados no âmbito da administração federal era superior a R$ 21 bilhões (cumpre reconhecer que, ao contrário do que se verificou nos governos tucanos, que eliminaram concursos para servidores para efetuarem a contratação de trabalhadores terceirizados em larga escala, nos governos petistas o que ocorreu foi uma reversão desse quadro, substituindo-se as contratações irregulares de terceirizados por servidores concursados, embora isso se tenha feito em virtude de atuação do Ministério Público[cxxv]).
E compete lembrar, também, que a operação GLO, aludida no art. 142 da CF, na Lei Complementar n. 97/99 e no Decreto n. 3.897/01, que autoriza o Presidente da República a usar as Forças Armadas, foi utilizada na Rio+20, em 2012, nas visitas do Papa Francisco, em 2012 e 2013, na Copa de 2014 e também para garantir a implementação das “obras” do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), criado em 2007 e ampliado em 2011, com favorecimento de grandes empreiteiras por intermédio da lei que instituiu a PPP (Parceria Público-Privada – Lei n. 11.079/04), quando, por exemplo, em 2011, se fez uso da Força de Segurança Nacional para reprimir greves de trabalhadores nas obras de Belo Monte, Santo Antônio e Jirau.
A ampliação da terceirização e o aumento da precariedade que dela decorre nas relações de trabalho conduziram o Brasil ao quarto lugar em número de acidentes fatais no trabalho[cxxvi]. A terceirização é utilizada em larga escala nos serviços de segurança, na construção civil e no transporte e “segundo dados do Dieese, o risco de um empregado terceirizado morrer em decorrência de um acidente de trabalho é cinco vezes maior do que nos demais segmentos produtivos”[cxxvii]. A ampliação vislumbrada, ademais, faz supor que também o meio rural será atingido por uma terceirização mais intensa, valendo acrescentar que no meio rural a atuação da fiscalização do trabalho é bem menos efetiva.
O que se verificou, portanto, foi uma melhoria mitigada em direção da efetivação dos preceitos de Estado Social fixados na Constituição Federal de 1988, em termos de justiça social, democratização, consagração universalizada de valores liberais e respeito aos direitos civis e políticos. Melhoria que foi acompanhada, de forma paralela e em direção contrária, da preservação de lógicas neoliberais e a utilização de táticas de repressão para conter os movimentos sociais e trabalhistas.
Mas a resistência a esse pequeno “avanço” foi tão forte que nos obriga a visualizar o apego a estruturas escravistas em muitos segmentos do setor econômico nacional, que também estão relacionadas ao colonialismo e, que no contexto atual, levadas a efeito, potencializam os riscos de sobrevivência das bases democráticos e dos direitos fundamentais assegurados na Constituição Federal.
Essa não superação da sociedade estamental tem dificultado, e muito, até mesmo a aplicação dos direitos liberais clássicos, como a liberdade e a igualdade, e, de forma bem mais intensa, a efetivação de direitos trabalhistas, que, não raro, de maneira extremamente deturpada, são identificados como “coisa de comunista”.
Lembre-se, a propósito, que esse pequeno movimento progressista, verificado também no STF, em diversos julgamentos sobre o direito de greve, que, de fato, não passava de uma aplicação ainda restrita das normas constitucionais de natureza social, foi considerado como uma espécie de “bolivarianismo”, “populismo judicial” ou até “revolução comunista” no Brasil.
Essas estruturas de pensamento oligárquico, autoritário, clientelista, excludente e colonial ainda não superadas, apoiadas no medo do conhecimento, favorecem a reprodução de lógicas machistas, racistas e preconceituosas, vez que na escravidão a desconsideração da condição humana dos trabalhadores foi naturalizada, tomando-se como fundamentos a cor da pele e a objetificação das mulheres. E, infelizmente, há quem ainda tente se valer desse desconhecimento para fins particulares, tornando atuais e “modernas” uma chaga que teríamos de ter vencido há tempos.
A ausência de superações históricas, pelas quais teria sido possível formular novos pactos sociais, deixa abertas as vias para uma retomada do passado mediante justificativas que não foram completamente abandonadas e que se colocam, inclusive, com uma pretensão de recontar a história[cxxviii].
A defesa da “reforma” trabalhista, recém aprovada, por exemplo, foi baseada em um revisionismo histórico que procurou difundir a ideia de que os trabalhadores brasileiros eram privilegiados em direitos, garantias e ganhos, na comparação com trabalhadores de outros países[cxxix], o que não possui nenhuma correspondência com a história de exclusão, sacrifício e sofrimento da classe trabalhadora brasileira.
Na discussão da “reforma” trabalhista conseguiu-se difundir um revisionismo histórico que simplesmente desconsiderou a realidade vivida por séculos pelos trabalhadores e trabalhadoras no Brasil.
Muitos chegaram a dizer que seria preciso colocar o Brasil de volta nos trilhos. Mas do que estavam falando, afinal? O que se vivenciou no passado, no Brasil, foram 388 anos de escravidão autorizada por lei; 41 anos de oligarquia cafeeira liberal/escravista (1889-1930); 5 anos de democracia a serviço de um projeto de construção forçada de um mercado de trabalho (1930-1935); 10 anos de ditadura/corporativista voltada à mesma finalidade, sempre com supressão da luta de classes e opressão dos trabalhadores (1935-1945); 4 anos de ditadura disfarçada com a continuidade do projeto, com ares liberais (1946-1950); 13 anos de uma experiência de oxigenação da organização da classe trabalhadora e esperança de institucionalização do Estado Social (1950-1963), que, no entanto, rendeu 21 anos de ditadura-civil-empresarial-militar, estabelecida para conter os avanços sociais da década de 50 e até para impor perdas aos trabalhadores (1964-1985); 3 anos de redemocratização a partir do pacto de constitucionalidade (1985-1988); 13 anos de destruição do pacto, com imposição da lógica neoliberal (1989-2002), buscando extrair as conquistas fixadas na Carta constitucional (1988); 13 anos de conciliação de classes, gerida por um governo trabalhista, que, na questão do trabalho, ao mesmo tempo que não reconsiderou as perdas legais experimentadas na década de 90, também não aprofundou o retrocesso, ao menos desse ponto de vista legislativo (com ressalva à Lei 11.101/05, da recuperação judicial; às Leis ns. 13.134 e 13.135, que legitimaram os massacres aos trabalhadores concretizados no final de 2014 pelas MPs 664 e 665[cxxx], e à MP 680[cxxxi]); e 02 anos de tentativa de destruição de todas as bases jurídicas sociais, para atendimento dos interesses de setores econômicos, no sentido da preservação das suas margens de lucro.
A constatação da leitura dos fatos é a de que efetivamente existe um sentimento bastante conservador arraigado em parte da sociedade brasileira, o qual se sentiu fortalecido com a “reforma” trabalhista, com a derrota eleitoral do Partido dos Trabalhadores e com a eleição de um candidato cuja fala reverbera essa visão de mundo.
E não é só isso, pois se desenvolveram meios de massificação desse sentimento, tendo como resultado o efeito de se difundir a noção de que qualquer avanço em termos de democracia e justiça social é uma manobra comunista.
Para favorecer a apreensão popular de uma concepção de mundo conservadora de privilégios, da exploração e da desigualdade, difundiu-se um discurso, deturpado e instrumentalizado, de que se estava promovendo uma “modernização” das relações de trabalho, partindo de um pressuposto falso de que se estava alterando uma legislação de 1943, que, de fato, há muito já não existia enquanto tal, tanto que a lei da “reforma”, que alterou mais de 200 dispositivos da CLT, só atingiu 7 dos 188 artigos da CLT (dos 921 iniciais) que ainda estavam em vigor na forma como foram redigidos em 1943, e mesmo assim apenas alterando a sua redação, ou seja, sem os revogar expressamente.
Além disso, sem importar o mínimo de coerência, buscou-se vincular o tema da “modernização” a uma suposta necessidade cultural de preservação de costumes, procurando rotular a busca da igualdade e da liberdade a valores que promoveriam a degradação da família e da moral.
Essa, ademais, não é uma estratégia nova na realidade brasileira. Lembre-se, a propósito, da resistência feita pelos industriais, na década de 20, ao advento da lei que previa 20 dias de férias para os trabalhadores, baseada na estratégia de convencer que direitos fazem mal à moral.
Na visão dos empresários, a lei era “perigosa” não apenas pelos aspectos comuns da argumentação econômica de que geraria custos adicionais para produção, impondo uma interferência indevida no mercado produtivo, mas porque “abriria para o trabalhador a perspectiva de reivindicações sociais crescentes”[cxxxii], entendidas estas não as de natureza econômica, mas de natureza revolucionária. Como esclarecido em passagem do documento em questão:
“Esta classe (operária) jamais se congregou em torno de ideais avançados e nunca teve veleidades de esposar a grande cópia (sic) de reivindicações que por vezes chegam a inquietar a sociedade dos velhos países industriais do estrangeiro. A única finalidade do proletariado é o trabalho bem remunerado e sua alma simples ainda não foi perturbada por doutrinas dissolventes que correm mundo e que, sem cessar, vêm provocando dissídios irremediáveis entre duas forças que, bem orientadas, não se repelem, antes de completam em íntima entrosagem: o capital e o trabalho.”
Assim, “a lei de férias seria imprópria e desnecessária”. Conforme expresso em documento formalizado por entidade representativa dos industriais, “em oposição ao desgaste intelectual, o trabalho manual solicita apenas ‘atos habituais e puramente animais da vida vegetativa’. Dentro de certos limites, não exigiria tempo livre para recuperação. Citando-se Ford, para dizer que ‘quem pensa com acerto sabe que o trabalho vale pela salvação da raça – moral, física e socialmente’. A recorrência a Ford não se limita a um argumento de autoridade. Está, ao contrário, incorporada consistentemente à concepção do mundo dos dirigentes classistas da burguesia industrial de São Paulo.” [cxxxiii]
Resta clara em tal documento a argumentação de que:
“Os lazeres, os ócios, representam um perigo iminente para o homem habituado ao trabalho, e nos lazeres ele encontra seduções extremamente perigosas, se não tiver suficiente elevação moral para dominar os instintos subalternos que dormem em todo ser humano.”
E acrescenta:
“Que fará um trabalhador braçal durante quinze dias de ócio? Ele não tem o culto do lar, como ocorre nos países de climas inóspitos e padrão de vida elevado. Para o nosso proletário, para o geral do nosso povo, o lar é um acampamento – sem conforto e sem doçura. O lar não pode prendê-lo e ele procurará matar as suas longas horas de inação nas ruas. A rua provoca com frequência o desabrochar de vícios latentes e não vamos insistir nos perigos que ela representa para o trabalhador inactivo, inculto, presa fácil dos instinctos subalternos que sempre dormem na alma humana, mas que o trabalho jamais desperta. Não nos alongaremos sobre a influência da rua na alma das crenças que mourejam nas indústrias e nos cifraremos a dizer que as férias operárias virão quebrar o equilíbrio de toda uma classe social da nação, mercê de uma floração de vícios, e talvez, de crimes que esta mesma classe não conhece no presente.”[cxxxiv]
É somente dentro dessa estratégia manipulatória, voltada ao conservadorismo reacionário, seletivo e intolerante, que busca transformar, retoricamente, interesses privados de uma minoria em interesses de todos, que se explica a tentativa de apontar os pequenos avanços sociais como uma “revolução socialista” e de vincular os erros dos governos petistas ao pensamento progressista, atrelado à figura caricata do “esquerdista” (retoricamente concebida).
Para facilitar o desenvolvimento desse sentimento, o antipestimo foi, e ainda tem sido, instrumental.
No plano político, o argumento básico difundido foi o de que havia a necessidade de acabar com a corrupção. No entanto, as soluções propostas (e já alcançadas) representaram não apenas impunidade aos corruptores (as grandes empresas), como também conferiram a essas empresas uma majoração de poderes, além de maiores permissivos para a exploração do trabalho sem a fixação do retorno para a sociedade por meio de tributos, o que foi feito, inclusive, sem o necessário diálogo social e democrático com os trabalhadores.
Ou seja, em nome do combate à corrupção, institucionalizou-se a corrupção, em benefício dos corruptores e contra os interesses do país.
Além disso, não é possível deixar de apontar a falácia de muitos no uso do argumento anticorrupção. Apontando os erros dos outros, muitos querem alcançar ou preservar situações que lhes confiram maiores benefícios pessoais. Ou seja, concordam – e até exigem – com alterações, mas desde que não atinjam os seus projetos pessoais, que nem sempre estão na mesma direção progressista das condições social e humana de todos.
É assim, por exemplo, que pelo argumento anticorrupção alguns tentam chegar à justificativa para defender a diminuição dos impostos ou mesmo para não os pagar. Muitas pessoas, que criticam a imoralidade na política, sonegam impostos e aproveitam-se da imoralidade alheia para justificar a sua conduta ilegal. Como dito pelo jornalista Juca Kfouri, “Nós, brasileiros, somos capazes de sonegar meio trilhão de reais de Imposto de Renda só no ano passado. Como somos capazes de vender e comprar DVDs piratas, cuspir no chão, desrespeitar o sinal vermelho, andar pelo acostamento e, ainda por cima, votar no Collor, no Maluf, no Newtão Cardoso, na Roseana, no Marconi Perillo ou no Palocci.”[cxxxv]
Claro que, potencialmente, quem tem a obrigação de cuidar da coisa pública e se aproveita da posição que ocupa para furtar o erário comete um erro infinitamente maior do que aquele que se vale do argumento da improbidade administrativa para se ver livre de obrigações legais. Ainda assim, um erro não justifica o outro. Ou a punição de uns não gera a absolvição de todos os demais.
As questões em jogo, portanto, extrapolam, e muito, os méritos, os deméritos e os interesses imediatos e futuros do Partido dos Trabalhadores. Diz respeito a um projeto de país (que, cabe dizer, o Partido dos Trabalhadores não tinha ou, pelo menos, não o soube expressar), de cuja construção todos os cidadãos têm o direito de participar.
E diz respeito, também, inegavelmente, ao risco da disseminação de um sentimento antissocial, violento, machista, racista, homofóbico, intolerante e avesso à lógica democrática, porque, afinal, foi esse o projeto apresentado pelo candidato eleito e que, aversões ao PT à parte, foi aplaudido por parte considerável de nossa sociedade.
13. A lógica do mal menor a serviço da ineficácia e da destruição dos direitos trabalhistas
Para se atingir esse objetivo de uma redução ainda maior dos direitos trabalhistas, a estratégia retórica é a da comparação entre situações que são ruins com as que seriam ainda piores, fazendo com que se acredita o ruim é o melhor.
No fundo, nada de novo, pois essa lógica do mal menor sempre foi utilizada para se opor aos avanços trabalhistas e para se manifestar a favor dos retrocessos.
Foi assim que, primeiro, se conseguiu justificar a escravidão como uma espécie de mal menor aos escravizados e, na sequência, quando a abolição se anunciava, para resistir a ela, apresentou-se o argumento econômico de que se acabasse a escravidão o país iria à bancarrota.
Demonstrando a existência de uma tradição no tratamento do tema, o deputado Almeida Pereira, acusava a Lei do Ventre Livre, que propugnava uma extinção gradual e lenta da escravatura, como sendo uma lei de “inspiração comunista”, pois significava a ruína da propriedade e não considerava a realidade extremamente favorável em que viviam os escravos.
Já o jurista e deputado Tristão de Alencar Araripe, que chegou a ser Ministro do Supremo Tribunal Federal, a partir de 1891, a propósito da Lei do Ventre Livre disse: “Não nos devemos levar só pelos sentimentos de filantropia em favor dos escravos quando arruinamos as nossas próprias famílias e prejudicamos o Estado (....) Que prurido de liberdade é esse, pois temos vivido com a escravidão por mais de três séculos e não podemos suportá-la mais alguns anos?”[cxxxvi]
Posteriormente, se disse que ter direitos fazia mal para a moral, até se chegar à fórmula de que direitos são privilégios e que seria, por consequência, responsabilidade dos trabalhadores abrirem mão de seus privilégios (direitos), para, mantendo o processo de acumulação do capital, possibilitar a inclusão no mercado de trabalho dos desempregados, produzindo-se uma espécie de distribuição da miséria, baseada em fórmulas precárias de contratação, e não uma distribuição da riqueza, como deveria ser, conforme preconizado no projeto constitucional brasileiro.
Com o império do ideário ultra neoliberal, que, acoplado à mitologia, se apresenta sem a necessidade de qualquer interlocução com a razão, há sério risco para os direitos trabalhistas, assim como para as instituições voltadas à sua aplicação, vez que todas essas falas estão resumidas na fórmula: é melhor emprego com menos direitos do que emprego nenhum.
III- Até que ponto vai o compromisso com a defesa da democracia?
1. Resistir não é preservar injustiças
Para tentar evitar que o novo governo e a sociedade como um todo descambem para o autoritarismo (e isso não é uma obviedade, pois que, no presente momento, um argumento nesse sentido só serve para manter em evidência os derrotados no pleito), é preciso muito mais do que retórica, porque a aprovação popular do governo foi, e é, bastante considerável.
Assim, é necessário explicar por que, afinal, se devem preservar as bases democráticas, os preceitos constitucionais e o respeito às diversidades, com o grande desafio de convencer disso a tantos (milhões de pessoas) que se sentiram traídos ao longo das últimas três décadas e que não verificaram a formação de um efetivo compromisso dos governantes, dos políticos, das instituições, dos juristas e dos intelectuais com a efetivação dos seus direitos constitucionais.
Esse desafio lançado, de defender a democracia, os direitos sociais e as instituições, sabendo que esses preceitos não chegaram a todas as pessoas, impõe uma postura que não se confunda com o reacionarismo, que, portanto, se coloque contra o retrocesso, mas que não se apegue a uma realidade passada em que milhões de pessoas não foram abarcadas e consideradas seriamente. Veja, como exemplo, a dificuldade que se teve para rejeitar a “reforma” trabalhista perante milhões de pessoas que já estavam acostumadas a viver na precarização da terceirização, na informalidade ou na exclusão do desemprego. Ressalve-se que, por certo, tudo pode piorar...
E a tarefa se complica ainda mais porque as eventuais supressões das liberdades democráticas podem acabar sendo conduzidas à invisibilidade midiática, principalmente se efeitos positivos na economia e na burocracia de Estado forem verificados imediatamente. Lembre-se que o novo governo, depois de dois anos de desgoverno, chega ao poder político em uma situação de “terra arrasada” e, neste contexto, as melhoras na organização do Estado e na economia podem ser introduzidas até com certa facilidade, ainda mais com o apoio, que não é velado, de grandes conglomerados econômicos, do capital internacional e de uma grande potência mundial ao novo governo. Mas pode cair na soberba do poder absoluto e, como se diz, “meter os pés pelas mãos”, destruindo a tudo e a todos[cxxxvii], as bases da soberania do país[cxxxviii] e, com isso, a própria oportunidade.
Até porque é evidente que esse apoio tem um preço e o capital não vai se inserir nessa empreitada por uma razão de mera idiossincrasia política. Haverá um preço a ser pago e o trato, inclusive, parece que já estava feito com o acatamento de uma agenda ultraliberal pelo candidato do PSL, mas que, para ser concretizada, depende da supressão de preceitos fundamentais, notadamente, no que tange aos direitos trabalhistas, inseridos como cláusula pétrea na Constituição Federal, como, inclusive, o próprio candidato reconheceu[cxxxix].
2. Interesse econômico versus compromisso social
A agenda ultra neoliberal é a contrapartida que se promete entregar ao setor econômico pelos investimentos, que já vêm sendo anunciados por aí, e isso parece não incomodar a opinião pública.
Ocorre que, como já dito, a implementação dessa promessa precisa desconsiderar a própria base do argumento que favoreceu ao eleito, de respeito à legalidade, e que, mais recentemente, foi reafirmado, no sentido de que “a Constituição é o único norte da democracia”[cxl].
Restarão, assim, em situação de paradoxo, os movimentos da imprensa e das instituições em defesa da democracia e da constitucionalidade se não se posicionarem também contra os retrocessos sociais, vez que o favorecimento dos interesses estritamente econômicos por meio da redução de garantias sociais que a essas entidades venha a interessar só pode se dar com desconsideração concreta dos preceitos da Constituição, ainda que esta se mantenha formalmente em vigor.
Quando há concordância com o desrespeito à Constituição por uma comodidade econômica, perde-se o argumento da invocação de seus preceitos para a defesa da democracia e demais direitos fundamentais, a não ser com a consolidação do disfarce e da desfaçatez.
Daí porque se pode efetivamente dizer que mais do que a democracia, está em risco a nossa dignidade, a nossa condição de seres humanos que não assimilam ou compactuam com o cinismo.
E de nada valerá a promessa de respeitar e defender a Constituição se isso for feito de maneira apenas parcial, voltado a interesses próprios.
3. As instituições e a defesa da democracia e dos direitos constitucionais
O que se vislumbra, caso se adote, para implemento da tal “agenda virtuosa”, o mesmo padrão de conduta para a elaboração e aprovação da “reforma trabalhista”, é o desrespeito das bases constitucionais, seguida da desqualificação dos resistentes, o que autorizaria atingir um estágio ainda maior de repressões e perseguições.
E não basta que a repressão e as afrontas à Constituição se consagrem para que, automaticamente, a resistência institucional se estabeleça. Aliás, bem ao contrário do que se possa imaginar, o que pode aumentar, imediatamente, é a gama de bajuladores, atuando no sentido de uma autoproteção, de sobrevivência, ou mesmo de vaidade e de promoção.
A propósito, dentro desse contexto histórico, as recentes manifestações de entidades de juízes, expressando congratulações ao ex-juiz indicado para ser Ministro da Justiça, correm o risco de serem entendidas como mera fórmula para preservar interesses e para, inclusive, serem entendidas como uma forma de se firmar adesão ao projeto político do governo, o que fragiliza a magistratura, deixando-a refém da própria manifestação. Afinal, situações como esta, de juízes deixarem a carreira para ocuparem posições políticas, já ocorreram antes e nunca houve manifestação das entidades a respeito. As manifestações, aliás, paradoxalmente, são indicativos do reconhecimento de que há riscos para as instituições judiciais e, consequentemente, para a democracia.
Há quem considere que a nomeação do ex-juiz tenha, em si, o potencial de frear eventuais arroubos autoritários do futuro governo, mas, para isso, há várias contradições a serem superadas.
Se o momento exige uma atuação firme dos magistrados e magistradas em defesa da ordem constitucional, da legalidade, da moralidade administrativa e da efetivação dos direitos fundamentais e sociais, bem como das práticas e instituições democráticas, essa forma de vinculação a um agente do governo abala a credibilidade, a independência e imparcialidade da magistratura. Até porque são várias as formas de corrupção e estas não se restringem aos políticos, atingindo, também, a todas as pessoas e entes privados que se valem de métodos fraudulentos e ilegais para não pagar impostos. Essa prática, ademais, está espraiada por aí e a condição básica para a atuação corretiva do Judiciário neste cenário, em todas as esferas da vida nacional e não de forma meramente seletiva, é a sua independência.
A independência dos juízes é uma garantia de todos os cidadãos, para que não se vejam vítimas dos efeitos de uma política pautada pela lógica de que os fins justificam os meios. Mas é essencial, também, que os juízes saibam que a independência não é um atributo pessoal. Trata-se de uma garantia institucional e o fundamento de legalidade básico que carrega é o de que a atuação jurisdicional dos juízes seja desprovida de preocupações com o favorecimento pessoal.
4. A destruição do Direito do Trabalho em pauta e o risco do progressismo conservador
No caso da Justiça do Trabalho, por exemplo, que tem sido alvo de ameaça de extinção e cujos juízes, a partir desse pressuposto e como estratégia de interferir em sua independência, têm sido insistentemente assediados[cxli], o que se espera é que preservem a sua dignidade, pois como diria Eduardo Couture, "Da dignidade do juiz depende a dignidade do Direito. O Direito valerá, em um país e em um momento histórico determinados, o que valham os juízes como homens. No dia em que os juízes têm medo, nenhum cidadão pode dormir tranquilo".
É essencial que a Justiça do Trabalho mantenha sua razão de ser pautada pelos princípios do Direito do Trabalho, notadamente, no aspecto da necessidade de se conterem os interesses puramente econômicos a fim de que sejam preservados valores humanos e sociais nas relações de trabalho, pois se, para manterem a estrutura física do Judiciário trabalhista, com foco nas preocupações pessoais, conceberem que é preciso atender aos comandos dos poderes econômicos e políticos, o que se terá como resultado será exatamente aquilo que se procurou evitar, qual seja, a própria extinção da Justiça do Trabalho, vez que não se teria mais razão para existir enquanto uma justiça especializada. E mesmo que assim não fosse, aniquilando o Direito do Trabalho, não se conceberia mais como uma Justiça do Trabalho.
Lembre-se que a “reforma trabalhista”, já realizada, foi na direção de um intenso retrocesso social e humano, afrontando Tratados Internacionais de Direitos Humanos, Convenções da OIT, a Constituição Federal e os institutos, conceitos e princípios jurídicos trabalhistas, fazendo com que a atuação independente dos juízes do trabalho se constitua como fator essencial da preservação da ordem jurídica e preservação da autoridade do pacto constitucional. Parece-me insustentável uma situação em que a perda da independência e o abandono dos postulados jurídicos constitucionais sejam postos como fator de sobrevivência de uma instituição judiciária.
Vale perceber que após um ano de vigência, como era até fácil prever, a “reforma” trabalhista não gerou empregos, ampliou o desalento, diminuiu a renda e aumentou a precariedade nas relações de trabalho[cxlii]. Além de não ter diminuído o desemprego e aumentado subemprego, verifica-se, também, o aumento da miséria[cxliii] e, consequentemente, o aumento da desigualdade social[cxliv], sendo que, precisamente, já se chegou, no Brasil, ao resultado de que a renda dos 1% mais ricos é 36 vezes superior à média do ganhos dos mais pobres, sendo que nem mesmo esse acúmulo fica no país, já que os ricos aumentaram, de forma recorde, o volume de suas remessas ao exterior[cxlv].
Além disso, a dita “reforma” reforça toda estrutura histórica de fosso social e de exclusão, de preconceito e de discriminação no Brasil, vez que os mais atingidos pelo desmonte da rede de proteção social são os excluídos de sempre: “Entre os que desistiram de procurar emprego, pretos e pardos são a maioria, representando 73,1% desse contingente. Do total, 23,4% têm entre 18 e 24 anos, e 38,4%, ensino fundamental incompleto.”[cxlvi]
E o que se projeta é ainda pior, qual seja, o aprofundamento da lógica da “reforma” trabalhista, que pode resultar na extinção da Justiça do Trabalho, valendo destacar que a eliminação do Ministério do Trabalho já foi anunciada[cxlvii] e a pretensão, inclusive, é a de que a estrutura do referido Ministério fique vinculada ao Ministro da Economia, o ultraliberal, Paulo Guedes, que já veio a público para defender a adoção de uma “reforma” ainda mais intensa nas relações de trabalho[cxlviii].
No Programa do novo Presidente foi feita referência à criação de uma Carteira de Trabalho Verde e Amarela, nos seguintes termos: “Modernização da Legislação Trabalhista Criaremos uma nova carteira de trabalho verde e amarela, voluntária, para novos trabalhadores. Assim, todo jovem que ingresse no mercado de trabalho poderá escolher entre um vínculo empregatício baseado na carteira de trabalho tradicional (azul) – mantendo o ordenamento jurídico atual –, ou uma carteira de trabalho verde e amarela (onde o contrato individual prevalece sobre a CLT, mantendo todos os direitos constitucionais). Além disso, propomos a permissão legal para a escolha entre sindicatos, viabilizando uma saudável competição que, em última instância, beneficia o trabalhador. O sindicato precisa convencer o trabalhador a voluntariamente se filiar, através de bons serviços prestados à categoria. Somos contra o retorno do imposto sindical.”[cxlix]
A implementação desse modelo remete à criação do FGTS, em 1966, que se colocou como uma opção para os trabalhadores com relação ao sistema de estabilidade após dez anos de prestação de serviços ao mesmo empregador, mas que, concretamente, serviu para eliminar, da realidade das relações de trabalho, os trabalhadores estáveis. Esta “opção” tende, ao mesmo tempo, a acabar com o emprego formal, excluindo os mais velhos do mercado de trabalho.
Além disso, sem a consideração generalizada da relação de emprego, o resultado não é a modernização das relações de trabalho, vez que representa a retomada do padrão regulatório da locação de serviços, como prevista no Brasil desde 1837 (Lei n. 108, de 11 de outubro), com as alterações legislativas sofridas em 1850 (Lei n. 556, de 25 de Junho - Código Comercial), em 1879 ( Decreto n. 2.827, de 15 de março) e em 1916 (Código Civil).
Implica, também, a completa eliminação do regime de seguridade social fixado na Constituição Federal, assim como, na hipótese de eventual compreensão de que é da Justiça comum a competência para julgar os conflitos estabelecidos nessa relação, que seria de natureza civil, o aniquilamento da Justiça do Trabalho.
O curioso é que o programa menciona a preservação de “todos os direitos constitucionais”, mas para atender o propósito do setor econômico, de redução de custos do trabalho, o que está pressuposto é a precarização das condições de trabalho, com eliminação concreta desses direitos, mas, dada a estratégia da criação de um regime paralelo, não amparado por instituições especializadas na fiscalização e aplicação do Direito do Trabalho, se atingiria esse objetivo sem uma revogação formal da Constituição, fazendo lembrar a propaganda da Folha de S. Paulo, editada em 1987, no sentido de que “é possível contar um monte de mentiras, dizendo só a verdade”.
O que se projeta, portanto, é o aumento intenso do sofrimento no ambiente de trabalho, pois até mesmo os símbolos de seu empoderamento perante o capital, ainda que conduzidos, tantas vezes, ao campo do imaginário, se pretendem eliminar.
A grande imprensa e as instituições democráticas irão compactuar com isso? Estarão dispostas ir até onde, admitindo o aprofundamento da quebra constitucional, para não admitirem os erros cometidos com relação aos desrespeitos constitucionais já cometidos?
Nesta perspectiva, a questão a se colocar não pode ser resumida à esfera de uma resistência ao aprofundamento pretendido pelo novo governo, pois, com isso, corre-se o risco de, na questão pertinente à “reforma” trabalhista, fazer com que a atitude progressista, necessária e possível, seja entendida como a de sair em defesa do status quo já ditado pelos termos da “reforma”, mantendo-se, no máximo, a postura do enfrentamento hermenêutico da Lei n. 13.467/17.
Essa perspectiva, data maxima venia, só serve para alimentar o espírito conservador e é extremamente frágil para conter os avanços do autoritarismo (que tem se alimentado do conservadorismo) precisamente porque parte do pressuposto da admissão da validade da supressão das balizas constitucionais e democráticas que estão na raiz do processo histórico da “reforma” iniciado em 29/10/15, quando diante da percepção do impasse em que se inseriu o governo Dilma, o PMDB, mesmo ainda compondo o governo, anunciou o seu programa “Uma Ponte para o Futuro”. Esse programa previa a realização de “reformas estruturais” necessárias para alavancar a economia, falando, inclusive, de alterações nas leis e na Constituição, cujas “desfuncionalidades” deveriam ser corrigidas. O processo histórico de concretização desse objetivo, com assimilação do setor econômico e apoio da grande imprensa, deixou marcas de inconstitucionalidades e de quebra de garantias jurídicas fundamentais no impedimento da Presidente Dilma e em todo o percurso de obstrução da candidatura de Lula, atingindo, igualmente, a elaboração e aprovação da lei da “reforma” trabalhista[cl].
Em prol da coerência histórica, única capaz de assegurar o vigor da Constituição em defesa da ordem democrática, e também para evitar o caos econômico e social, é necessário e urgente, portanto, seguir o caminho da revogação da “reforma”, pois, no contexto atual, o risco de uma postura de adptação ou que, em exercício de sobrevivência, admita o desrespeito aos preceitos constitucionais trabalhistas, inscritos no título dos Direitos e Garantias Fundamentais, é o de que se abdique do dever funcional de se garantir ao cidadão que a Constituição continua em vigor.
Envolvida diretamente no tema, a Justiça do Trabalho, mesmo preservando sua estrutura, não pode passar para a história como uma instituição que não assumiu o papel de guardiã da Constituição, a qual é essencial para a preservação das liberdades democráticas e do Estado Democrático de Direito.
5. Os poderes instituídos, o poder econômico e a grande mídia vão defender a democracia em toda a sua amplitude?
Diversas contradições precisam ser enfrentadas, em vários setores, para que uma defesa da democracia, que aparece de modo fácil em quase todos os discursos, seja, de fato, realizada.
É neste sentido que se insere, portanto, a terceira notícia acima enunciada, a do editorial da Folha de S. Paulo. O jornal, que foi diretamente atacado pelo Presidente eleito, adiantou-se na direção da conciliação, preconizando uma “agenda virtuosa” para o novo governo. A agenda parte da “inadiável reforma previdenciária” e chega a sugerir, indiretamente, a privatização das universidades públicas.
Ou seja, se for cumprida a agenda ultra neoliberal, que começa pela reforma previdenciária, passa pela privatização e inclui uma reforma trabalhista ainda mais profunda, podendo-se chegar até mesmo à extinção da Justiça do Trabalho, por supressão explícita ou por asfixia, a defesa da democracia pode ficar em segundo plano e o autoritarismo encontrar campo aberto para se consolidar com apoio civil e empresarial, como, aliás, já se verificou em nosso país.
Lembre-se que o próprio jornal em questão, que se colocou abertamente a favor da “reforma trabalhista”, publicou, em 02/05/17, o editorial intitulado “Dores da Democracia”, no qual, diante do resultado da pesquisa do Instituto DataFolha, que apontava que a imensa maioria da população brasileira, no percentual de 70%, era contrária às reformas trabalhista e previdenciária, defendeu, expressamente, que os governos não deviam atender os desejos da maioria da população se assim exigissem as necessidades econômicas[cli].
Depois, em outubro de 2017, em seu editorial “Guerrilha Trabalhista”[clii], lançou mão de tática de terrorismo para tentar impedir que a magistratura do trabalho cumprisse o seu dever de aplicar o direito. Agora, mais recentemente, em novo Editorial, de 11/11/18, “A nova CLT, 1º ano”, apesar de todas as evidências e da já tão explicitada forma antidemocrática e atabalhoada da elaboração da lei, que a torna indefensável, quando se pauta a urgência da preservação da democracia, e incapaz de gerar segurança jurídica, continua dizendo, de modo um tanto quanto envergonhado é verdade, pois contrário aos próprios argumentos trazidos o texto, que “a reforma se mostra correta”[cliii].
Cumpre verificar que na mesma edição da Revista IstoÉ, citada neste texto, há uma matéria especial, de 20 páginas, dedicada à educação no ensino superior, entrecortada de propagandas, tecendo loas às iniciativas privadas no setor, sem é, claro, mencionar o fato de que as universidades públicas do país ocupam as melhores posições nos rankings nacionais e internacionais. A Universidade de São Paulo, por exemplo, voltou a ser a segunda na América Latina, a Unicamp, a terceira, e a UFRJ, a nona[cliv]. E especialistas já temem pela piora na gestão das políticas públicas educacionais do MEC, sob a discordância da irmã do futuro Ministro da Fazenda, Elizabeth Guedes, que é vice-presidente da Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup), e que já se adiantou dizendo que “a educação básica deve ser prioridade do próximo governo”[clv]. Aliás, o nome cotado para ser o Ministro da Educação é Stavros Xanthopoylos, Diretor de relações internacionais da Abed (Associação Brasileira de Educação à Distância)[clvi].
Assim, se houver a intenção real de preservar as liberdades democráticas, os direitos civis e políticos, os Direitos Sociais e os Direitos Humanos, ou seja, se, realmente, for vontade fazer valer a Constituição Federal, nenhuma função neste sentido cumprirá o ato panfletário de gritar palavras de ordem acusando Bolsonaro e seus seguidores de fascistas, ou de meramente exigir que a Constituição e as instituições sejam preservadas, sem que se faça uma profunda e real autocrítica e sem que se assuma o pressuposto de que a Constituição deve valer integralmente, abarcando, de igual modo, todos os interesses ali consagrados, mesmo para os adversários políticos ou opositores ideológicos.
É essencial, pois, antes de tudo, se redimir perante a história.
A Procuradoria-Geral da República, com a interposição, pela procuradora-geral, Raquel Dodge, da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 548, contra as diversas decisões judiciais que proliferaram na última semana antes da eleição nacional, proibindo atos políticos nas universidades públicas, e o Supremo Tribunal Federal, na decisão proferida nesta ação, pela qual não apenas garantiu a liberdade da ação política nas universidades, como também fez importante crítica às decisões em questão, dado o caráter autoritário nelas representado, deram um importante passo na direção da resistência à derrocada plena da democracia.
Embora importante, essa postura ainda está longe do nível de um pleno acerto de contas dessas instituições com a Constituição, haja vista, sobretudo, o tratamento jurídico dado aos direitos constitucionais trabalhistas[clvii].
Eis uma postura muito importante para que se consigam superar os efetivos riscos que se apresentam à democracia e aos direitos fundamentais (civis, políticos e sociais), buscando, inclusive, avançar para um estágio mais elevado de coesão e de solidariedade social, evitando-se, assim, o apelo a um passado do qual não se pode orgulhar, se pensarmos, sobretudo, nas diversas formas de exclusão e de opressão vivenciadas, evitando-se, também, a mera reprodução de interesses partidários específicos ou de setores localizados da sociedade que tantas vezes se organizam para a preservação de posições socialmente privilegiadas, em detrimento da imensa maioria da população.
Mas para que as instituições funcionem é essencial que a vida social se mantenha em pleno vigor, com preservação, inclusive, da liberdade de ação das organizações coletivas, dos movimentos sociais e das produções artísticas e culturais, pois a democracia não é meramente uma ideia, é, antes de tudo, práxis. Para que as instituições democráticas funcionem enquanto tais o pressuposto é o de que sejam impulsionadas pela vivência democrática.
IV- Conclusão
Esse é um momento histórico bastante complexo em que posturas conservadoras, no sentido de preservarem o “status quo” contra ameaças de retrocesso, aparecem como um movimento progressista quando, de fato, são apenas conservadores e, sem qualquer conteúdo autocrítico, a pretexto de evitar algo pior, servem para manter uma realidade que, efetivamente, precisa ser alterada em diversos aspectos.
Há de se tomar muito cuidado, portanto, para não se tornar um conservador, pautado pela lógica da recusa do mal maior e, com isso, colocar-se em defesa do indefensável, até por conta do quanto essa postura fragiliza a própria resistência.
A emergência exige, bem se sabe, a defesa do pouco que foi alcançado. Mas, mesmo com todos os riscos, exige mais. Exige um caminhar para frente, desviando-se daqueles para os quais o novo aparece apenas como argumento, pois o que, de fato, preconizam é um retrocesso ao século XIX. A atitude, por isso mesmo, não pode ser apenas reativa, seguindo uma pauta que parece ser propositalmente difundida para estabelecer uma permanente crise[clviii] da consciência. A racionalidade deve ser propositiva e, no sentido mais restrito do campo jurídico trabalhista, voltada também a reconhecer erros do passado e a buscar soluções futuras.
Assim, não basta apontar os efeitos nefastos da terceirização para os trabalhadores e para a economia, notadamente em função dos acidentes do trabalho e do rebaixamento salarial que gera, e, com isso, se posicionar contra a ampliação da terceirização. É preciso reconhecer que esses efeitos são extraídos de uma realidade vivida por 12 milhões de trabalhadoras e trabalhadores terceirizados, desde 1993, na dita “atividade-meio” e que essa realidade foi permitida pelos aplicadores do direito ao arrepio do próprio direito e de forma contrária às previsões constitucionais, sobretudo no aspecto da terceirização no setor público. E, após esse reconhecimento, buscar a novidade da eliminação da terceirização.
E agir da mesma forma com relação ao trabalho em condições análogas à escravidão; ao trabalho doméstico; às greves etc., assim como a respeito do racismo; do feminicídio; da homofobia; da xenofobia e por aí vai.
No aspecto da defesa das instituições públicas, todas elas, é preciso defendê-las diante das ameaças de extinção, mas não se pode adotar uma postura conservadora arredia ao reconhecimento da existência de desmandos praticados por alguns de seus agentes, sobretudo no desvio da finalidade pública da instituição para a defesa de privilégios ou de interesses meramente corporativos, confundindo interesse público com interesses pessoais dos agentes públicos. Não é possível, em nome da defesa da democracia, postar-se, de forma acrítica, em defesa de instituições que não preservam internamente a democracia ou que, externamente, não a estimulam e não respeitam direitos constitucionais alheios.
A Justiça do Trabalho é uma instituição essencial, mas não para atender aos objetivos de vida dos profissionais que nela atuam, quando desvinculados da própria motivação de ser da instituição. A Justiça do Trabalho é essencial para a efetivação do projeto de Estado Social, cumprindo-lhe, em primeiro plano, fazer valer os direitos trabalhistas constitucional e legalmente assegurados, sendo que a dita harmonia social deve ser efeito do respeito a essas normas e não do reiterado desrespeito ao direito institucionalmente legitimado. Assim, diante de tantos ataques, feitos pelas razões erradas, isto é, que se alinhavam a partir seus acertos e não de seus eventuais erros, mas que, de todo modo, põe em risco a sua existência, é fundamental colocar-se em defesa da instituição, até para não abrir mais as portas às lógicas autoritárias. Mas é preciso, concorrentemente, reconhecer defeitos e admitir mudanças.
Veja-se, por exemplo, a prática de homologação de acordos nos quais não há reconhecimento de vínculo empregatício, mesmo quando não se tem dúvida nenhuma que este existiu, ou discriminação de parcelas que compõem o acordo como sendo, unicamente, indenizatórias, para acatar a finalidade de evitar a obrigação das partes quanto aos recolhimentos previdenciários e tributários. Essa tem sido uma grande violência que se comete com o patrimônio do trabalhador, representando, ainda, um incentivo à violação de direitos e uma espécie de punição aos empregadores que respeitam a ordem jurídica, vez que representa uma vantagem econômica indevida aos concorrentes destes.
O mesmo se diga, ainda por exemplo, do Ministério do Trabalho. A sua defesa é emergencial e fundamental, também pelo fato de serem instituições que conferem, concretamente, cidadania aos trabalhadores e trabalhadoras. Mas não se pode reconhecer os desmandos praticados por alguns de seus agentes, no que tange às fraudes dos registros sindicais. Aliás, os sindicatos, cuja defesa é também essencial, precisam dessa mesma reflexão crítica, assim como as empresas, sobretudo as grandes empresas, de uma forma ainda mais profunda.
Fato é que não se pode cair na armadilha do mal menor e, com isso, assumir uma postura conservadora de uma realidade que desconsiderou, quase completamente, o pacto de solidariedade firmado e projeto na Constituição de 1988; que, por consequência disso e por preservação das bases econômicas, sociais e culturais históricas da realidade brasileira, produziu excluídos, miséria, sofrimento, violência, racismo, xenofobia, machismo, homofobia, exploração, desigualdade social, opressão, assédio, mas também clientelismo, fisiologismo, nepotismo, favoritismo...
Uma das grandes ciladas postas está, justamente, na proposta de aprofundamento da “reforma” trabalhista, fazendo com que se imagine que a postura avançada e progressista seja a defesa da “reforma” tal qual está posta na Lei n. 13.467/17, o que deve estar fora de cogitação diante dos efeitos prejudiciais já demonstrados e da intensa insegurança jurídica que gera. A postura não é, nem nunca foi, igualmente, sair em defesa da CLT de 1943, até porque esta, há muito não mais existe e sim de aprimorar a regulação do trabalho por meio da efetiva aplicação dos direitos trabalhistas constitucionalmente consagrados, atendidos os preceitos legais que a tais direitos se relacionam, sem desconsiderar os princípios do Direito do Trabalho, seus conceitos, seus institutos, assim como as Convenções e Tratados Internacionais.
E se todos esses direitos não puderem ser efetivamente aplicados porque a economia não os suporta, reconhecendo que eles foram normatizados a partir do compromisso firmado por esse modelo de sociedade com relação aos valores humanos reservados a quem vive do trabalho, então não são os direitos que devem ser postos em questão, mas o próprio modelo.
Em grande medida, toda essa discussão que somos forçados a fazer a respeito dos limites dos direitos sociais acaba sendo uma forma de não visualizarmos as crises do capital, os seus problemas estruturais e os seus próprios limites como balizador de um modelo de sociedade, cuja finalidade deve ser, sempre e sob qualquer ordem econômica e política, conferir condição para o desenvolvimento pleno da subjetividade humana.
Sem essas formulações críticas que se liguem à raiz dos problemas, todas as responsabilidades pelos problemas de organização social são deslocadas para os elementos acessórios, o que nos condena a uma eterna repetição, em nível piorado, dos mesmos erros. Seria como, diante dos diversos problemas já identificados do advento da “reforma” trabalhista e da EC 55/16, continuar reproduzindo, sem qualquer correspondência temporal ou elemento fático concreto, o mesmo discurso de que é tudo culpa do PT, “que quebrou o país”, ou, pior, que a culpada é CLT de 1943; ou, ainda, que é responsabilidade dos juízes que se recusaram a aplicar a “reforma” e que, por isso, inclusive, se justificaria a elaboração de uma “reforma” ainda mais profunda e até mesmo a extinção da Justiça do Trabalho.
E igualmente grave é a postura que, assumindo o risco de que a insanidade se concretize, vai e se antecipa, mudando a postura e provocando com isso uma realidade ainda mais confusa e mais distante da investigação racional, que pressupõe o uso concreto, sério e honesto do conhecimento.
Assim, sem reflexão crítica, autocrítica e racional, os problemas só se multiplicam, com aumento proporcional da fuga da realidade e da produção das figuras fantasmagóricas.
É esse, portanto, o passo complexo da sensatez que precisa ser dado.
A sensatez de reconhecer a gravidade do momento, mas de não se desesperar; de não mentir para si mesmo; de admitir a derrota; de assumir erros; de pedir perdão e de perdoar; de não se satisfazer com o ato de encontrar e apontar “culpados”; de não fingir alegria, mas não cair em melancolia; de sofrer com dignidade; de não se punir e de não exigir punições; de reconhecer que não se tem a explicação para tudo; de não ter medo de contrariar e de ser contrariado; de afirmar que a eleição acabou e de reconhecer que o eleito o foi por maioria e não por uma minoria, como retoricamente se tem tentado difundir; de saber perder, mas principalmente, de saber ganhar; de entender que uma disputa eleitoral, em que se procura algo novo, há os méritos do vencedor, mas também influenciam as aversões ao histórico representado no adversário; de lembrar que o desenvolvimento econômico só tem efeito positivo quando atrelado à melhoria concreta das condições de vida de todas as pessoas, o que exige, portanto, não pactuar com retrocessos humanos e políticos; de assumir a responsabilidade, que a todos incumbe, de rechaçar os retrocessos, mas também de reconhecer que muito ainda se precisa fazer para implementar políticas sociais efetivas e para superar todas as formas de opressão, de discriminação, de preconceito e de supressão das liberdades democráticas; de manter as utopias; de se ver no outro; de ser solidário; de ter tranquilidade de espírito e de raciocínio; de manter a serenidade; de não ter medo; de se manter em pé e resistente; de se colocar firme e irrestritamente contra todas as formas de violência, de ódio e de intolerância; de enfrentar as injustiças; de se organizar; de acreditar na humanidade, porque, afinal, dentre as mais variadas ameaças e brutalidades, a humanidade sempre foi capaz de reagir e se apresentar com sentimentos elevados de coragem, inteligência, amor e sensibilidade.
Enfim, o que se exige neste momento é a sensatez da sinceridade, carregada de senso crítico (e autocrítico), humildade, respeito ao conhecimento, responsabilidade, pensamento e prática solidária e tolerante, otimismo e coragem, porque, afinal, podemos fazer bem melhor do que isso!
São Paulo, 20 de novembro de 2018.
[i]. SOUZA, Herbert José de. Como se faz análise de conjuntura. Petrópolis-RJ: Editora Vozes, 1995.
[ii]. https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Vencendo-o-terrorismo-do-medo-a-hora-da-politica/4/28133, acesso em 03/11/18.
[iii]. https://www.viomundo.com.br/politica/jorge-souto-maior-a-reducao-da-tarifa-e-os-trabalhadores.html, acesso em 03/11/18.
[iv]. http://www.esquerdadiario.com.br/E-o-governo-brasileiro-disse-SIM, acesso em 03/11/18.
[v]. https://www.jorgesoutomaior.com/blog/os-direitos-trabalhistas-sob-o-fogo-cruzado-da-crise-politica, acesso em 03/11/18.
[vi]. Vide a greve de trabalhadores da CSN, em Volta Redonda, em novembro de 1998, que foi, recentemente, aborda em documentário: https://odia.ig.com.br/rio-de-janeiro/2018/11/5591044-documentario-em-homenagem-a-historica-greve-da-csn-em-volta-redonda-sera-lancado.html#foto=1, acesso em 11/11/18.
[vii]. Vide a greve dos petroleiros, em 1995: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1995/5/28/brasil/8.html, acesso em 11/11/18.
[viii]. Vide a greve dos metroviários, em 2014: https://noticias.r7.com/sao-paulo/video-mostra-confusao-na-estacao-ana-rosa-durante-greve-dos-metroviarios-10062014, acesso em 11/11/18; e a greve dos professores, em 2015: https://brasil.elpais.com/brasil/2015/04/29/politica/1430337175_476628.html, acesso em 11/11/18.
[ix]. https://www.cartamaior.com.br/?/Coluna/Passe-Livre-a-juventude-e-a-democracia-um-basta-a-brutalidade/28688, acesso em 03/11/18.
[x]. https://blogdojuca.uol.com.br/2013/06/copa-das-confederacoes-a-democracia-em-jogo/, acesso em 02/11/18.
[xi]. https://blogdaboitempo.com.br/2013/10/11/movimento-passe-de-classe/, acesso em 03/11/18.
[xii]. https://blogdojuca.uol.com.br/2014/04/a-copa-ja-era/, acesso em 03/11/18.
[xiii]. https://blogdaboitempo.com.br/2016/02/02/balanco-2015-velhos-ataques-e-novas-resistencias/, acesso em 03/11/18.
[xiv]. https://blogdaboitempo.com.br/2014/03/07/em-defesa-do-direito-de-greve-dos-trabalhadores-garis-o-encontro-do-carnaval-com-sua-historia/, acesso em 03/11/18.
[xv]. https://www.viomundo.com.br/voce-escreve/jorge-souto-maior-o-massacre-dos-50-garis-da-cidade-do-rio-de-janeiro.html, acesso em 03/11/18.
[xvi]. https://blogdaboitempo.com.br/2015/05/12/massacre-de-trabalhadores-nunca-mais-o-exemplo-do-parana/, acesso em 03/11/18.
[xvii]. https://www.jorgesoutomaior.com/blog/a-aula-dos-secundas, acesso em 03/11/18.
[xviii]. https://www.cartacapital.com.br/sociedade/a-cronologia-da-crise, acesso em 02/11/18.
[xix]. https://www.viomundo.com.br/politica/souto-maior-depois-da-irracionalidade.html, acesso em 03/11/18.
[xx]. https://blogdaboitempo.com.br/2015/03/13/impeachment-corrupcao-hipocrisia-e-terceirizacao/?fbclid=IwAR16M3Ta3XloORucSCbpozb_QOGWENhqgmK0Rg5uDhzGVYSJ-8085xmQ6RU, acesso em 03/11/18.
[xxi]. https://www.jorgesoutomaior.com/blog/ser-e-nao-ser-eis-a-questao-e-a-saga-dos-cavaleiros-que-dizem-nem-ou-a-hegemonia-do-nonsense, acesso em 03/11/18.
[xxii]. https://blogdaboitempo.com.br/2014/01/21/o-rolezinho-da-fifa-no-pais-de-pedrinhas-em-estado-de-excecao-permanente/, acesso em 03/11/18;
https://www.jorgesoutomaior.com/blog/e-o-estado-de-excecao-avanca, acesso em 03/11/18.
[xxiii]. https://peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=BR100896, acesso em 02/11/18.
[xxiv]. https://www.redebrasilatual.com.br/eleicoes-2018/dos-deputados-paulistas-a-favor-de-reforma-trabalhista-40-nao-se-reelegeram, acesso em 08/11/18.
[xxv]. Vide, a propósito, análise do prof. Osvaldo Coggiola, tratando das eleições de 2016: https://blogdaboitempo.com.br/2016/10/18/a-crise-do-brasil-capitalista-e-maior-do-que-a-guinada-a-direita/, acesso em 11/11/18.
[xxvi]. http://www.oecd.org/eco/surveys/Brasil-2015-resumo.pdf, acesso em 111/11/18.
[xxvii]. https://veja.abril.com.br/economia/ibge-52-milhoes-de-brasileiros-estao-abaixo-da-linha-da-pobreza/, acesso em 20/11/18
[xxviii]. https://www.valor.com.br/brasil/5446455/pobreza-extrema-aumenta-11-e-atinge-148-milhoes-de-pessoas, acesso em 20/11/18.
[xxix]. https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2018/06/05/taxa-de-homicidios-de-negros-cresce-26-em-10-anos-mortes-de-brancos-caem.htm, acesso em 20/11/18.
[xxx]. https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2017/07/23/interna_gerais,885946/negros-ainda-sofrem-desigualdade-no-mercado-de-trabalho.shtml, aceso em 20/11/18
[xxxi]. https://g1.globo.com/economia/noticia/negros-ganham-r-12-mil-a-menos-que-brancos-em-media-no-brasil-trabalhadores-relatam-dificuldades-e-racismo-velado.ghtml, acesso em 20/11/18.
[xxxii]. http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2018-08/denuncias-de-violencia-contra-mulher-chegam-73-mil-em-2018, acesso em 20/11/18.
[xxxiii]. https://economia.uol.com.br/empregos-e-carreiras/noticias/redacao/2018/10/22/diferenca-salarial-entre-homens-e-mulheres-rais-2017.htm, acesso em 20/11/18.
[xxxiv]. https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/publico-lgbt-sofre-mais-preconceito-em-espacos-publicos-e-no-transporte-em-sp-diz-rede-nossa-sp.ghtml, acesso em 20/11/18.
[xxxv]. https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2018/06/05/juradas-de-morte-como-sobrevivem-liderancas-rurais-em-meio-ao-aumento-da-violencia-no-campo.htm, acesso em 20/11/18.
[xxxvi]. https://www.bbc.com/portuguese/brasil-44489766, acesso em 20/11/18.
[xxxvii]. https://catracalivre.com.br/cidadania/documentario-mostra-sofrimento-dos-usuarios-de-onibus-no-terminal-grajau/, acesso em 20/11/18.
[xxxviii]. https://exame.abril.com.br/brasil/longas-filas-e-desconfianca-como-os-brasileiros-veem-o-sus/, acesso em 20/11/18.
[xxxix]. https://educacao.uol.com.br/noticias/2013/06/04/menos-de-1-das-escolas-brasileiras-tem-infraestrutura-ideal.htm, acesso em 20/11/18.
[xl]. Vide, a propósito: https://www.jorgesoutomaior.com/blog/do-estado-de-excecao-ao-autoritarismo, acesso em 02/11/18.
[xli]. https://www.jorgesoutomaior.com/blog/a-reforma-trabalhista-ja-era, acesso em 10/11/18.
[xlii]. https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/11/em-1-ano-pais-teve-ao-menos-41-casos-de-agressao-a-livre-expressao-de-ideias.shtml, acesso em 03/11/18.
[xliii]. https://blogdojuca.uol.com.br/2013/06/copa-das-confederacoes-a-democracia-em-jogo/, acesso em 02/11/18.
[xliv]. https://www.jorgesoutomaior.com/blog/a-crise-e-os-seres-humanos-bons, acesso em 13/11/18.
[xlv]. Vídeo disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=OdMBp3dFqpE
[xlvi]. Vide, a respeito, a reação do futuro Ministro da Justiça à notícia de que o futuro Ministro da Casa Civil cometeu crime de caixa 2: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/11/requiao-ironiza-moro-e-propoe-projeto-de-lei-onyx-lorenzoni.shtml, acesso em 18/11/18,
[xlvii]. https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2018/11/18/tem-nossa-confianca-diz-bolsonaro-sobre-ministra-que-deu-beneficiou-jbs.htm, acesso em 18/11/18.
[xlviii]. http://www.brasil.gov.br/noticias/infraestrutura/2012/03/onu-diz-que-minha-casa-minha-vida-e-exemplo-para-o-mundo, acesso em 15/11/18.
[xlix]. https://www.valor.com.br/brasil/3413340/taxa-media-de-desemprego-em-2013-e-menor-da-historia, acesso em 03/11/18.
[l]. https://economia.uol.com.br/empregos-e-carreiras/noticias/redacao/2014/01/30/em-10-anos-numero-de-desempregados-cai-pela-metade-mostra-ibge.htm, acesso em 12/11/18.
[li]. https://www.infomoney.com.br/minhas-financas/planeje-suas-financas/noticia/2646299/reajuste-real-minimo-foi-desde-primeiro-ano-governo-lula, acesso em 12/11/18.
[lii]. CARVALHO, Laura. A sorte e a política. In: Folha de S. Paulo, edição de 15/11/18, p. A22.
[liii]. https://oglobo.globo.com/economia/na-era-lula-bancos-tiveram-lucro-recorde-de-199-bilhoes-2818232, acesso em 13/11/18.
https://epoca.globo.com/tempo/eleicoes/o-filtro/noticia/2014/09/principais-noticias-eleitorais-do-dia-11-de-setembro-de-2014.html, acesso em 13/11/18.
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2016/03/10/faturamento-de-empreiteiras-da-lava-jato-triplica-na-era-petista.htm, acesso em 13/11/18.
[liv]. https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2016/03/10/faturamento-de-empreiteiras-da-lava-jato-triplica-na-era-petista.htm, acesso em 15/11/18.
[lv]. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/06/minha-casa-minha-vida-piorou-cidades-e-alimentou-especulacao-imobiliaria-diz-ex-secretaria-do-governo-lula.shtml, acesso em 15/11/18.
[lvi]. HELOANI, Roberto. Modelos de gestão e educação: gerencialismo e subjetividade. São Paulo: Cortez, 2018, pp. 178-9.
[lvii]. http://g1.globo.com/economia/seu-dinheiro/noticia/2015/06/endividamento-das-familias-chega-463-o-maior-em-10-anos-mostra-bc.html, acesso em 15/11/18.
[lviii]. http://www.esquerdadiario.com.br/Recorde-de-lucros-dos-banqueiros-e-endividamento-dos-trabalhadores-legados-de-Lula, acesso em 15/11/18.
[lix]. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/09/1678317-dilma-deu-r-458-bilhoes-em-desoneracoes.shtml, acesso em 15/11/18.
[lx]. http://www.automotivebusiness.com.br/noticia/19725/desoneracao-da-folha-sera-permanente, acesso em 15/11/18.
[lxi]. https://www.valor.com.br/brasil/3403634/governo-deixou-de-arrecadar-r-778-bi-com-desoneracoes-em-2013, acesso em 15/11/18.
[lxii]. https://www.sinprofaz.org.br/noticias/sonegometro-revela-mais-de-r-345-bilhoes-sonegados-so-em-2018/, acesso em 20/11/18.
[lxiii]. https://www.valor.com.br/brasil/3333552/no-mundo-brasil-so-perde-para-russia-em-sonegacao-fiscal-diz-estudo, acesso em 20/11/18.
http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/radio/materias/COM-A-PALAVRA/514747-SONEGACAO-FISCAL-NO-BRASIL-CHEGA-A-R$-1-TRILHAO.html, acesso em 20/11/18.
[lxiv]. LIMA, Washington Luiz Moura. “2015 começa com medidas contra os trabalhadores”. In: http://www.sintrajud.org.br/conteudo/detalhe_artigo.php?cod=15
[lxv]. http://economia.uol.com.br/ultimas-noticias/redacao/2012/04/03/governo-anuncia-medidas-economicas-para-tentar-estimular-industria.jhtm, acesso em 30/01/15.
[lxvi]. http://g1.globo.com/economia/noticia/2014/01/renuncia-com-desoneracao-de-folha-ja-e-de-pelo-menos-r-108-bilhoes.html, acesso em 30/01/15.
[lxvii]. https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,governo-bancou-r-3-5-tri-em-subsidios-entre-2003-e-2016-diz-relatorio-da-fazenda,70002074439, acesso em 15/11/18.
[lxviii]. https://www.hojeemdia.com.br/primeiro-plano/investimentos-de-r-66-bilh%C3%B5es-em-copa-e-olimp%C3%ADada-contribu%C3%ADram-pouco-para-avan%C3%A7o-do-pa%C3%ADs-1.381036, acesso em 18/11/18.
[lxix]. https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/09/140905_brasil_parou_entenda_ru, acesso em 13/11/18.
[lxx]. https://g1.globo.com/economia/noticia/deficit-previdenciario-quase-triplica-em-dez-anos-apontam-dados-do-tesouro-nacional.ghtml, aceso em 18/11/18.
[lxxi]. https://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2018/07/16/empreiteiras-encolhem-r-55-bi-apos-lava-jato.htm, acesso em 15/11/18.
[lxxii]. https://jornalggn.com.br/noticia/crise-de-2008-resultou-em-desindustrializacao-e-crise-fiscal-no-brasil, acesso em 15/11/18.
[lxxiii]. https://jornalggn.com.br/noticia/crise-de-2008-resultou-em-desindustrializacao-e-crise-fiscal-no-brasil, acesso em 15/11/18.
[lxxiv]. ALVES, José Eustáquio Diniz. “A crise fiscal e política e a explosão da dívida pública”. Disponível em: https://www.ecodebate.com.br/2016/03/02/a-crise-fiscal-e-politica-e-a-explosao-da-divida-publica-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
[lxxv]. https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/the-new-york-times/2018/11/18/paul-krugman-por-que-a-economia-brasileira-deu-errado.htm, acesso em 18/11/18.
[lxxvi]. https://www.bcb.gov.br/pt-br/#!/c/COPOMJUROS/, acesso em 17/11/18.
[lxxvii]. CARVALHO, Laura. “A sorte e a política”. In: Jornal Folha de S. Paulo, ed. De 15/11/18, p. A22.
[lxxviii]. http://www.econ.puc-rio.br/uploads/adm/trabalhos/files/td626.pdf, acesso em 17/11/18.
[lxxix]. “Na fase atual do ganho-ganha, pelo menos até o ano de 2013, segundo informações oficiais do IBGE, todos os segmentos sociais elevaram significativamente o nível de rendimento. Os 50% mais pobres da população aumentaram a cada ano, em média, 5,8% o poder aquisitivo do rendimento, ao passo que o segmento social intermediário cresceu a renda média em 5,2% ao ano e os ricos subiram 4,1% como média anual entre 2003-2013.” (https://www.brasil247.com/pt/247/artigos/173097/Do-ganha-perde-ao-ganho-ganha.htm, acesso em 18/11/18)
[lxxx]. https://www.em.com.br/app/noticia/economia/2015/03/22/internas_economia,630028/o-imposto-de-cada-brasileiro.shtml, acesso em 20/11/18.
[lxxxi]. MATTOS, Fernando Augusto Mansor. “O debate sobre distribuição de renda ao longo do processo de desenvolvimento econômico do Brasil. Disponível em: file:///C:/Users/jorgemaior/Downloads/36040-85246-1-PB.pdf, acesso em 18/11/18.
[lxxxii]. Vide, a propósito, o caderno de Estudos econômicos da FEA-USP, disponível, em: https://www.fea.usp.br/economia/noticias/balanco-da-economia-brasileira-um-olhar-sobre-os-anos-de-2003-2016, acesso em 18/11/18.
[lxxxiii]. https://auditoriacidada.org.br/conteudo/dilma-veta-auditoria/, acesso em 19/11/18.
[lxxxiv]. https://www12.senado.leg.br/noticias/entenda-o-assunto/pedalada-fiscal, acesso em 19/11/18.
[lxxxv]. https://jornalggn.com.br/noticia/67-dos-brasileiros-acreditam-que-corrupcao-causou-crise-economica, acesso em 19/11/18.
[lxxxvi]. https://www.otempo.com.br/capa/economia/consumidor-culpa-a-corrup%C3%A7%C3%A3o-pela-crise-econ%C3%B4mica-do-pa%C3%ADs-1.1486117, acesso em 19/11/18.
[lxxxvii]. https://oglobo.globo.com/economia/na-era-lula-bancos-tiveram-lucro-recorde-de-199-bilhoes-2818232, acesso em 13/11/18.
https://epoca.globo.com/tempo/eleicoes/o-filtro/noticia/2014/09/principais-noticias-eleitorais-do-dia-11-de-setembro-de-2014.html, acesso em 13/11/18.
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2016/03/10/faturamento-de-empreiteiras-da-lava-jato-triplica-na-era-petista.htm, acesso em 13/11/18.
[lxxxviii]. Em 2017, Dilma declarou que se arrependeu da concessão de isenção fiscal ao setor econômico porque os empresários aumentaram margem de lucro e não abaixaram os preços. Mas aí já era tarde. E ademais, teria sido muita ingenuidade acreditar que a redução de lucros fosse acontecer: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/03/14/Dilma-disse-que-se-arrependeu-das-desonera%C3%A7%C3%B5es-o-que-foi-essa-pol%C3%ADtica-e-quais-as-cr%C3%ADticas-a-ela, acesso em 19/11/18.
[lxxxix]. http://oglobo.globo.com/brasil/fiesp-ciesp-apoiarao-impeachment-da-presidente-dilma-18293920.
[xc]. Revista Exame. Disponível em: <http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/imunes-a-crise-as-25-empresas-com-os-maiores-lucros-de-2015>. Acesso em: 20/07/2016.
[xci]. http://revistagloborural.globo.com/Noticias/Empresas-e-Negocios/noticia/2016/07/usina-da-sao-martinho-e-petrobras-relata-lucro-liquido-de-r-14815-milhoes-em-20152016.html, acesso em 20/07/16.
[xcii]. http://www.automotivebusiness.com.br/noticia/23350/ford-tem-lucro-liquido-cinco-vezes-maior-em-2015, acesso em 20/07/16.
[xciii]. FONSECA, Daniel. “Em meio à crise econômica, Globo tem lucro líquido superior a R$ 3 bi”. In:
http://www.cartacapital.com.br/blogs/intervozes/em-meio-a-crise-economica-globo-tem-lucro-liquido-superior-a-r-3-bi, acesso em 20/07/16
[xciv]. http://www.portaldbo.com.br/Portal/Espaco-empresarial/BRF-tem-lucro-liquido-de-R-31-bi-em-2015/15538, acesso em 20/07/16.
[xcv]. http://www.amanha.com.br/posts/view/1889#sthash.H7gbGJFC.dpufhttp://www.amanha.com.br/posts/view/1889, aceso em 20/07/16.
[xcvi]. http://www.triunfo.com/Show.aspx?IdMateria=NgjK8jWYzY6NOIkylARwDg==, acesso em 20/07/16.
[xcvii]. http://www.sonhoseguro.com.br/2016/02/porto-seguro-obteve-lucro-liquido-de-r-1-bilhao-em-2015-alta-de-14/, acesso em 20/07/16.
[xcviii]. http://www.revistaapolice.com.br/2016/02/irb-brasil-re-tem-maior-lucro-liquido-da-historia/, acesso em 20/07/16.
[xcix]. http://www.correiodopovo.com.br/Noticias/Economia/2016/3/582975/BRDE-registra-lucro-liquido-de-R-263-milhoes-em-2015, acesso em 20/07/16.
[c]. http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/reuters/2016/03/08/caixa-economica-federal-tem-lucro-liquido-de-r72-bi-em-2015.htm, acesso em 20/07/16.
[ci]. http://atarde.uol.com.br/economia/noticias/1759212-lucro-liquido-da-deten-quimica-aumentou-quase-29-em-2015, acesso em 20/07/16.
[cii]. http://fullenergy.grupomidia.com/2016/03/light-tem-lucro-liquido-de-r-424-milhoes-em-2015/, acesso em 20/07/16.
[ciii]. http://www.executivosfinanceiros.com.br/financas/financasg/item/2329-bmg-teve-lucro-l%C3%ADquido-de-r$-189-milh%C3%B5es-em-2015.html, acesso em 20/07/16.
[civ]. http://monitordigital.com.br/lucro-liquido-do-grupo-fleury-cresceu-1087-no-quarto-trimestre-de-2015/, acesso em 20/07/16.
[cv]. http://www.brasil247.com/pt/247/minas247/223202/Cemig-tem-lucro-l%C3%ADquido-de-R$-25-bi-em-2015.htm, acesso em 20/07/16.
[cvi]. http://www.beefpoint.com.br/cadeia-produtiva/giro-do-boi/frigol-teve-lucro-liquido-de-r-228-milhoes-em-2015/, acesso em 20/07/16.
[cvii]. http://felipevieira.com.br/site/banrisul-obteve-r-8488-milhoes-de-lucro-liquido-em-2015/, acesso em 20/07/16.
[cviii]. http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2016/03/03/internas_economia,520331/embraer-encerra-4-trimestre-com-lucro-liquido-aos-acionistas-de-r-42.shtml, acesso em 20/07/16.
[cix]. http://www.valor.com.br/empresas/4546311/andrade-gutierrez-reverte-prejuizo-e-lucra-r-6477-milhoes-em-2015, acesso em 20/07/16.
[cx]. http://www.valor.com.br/empresas/4428532/coca-cola-fecha-trimestre-com-lucro-acima-de-us-1-bi-e-receita-menor, acesso em 22/07/16.
[cxi]. http://www.valor.com.br/empresas/4399526/lucro-da-unilever-cai-em-2015-mas-desempenho-melhora-em-emergentes, acesso em 22/07/16.
[cxii]. http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/negocios/20160426/lucro-procter-gamble-sobe-275-bilhoes-trimestre-fiscal/366285, acesso em 22/07/16.
[cxiii]. (https://moneytimes.com.br/lucro-das-empresas-abertas-cresce-94-em-2016-bancos-concentram-os-maiores-ganhos/, acesso em 19/11/18.
[cxiv]. https://g1.globo.com/economia/noticia/lucro-liquido-das-empresas-de-capital-aberto-cresce-17-em-2017.ghtml, acesso em 19/11/18.
[cxv]. https://g1.globo.com/economia/noticia/lucro-das-empresas-de-capital-aberto-cresce-74-no-1-trimestre.ghtml; https://g1.globo.com/economia/noticia/2018/08/16/lucro-das-empresas-de-capital-aberto-cresceu-76-no-segundo-trimestre.ghtml, acesso em 19/11/18.
https://economia.uol.com.br/cotacoes/noticias/redacao/2018/08/16/lucro-das-empresas-na-bolsa.htm, acesso em 19/11/18.
[cxvi]. https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2018/04/11/concentracao-renda-ibge.htm, acesso em 19/11/18.
[cxvii]. https://www.gazetadopovo.com.br/economia/remessa-de-lucros-em-agosto-bate-recorde-do-mes-cevrx9te29frbvj30bg9obpse/
[cxviii]. https://www.valor.com.br/brasil/5446455/pobreza-extrema-aumenta-11-e-atinge-148-milhoes-de-pessoas
[cxix]. https://www.valor.com.br/brasil/5617411/reforma-trabalhista-aumentou-desigualdade-dizem-pesquisadores
[cxx]. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/08/remessa-ao-exterior-passa-de-us-1-bi-e-bate-recorde-no-primeiro-semestre.shtml
[cxxi]. Vide, a propósito: SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. “Por uma auditoria na Previdência Social já”. Disponível em: https://www.jorgesoutomaior.com/blog/por-uma-auditoria-na-previdencia-social-ja, acesso em 19/11/18.
[cxxii].Vide, a propósito: SOUTO MAIOR, Jorge Luiz & ROCHA, Bruno Gilga Sperb. “A história da ilegitimidade da Lei n. 13.467/17.” In: SOUTO MAIOR, Jorge Luiz & SEVERO, Valdete Souto (coords). Resistência: aportes teóricos contra o retrocesso trabalhista. São Paulo: Expressão Popular, 2017, pp. 15-28.
[cxxiii]. http://oglobo.globo.com/economia/ministerio-do-trabalho-perde-estrutura-relevancia-16580932.
[cxxiv]. ASSUNÇÃO, Diana. “Nos governos Lula e Dilma a terceirização saltou de 4 milhões para 12,7 milhões de trabalhadores”. In: http://www.esquerdadiario.com.br/Nos-governos-Lula-e-Dilma-a-terceirizacao-saltou-de-4-milhoes-para-12-7-milhoes-de-trabalhadores.
[cxxv]. http://www.ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/151005_sessao8.
[cxxvi]. http://www.conjur.com.br/2014-jul-04/brasil-quarto-pais-numero-acidentes-fatais-trabalho
[cxxvii]. http://www.conjur.com.br/2014-jul-04/brasil-quarto-pais-numero-acidentes-fatais-trabalho
[cxxviii]. https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/10/toffoli-diz-que-hoje-prefere-chamar-ditadura-militar-de-movimento-de-1964.shtml, acesso em 20/11/18.
[cxxix]. Vide, em sentido contrário, Vide o Manifesto contra a Reforma Trabalhista, elaborado por pesquisadores do CESIT-Unicamp, in: http://www.cesit.net.br/manifesto-contra-a-reforma-trabalhista/, acesso em 20/11/18.
[cxxx]. https://www.anamatra.org.br/artigos/1076-mps-664-e-665-tragedias-anunciadas, acesso em 03/11/18.
[cxxxi]. https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI223107,101048-E+o+governo+brasileiro+disse+SIM, acesso em 03/11/18.
[cxxxii]. VIANNA, Luiz Werneck. Liberalismo e Sindicato no Brasil. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999, p. 111.
[cxxxiii]. VIANNA, Luiz Werneck. Liberalismo e Sindicato no Brasil. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999, p. 113.
[cxxxiv]. NOGUEIRA, O. Pupo. A indústria em face das leis do trabalho. Escolas Profissionaes Salesianas. São Paulo, 1935, pp.67 e 70.
[cxxxv]. “O panelaço de barriga cheia e do ódio” (http://blogdojuca.uol.com.br/, acesso em 09/03/15).
[cxxxvi]. Apud, COSTA, Emília Viotti da. Da senzala à colônia. São Paulo: Editora UNESP, 1998, p. 419.
[cxxxvii]. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/11/para-acalmar-mercado-guedes-comecara-transicao-com-reforma-da-previdencia.shtml, acesso em 07/11/18.
[cxxxviii]. https://www.infomoney.com.br/mercados/acoes-e-indices/noticia/7755539/paulo-guedes-diz-que-fusao-entre-banco-do-brasil-e-bank-of-america-e-uma-ideia-para-o-futuro, acesso em 07/11/18.
[cxxxix]. https://br.reuters.com/article/topNews/idBRKCN1M72IP-OBRTP, acesso em 01/11/18.
[cxl]. https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2018/11/06/bolsonaro-diz-no-congresso-que-a-constituicao-e-o-unico-norte-da-democracia.ghtml, acesso em 07/11/18.
[cxli]. https://www.jorgesoutomaior.com/blog/armas-psicologicas-ameacam-a-justica-do-trabalho, acesso em 03/11/18
https://www.jorgesoutomaior.com/blog/se-assediam-juizes-o-que-nao-farao-com-os-trabalhadores, acesso em 03/11/18.
[cxlii]. https://www.diariodocentrodomundo.com.br/um-ano-da-reforma-trabalhista-medida-reduziu-renda-nao-gerou-emprego-e-precarizou-trabalho/, acesso em 11/11/18.
[cxliii]. https://www.valor.com.br/brasil/5446455/pobreza-extrema-aumenta-11-e-atinge-148-milhoes-de-pessoas
[cxliv]. https://www.valor.com.br/brasil/5617411/reforma-trabalhista-aumentou-desigualdade-dizem-pesquisadores
[cxlv]. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/08/remessa-ao-exterior-passa-de-us-1-bi-e-bate-recorde-no-primeiro-semestre.shtml
[cxlvi]. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/05/falta-trabalho-para-277-milhoes-de-pessoas-diz-ibge.shtml
[cxlvii]. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/11/bolsonaro-confirma-extincao-do-ministerio-do-trabalho.shtml, acesso em 07/11/18.
[cxlviii]. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/11/guedes-assumira-funcoes-do-trabalho-e-aprofundara-flexibilizacao-de-direitos.shtml, acesso em 11/11/18.
[cxlix]. http://divulgacandcontas.tse.jus.br/candidaturas/oficial/2018/BR/BR/2022802018/280000614517//proposta_1534284632231.pdf, acesso em 07/11/18.
[cl].Vide, a propósito: SOUTO MAIOR, Jorge Luiz & ROCHA, Bruno Gilga Sperb. “A história da ilegitimidade da Lei n. 13.467/17.” In: SOUTO MAIOR, Jorge Luiz & SEVERO, Valdete Souto (coords). Resistência: aportes teóricos contra o retrocesso trabalhista. São Paulo: Expressão Popular, 2017, pp. 15-28.
[cli]. http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2017/05/1880242-dores-da-democracia.shtml
[clii]. https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2017/10/1926959-guerrilha-trabalhista.shtml
[cliii][cliii]. https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2018/11/nova-clt-1o-ano.shtml, acesso em 13/11/18.
[cliv]. https://g1.globo.com/educacao/noticia/2018/10/30/usp-volta-a-ser-a-melhor-do-pais-em-ranking-de-universidades-da-america-latina.ghtml, acesso em 03/11/18.
[clv]. https://www.valor.com.br/brasil/5962455/especialistas-temem-piora-na-gestao-do-mec-sem-ganho-de-eficiencia, acesso em 03/11/18.
[clvi]. https://www.nexojornal.com.br/expresso/2018/10/24/Quem-Bolsonaro-j%C3%A1-aponta-como-prov%C3%A1vel-ministro-se-for-eleito, acesso em 03/11/18.
[clvii]. Vide, a propósito: https://www.jorgesoutomaior.com/blog/o-stf-em-materia-trabalhista-e-o-curioso-caso-de-benjamin-button, acesso em 20/11/18.
[clviii]. Vide, a propósito, SAFATLE, Vladimir. Crise permanente. In: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/vladimirsafatle/2018/11/a-crise-permanente.shtml, acesso em 12/11/18.