Para tratar de questões processuais concretas suscitadas pela Lei n. 13.467/17, dando continuidade à série iniciada no texto anterior, mais uma vez vou deixar de lado a crítica já reiteradamente feita ao modo como se elaborou e se aprovou a "reforma" trabalhista, mas sem abandonar o argumento principal de que a segurança jurídica no âmbito do Direito do Trabalho e a minimização do sofrimento dos trabalhadores no ambiente de trabalho só podem ser alcançadas com a revogação dessa lei.
Falando, especificamente, da petição inicial, cumpre lembrar que durante muito tempo a doutrina e a jurisprudência se recusaram a aplicar o § 1º do art. 840 da CLT quanto aos requisitos da petição inicial, considerando que estes deveriam seguir os parâmetros do CPC.
Por consequência restam afastadas quaisquer exigências de informações aos reclamantes para a propositura de reclamações além daquelas previstas no § 1º do art. 840 da CLT.
A bem da verdade, o dispositivo atual repete o anterior, mas isso serve tanto para reforçar os requisitos exigidos pela CLT quanto para revitalizar o princípio da oralidade, impregnado no procedimento consagrado no processo do trabalho, e para reafirmar as preocupações processuais básicas com a ampliação do acesso à justiça, a instrumentalidade das formas e a simplicidade.
Continua, pois, prevalecendo a compreensão, extraída do texto legal, de que uma petição inicial trabalhista não depende de causa de pedir, fundamentação jurídica, qualificação jurídica do pedido, especificação de provas, requerimento de citação ou mesmo qualificação das partes por formas específicas.
Basta que apresente: “designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante”.
É o que diz a lei.
A inovação trazida na Lei n. 13.467/17 fica por conta da exigência de que o pedido deva “ser certo, determinado e com indicação de seu valor”.
Isso, no entanto, não representa uma alteração substancial, pois a precisão e a determinação do pedido dizem respeito à sua própria essência e a indicação do valor, como está expresso no dispositivo legal referido, não passa de uma indicação, ou seja, não se trata de uma liquidação, vez que essa só decorre da condenação.
O texto legal faz referência expressa a “indicação do seu valor” (do pedido), o que deve ser tomado, literalmente, como uma indicação e não como uma certeza, a qual só se obterá com os limites fixados no julgamento e após a necessária liquidação.
Importantíssimo verificar que o próprio legislador (da Lei 13.467/17) deixa claro que a definição do valor efetivamente devido será feita com a liquidação da sentença. Vide, a propósito, o teor do art. 791-A, que estabelece que os honorários advocatícios devidos ao advogado do reclamante serão calculados sobre “o valor que resultar da liquidação da sentença”.
O valor do pedido, indicado na inicial, ademais, é, meramente, a expressão econômica que se considera advir do pedido (daí a expressão “indicação”), sendo que mesmo essa indicação não poderá ser exigida quando for impossível (ou bastante difícil, dada a complexidade dos cálculos trabalhistas que muitas vezes se apresentam) fazê-lo no momento da propositura da ação, considerando-se, como deve ser, que em muitas situações isso não é possível. Mesmo o CPC tem regra neste sentido (§ 1º do art. 324, CPC).
Por conta de tudo isso, em nenhuma hipótese o valor apresentado delimita a condenação porque o juiz julga o pedido, na perspectiva de uma correspondência entre o fato e o direito.
Concretamente, o juiz aplica o direito ao fato, embora vinculando-se à delimitação do pedido, que, como se sabe, é a decorrência jurídica lógica do fato aduzido.
Então, se o direito aplicado ao caso concreto gerar um resultado econômico superior ao valor indicado na inicial, a devida prestação jurisdicional, que é uma obrigação constitucional, deverá considerar o valor efetivamente devido, que será apurado em liquidação de sentença, valendo lembrar que os direitos trabalhistas, em sua grande maioria, cuidam de questões de ordem pública, sob o império, inclusive, do princípio da irrenunciabilidade.
Havendo condenação, o que prevalece, portanto, é o valor que se extrai da liquidação da sentença e não o valor apresentado para o pedido, que é, como se viu, meramente indicativo.
O valor indicado do pedido só servirá, nos termos da lei, para o cálculo do valor da causa, o qual somente repercute na determinação do procedimento (ordinário, sumário ou sumaríssimo) e no cálculo das custas, no caso de improcedência total dos pedidos.
Trata-se, portanto, de atos ilegais tanto a exigência do juiz para que o reclamante emende a inicial para “liquidar” os pedidos, sem considerar, inclusive, as situações em que sequer a indicação é possível, quanto a ameaça de que a eventual condenação em sentença será limitada ao valor “liquidado”, até porque, como já dito, o art. 791-A da CLT deixa claro que o valor da liquidação não está delimitado pelo valor do pedido.