Disciplina: “História do Direito do Trabalho no Brasil”
Professor responsável: Jorge Luiz Souto Maior
Faculdade de Direito da USP
Dia 29/10/21
Horário: 19h
Transmissão no Youtube: "Canal História Contemporânea do Trabalho no Brasil" pelo link
As greves de trabalhadores têm sido um dos principais fatores de mobilização social e de impulso para a conquista de direitos na história do país e também representam momentos de retomada da consciência de classe, da relevância da atuação coletiva e da solidariedade. Mas, também, e talvez por isso mesmo, atraem olhares de reprovação e provocam reações institucionais repressoras e violentas, reveladoras de muitas das chagas culturais brasileiras e é por isto que o estudo do percurso das greves pode nos auxiliar a melhor entender o Brasil.
Entender o Brasil e, de modo mais específico, o Direito do Trabalho, por meio da análise do percurso das greves, é o ponto de partida das análises que vêm sendo desenvolvidas ao longo das aulas na disciplina História do Direito do Trabalho no Brasil, que está sendo ministrada neste semestre no curso de pós-graduação da Faculdade de Direito da USP.
Estudou-se, na sequência, a constituição da classe trabalhadora do Brasil no início do Séc. XX, por meio da análise de movimentos sociais (Movimento dos têxteis de 1903, Revolta da Chibata, Revolta das Vacinas e Greve Geral de 1917), sob uma crítica do materialismo. Foi trazido a exame o desenvolvimento de uma classe social de operários oriunda da abolição do regime de escravização do Séc. XIX e do racismo enraizado na sociedade (e institucionalizado pelas tendências da forma Estado e forma jurídica como derivações da forma mercadoria), além da influência imigrante nas lutas sociais do período. A presença massiva de mulheres entre grevistas (inclusive por greves incitadas por alas femininas de indústrias) e o apagamento histórico dessas lutas feministas e de classe foram destacadas no trabalho, que concluiu por compreender uma tendência na reprodução de discursos de desqualificação dos movimentos, inclusive em suas nomenclaturas (minimizando sua importância), próprio de interesses das classes dominantes. Verificou-se pelo seminário que ideais reformistas, ao cabo dos movimentos, reforçaram a forma jurídica e, com isso, a forma mercadoria das relações sociais na constituição da classe trabalhadora brasileira, classe cosmopolita e duramente reprimida desde as primeiras experiências de trabalho assalariado no Brasil.
Mereceu acurada análise o contexto histórico do início da década de 20, com destaque para: a transição entre trabalho escravizado e trabalho “livre” e as consequências desse processo para trabalhadores e trabalhadoras negras no país; a questão do trabalho migrante e o crescimento inicial da industrialização urbana; a construção do trabalho como valor positivo e o uso da repressão das expressões culturais e comunitárias dos trabalhadores e trabalhadoras como forma de disciplinamento para o trabalho. Nesse contexto, foi analisada a criminalização da vadiagem, da capoeira e do samba como um esforço concentrado de “organizar e domesticar” a classe sob a lógica capitalista que se expandia no Brasil. Também na ressaca dos anos anteriores de intensa luta, a década de 1920 foi palco de profundas transformações (como o surgimento do Partido Comunista em 1922) e teve como um de seus principais traços o avanço da repressão estatal, com a criação da Delegacia de Ordem Política e Social (DOPS), a expulsão de estrangeiros e até mesmo a instalação de campos de concentração e centros de tortura para “subversivos”, temas debatidos durante a apresentação.
Em seguida, o objetivo foi apresentar e refletir sobre experiências, vivências e mobilizações trabalhistas, sindicais e comunistas voltadas à conquista de direitos e transformações sociais ocorridas durante o período do primeiro governo de Getúlio Vargas e do governo de Eurico Dutra. Para tanto, a apresentação foi organizada em torno de cinco eixos. O primeiro eixo envolveu (re)contar um trecho da história de vida de Patrícia Galvão, mais conhecida como Pagu, na década de 1930 enquanto representativa da atuação de militantes comunistas em nosso país naquele momento histórico e de sua perseguição promovida pelo Estado brasileiro. O segundo eixo envolveu a abordagem das vivências sindicais e comunistas de ferroviárias e ferroviários de Santa Catarina e do Paraná na década de 1930 em sua luta por diferentes e melhores condições de trabalho e vida, reportadas pela historiadora Claudia Monteiro, com destaque para greve deflagrada em 1934 que chegou a mobilizar mais de 7 mil trabalhadoras e trabalhadores. O terceiro eixo envolveu o resgate de parte da história de luta de Laudelina de Campos Melo pela conquista de direitos trabalhistas para as empregadas domésticas brasileiras, assim como do próprio direito à organização e à atuação sindicais, em um movimento que buscou lançar olhares para outras possibilidades de resistência trabalhadora por transformações sociais para além da figura da greve. O quarto eixo envolveu a apresentação de um cenário de significativa mobilização trabalhadora e sindical no período que se segue à Intentona Comunista e se estende até o final do Estado Novo, com a deflagração de inúmeras greves, como reportado por pesquisadoras e pesquisadores como Gustavo Siqueira Silveira e Fátima Azevedo, em dissonância à narrativa historiográfica hegemônica. O quinto e último eixo envolveu a discussão a respeito da constitucionalização do direito de greve na Assembleia de 1946, destacando ter sido um tema de muitos debates e cuja previsão constitucional era uma demanda de trabalhadoras, trabalhadores e seus sindicatos.
Foram analisadas algumas das principais greves ocorridas a partir do segundo governo Vargas (1951) até 1964, quando da ocorrência do Golpe Militar. Foi apresentado um breve contexto histórico, demonstrando a forma como Vargas voltou ao poder e a posição dos trabalhadores naquele momento. Com a acentuação da crise econômica em 1953, as greves se intensificaram de maneira bastante considerável. Evidenciou-se uma forte articulação dos trabalhadores e da organização dos sindicatos. Foi nesta época que se constituiu um Comitê Intersindical de Greve em São Paulo, que mais tarde se transformaria no Pacto de Unidade Sindical, o PUI. As greves contaram com uma forte atuação dos trabalhadores dentro e fora das fábricas, ressaltando-se as diversas comissões organizadas, bem como a movimentação dos piquetes, especialmente na Greve dos 400 mil. Essa organização, desde 1953, foi essencial para a mobilização das greves posteriores. Importante observar também como a conjuntura política foi capaz de interferir no contexto das greves e na intensidade das repressões.
Em prosseguimento, refletiu-se sobre a história do neoliberalismo e das condicionantes geopolíticas que possibilitaram seu avanço como forma hegemônica da regulação capitalista na sua fase pós-fordista, incluindo sua efetiva chegada ao Brasil, representada pelas políticas econômicas e de desregulamentação do trabalho ocorridas nos Governos Collor e FHC. Também foi feito um paralelo com a Greve dos Mineiros do Reino Unido de 1984-1985, à luz do conceito do “realismo capitalista” proposto pelo teórico Mark Fisher. Quanto às Greves dos Petroleiros de 1994 e 1995, o movimento foi enfocado não apenas sob o prisma das reivindicações da categoria, mas como efetiva resistência ao próprio neoliberalismo, notadamente no que tange às privatizações. Constatou-se que os petroleiros enfrentaram as próprias estruturas estatais, Judiciário e Executivo, modulados por uma ideologia altamente individualista, fomentada pela mídia, a qual distorcia fatos e procurava deslegitimar o movimento aos olhos da sociedade. Por outro lado, os estudos demonstraram a existência de um elevado espírito de camaradagem da classe trabalhadora, não somente dos petroleiros e de suas famílias, mas também de outras categorias, articuladas pela CUT, também contando com o suporte de movimentos sociais, com destaque ao MST. Por fim, apesar do não acolhimento das reivindicações, concluiu-se que as Greves dos Petroleiros constituíram marco de resistência e de dissuasão em relação às políticas neoliberais de precarização do trabalho, como também de defesa aos ataques de espoliação às riquezas nacionais.
Projetando, agora, falar sobre a história mais recente (sem deixar de lado a base estrutural racista), foram vislumbradas, como objeto de análise, as greves dos garis do Rio de Janeiro, sobretudo diante do breve relato abaixo, extraído de documentos publicamente divulgados pelas lideranças dos trabalhadores e trabalhadoras.
Em 2014, a greve dos garis, em pleno Carnaval, ficou conhecida mundialmente. Em vez de negociar, a empregadora, a COMLURB (controlada financeira e administrativamente pelo Municipio do Rio de Janeiro) efetuou a demissão de 300 garis, o que gerou efeito reverso, fazendo crescer a mobilização. Ao final de tudo, chegou-se a uma considerável conquista dos trabalhadores representada pelo reajuste de 37% no salário.
No ano seguinte, 2015, nova greve foi deflagrada, mas desta feita forte instrumentalização de repressão foi mobilizada, incluindo táticas de desmobilização como um esquema de contingência ilegal (com denúncia, inclusive, de contratação de crianças e adolescentes) e escolta armada para furar a greve.
Novo reajuste foi alcançado e mesmo assim 50 trabalhadores foram sumariamente demitidos. A maioria conseguiu voltar ao trabalho por intermédio de decisões judiciais.
Pleiteando reajuste de 10% nos salários e no vale-alimentação, os garis deflagram nova greve, em 22 abril de 2019. Por intermediação do Tribunal Regional do Trabalho da 1a. Região, em audiência de conciliação realizada no dia 29 de abril, os garis aceitam a proposta de um reajuste salarial de 4,7%, além da manutenção dos demais benefícios estabelecidos no acordo coletivo de 2018 (valendo lembrar que, sem a ultratividade, a manutenção de direitos acabou se transformando em “conquista”).
Agora, em 2020 e 2021, durante a pandemia, os garis, além de estarem com salários congelados desde 2019 e outros benefícios, como vale-alimentação, desde 2018, denunciam a falta de sabão e de água nas gerências. No entanto, diante das experiências anteriores, repletas de demissões e disputas judiciais para reversão da situação, não realizam uma greve, ficando para as lideranças e representantes a tarefa de buscarem junto ao empregador a implementação concreta das condições de trabalho necessárias para a preservação da saúde e da vida dos garis.
É neste contexto que o histórico de Bruno da Rosa, trabalhador braçal, gari e negro, é digno de ser destaque.
Desde 2014, Bruno se tornou uma reconhecida liderança sindical de sua categoria, tendo participado ativamente de todas as negociações salariais como membro da comissão de negociação eleita em assembleia. Integrou, também, o comando da greve de 2019. Atualmente é vice-presidente da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA, tendo sido eleito com ampla maioria dos votos, além de integrar a comissão de negociação da campanha salarial de 2021.
Ao longo dos últimos anos, em razão de sua atuação em defesa dos direitos da categoria que integra e, muito provavelmente, por ser negro, já que, no Brasil, não é dado a pessoas negras exercerem cidadania, Bruno tem sido vítima de uma intensa perseguição de seu empregador, mesmo após reiteradas decisões do Poder Judiciário trabalhista reprovando tais atos de perseguição.
Em março de 2015, Bruno participa da comissão de negociação e da greve e, logo após o fechamento do acordo, é transferido para trabalhar em localidade que fica a cerca de três horas da sua casa.
Em abril/2015, sem que qualquer fato novo ocorra é demitido. Por consequência, até março de 2016, Bruno fica sem receber qualquer remuneração, até que, por decisão do TRT1, é reintegrado ao trabalho. Na mesma ação, a COMLURB é condenada a reconduzir Bruno ao seu antigo posto de trabalho, demonstrando a duplicidade da represália que já havia sofrido. Na sentença proferida pela juíza Miriam Valle Bitteconurt da Silvano (processo nº 0010779-17.2015.5.01.0040), é reconhecido, inclusive, que demissão se deu por razões políticas:
“Nesse passo, extraio que o autor acabou por ser dispensado apenas com esteio em avaliação administrativa, realizada conforme a conveniência do administrador, sem a necessária cautela para motivar a pena máxima. Sendo forçoso concluir que o autor não cometeu nenhuma das faltas graves expostas pelo réu a autorizar a dispensa por justa causa. Oportuno ressaltar que há outros processos em trâmite nesta Vara do Trabalho, dando ciência de que houve dispensa de outros empregados também por justa causa, por conta de participação na greve, circunstância que traz a este Juízo, sentimento de conotação política na condução dos processos de demissão, que não pode ser ratificada pelo Judiciário
[...]
Em sendo assim, e, não havendo, anuência do autor para a transferência, vislumbro nítida intenção retaliativa, punitiva empreendida pelo réu para afastar o autor da sua lotação original, configurando-se conduta manifestamente abusiva que ultrapassa os limites do jus variandi.” (grifou-se)
No entanto, um dia após ser reintegrado, Bruno é transferido para outra gerência e em seguida é aberto calendário para a eleição da CIPA, o que o impede de concorrer ao pleito.
Em julho de 2016, acórdão da lavra da Desa. Giselle Bonfim Lopes Ribeiro, do TRT da 1ª Região, mediante votação por unanimidade, mantém a reintegração de Bruno, reafirmando que a demissão havia sido por "evidente motivação política":
“A justa causa configura-se em rompimento contratual excepcionalíssimo, na medida em que o salário é a fonte de subsistência dos trabalhadores. Assim, incumbe à Ré provar a falta grave que opõe como fato impeditivo dos direitos decorrentes da cessação do pacto e perseguidos pelo Autor. Sendo frágil referida prova e considerando a evidente motivação política, como forma de coibir o direito de participar de greve, correta a sentença que determinou a reintegração do Autor. (Acórdão Proc. nº 0010779-17.2015.5.01.0040)
Em março de 2017, em votação assemblear dos trabalhadores, Bruno é eleito para integrar a Comissão de Negociação. Em outra assembleia, convocada para decidir se a categoria aceitaria a proposta de um reajuste de 10% no vale-alimentação formulada pela empregadora, Bruno é o único a se posicionar contrário e sua posição acaba saindo vencedora na votação da assembleia. Sem a aceitação da proposta, a categoria acabou conquistando um reajuste de 15%.
Por conta dessa postura, dois dias após o fechamento do Acordo Coletivo, Bruno volta a sofrer perseguições.
No dia 4/4/2017, Bruno recebe advertência por falta ao serviço no dia 29 de março (data da assembleia da categoria), mesmo informando que no dia em questão estava de folga e mesmo tendo este fato sendo explicitamente reconhecido por quem efetivou a advertência.
No dia 12/04/2017, os trabalhadores da gerência onde Bruno atua organizam um abaixo-assinado solicitando a retirada da punição a ele imposta.
A questão é judicializada e, em 31/01/2018, o Poder Judiciário trabalhista, em sentença proferida pela juíza Maria Alice de Andrade Novaes, no processo nº 0100616-82.2017.5.01.0050, reverte a punição sofrida por Bruno, reconhecendo, ainda, o dano moral experimentado:
“O teor do documento assinado pelos colegas de setor do reclamante, bem como o depoimento da testemunha, comprovam que a punição se deu por clara atitude de retaliação e perseguição pessoal, uma vez que não poderia lhe ser imputada falta injustificada num dia em que lhe foi concedida folga.
[...]
Restou comprovado pelo abaixo assinado constante dos autos, bem como pelo depoimento da testemunha ouvida em juizo, que o Reclamante vem sofrendo sucessivas perseguições e retaliações em função de suas atividades na defesa dos interesses dos trabalhadores, já que participa ativamente de atividade sindical e integra a CIPA. como representante dos empregados.
Observe-se que a Ré inclusive já tentou dispensar o Reclamante, mas foi reconhecido em juízo que a dispensa foi nula, sendo fruto de perseguição política, o que ensejou a decisão de sua reintegração.
A ré vem aplicando penalidades indevidas, como aquela do dia 29 de março, onde foi imputada falta injustificada ao serviço em dia que seria sua folga compensatória deferida por sua chefia.
Observe-se que o autor tentou administrativamente reverter a imputação da falta do dia 29 de março mas não teve êxito.
Por outro lado, ficou clara a perseguição já que o reclamante não tem suas atribuições designadas por sua chefia imediata como ocorre com os trabalhadores em geral da ré, mas sim pela gerência.
A transferência do autor para gerencia totalmente distante de sua residência foi reconhecida pela sentença de fls.15 como sendo meramente retaliativa, por conta de sua atuação sindical junto ao movimento paredista ocorrido na empresa.
A atitude de retaliação constante, de perseguição pessoal permanente, cria uma situação de efetivo estresse, desgaste emocional, sendo inequívoco o sofrimento causado, pela submissão constante do trabalhador a atitudes abusivas no intuito de criar uma intimidação pessoal.
A situação provoca um conflito interno significativo na mente do empregado, que fica entre a atuação efetiva na representação dos interesses dos trabalhadores e as consequências lesivas de ter que se submeter a atitudes retaliativas, punições indevidas, tentativas de imputação de falta grave para dispensa motivada, dentre outros.
Observe-se que em função da dispensa por mera perseguição, como reconhecido em juízo, o Reclamante ficou por vários meses sem receber salário, privado do seu meio de sustento, apesar de ser pai de família. A intimidação é efetiva.
É uma pressão psicológica constante.
Assim provado o ato abusivo da ré, o sofrimento daí decorrente e o nexo de causalidade.”
Em 22/8/2018, apreciando o recurso interposto pela COMLURB, o TRT da 1ª Região, em acórdão redigido pela Desa. Ana Maria Soares de Moraes, após votação por unanimidade, mantém a decisão de primeiro grau, reforçando a necessidade de o Poder Judiciário ser um instrumento para coibir as condutas antissindicais da empregadora de Bruno:
“A característica primordial do assédio moral é a prática reiterada da perseguição, tendo como efeito final a sensação de exclusão e vulnerabilidade do trabalhador. Fica claro que, pela gravidade dos efeitos, que atingem sobretudo a dignidade do empregado no seu ambiente de trabalho, tal prática deve ser erradicada pelo empregador e, caso não seja, pelo Poder Judiciário, que detém a parcela do poder estatal para proteger ou reparar a vítima, quando esta submete ao Estado o seu caso.
No caso dos autos, é incontroverso que o reclamante se engajou politicamente em prol da categoria profissional, como líder sindical, integrante da comissão de negociação e membro da CIPA, ao longo da relação de emprego iniciada em 09/01/2006.
Já foi decidido judicialmente que sofreu perseguição política pela reclamada, desde março de 2015, culminando na sua dispensa nula e arbitrária em 28/04/2015, motivo pelo qual foi determinada a sua reintegração.
Alegou o autor que o assédio sofrido pela reclamada não findou após o seu retorno ao trabalho, pois foi designado para nova gerência, foram-lhe atribuídas tarefas proibidas por Junta Médica e aplicada falta injusta, produzindo prova documental e testemunhal sobre a perseguição sofrida (CLT, art. 818).
[...]
Entende-se com isso que ficou comprovada a perseguição da reclamada em resposta aos atos políticos do reclamante, configurando-se o que chamamos de conduta antissindical da empregadora.
[...]
A fim de garantir o pleno exercício das atividades sindicais, o Poder Judiciário tem o poder-dever de coibir e combater as práticas antissindicais, que configura abuso do poder diretivo do empregador, ao ofender direito da coletividade dos trabalhadores.
Assim, entende-se comprovada as reiteradas condutas antissindicais da reclamada capaz de abalar o psicológico de todo e qualquer empregado que se engaje politicamente em prol da categoria profissional. Comprovada a conduta, dela se deduz a ocorrência de dano moral in re ipsa.”
Em maio de 2019, Bruno participa da comissão de negociação e integra o comando da greve daquele ano.
Em fevereiro de 2020, Bruno é eleito novamente em assembleia como membro da Comissão de Negociação da campanha salarial. As negociações não acontecem e o Acordo Coletivo segue em aberto sem reajuste.
No dia 24 de junho de 2020, já no correr do período pandêmico, Bruno, no exercício de suas funções, como membro da CIPA, denuncia a falta de condições de trabalho e a falta de protocolo para que promovesse o necessário afastamento do trabalho de um colega que cuidava da mãe que veio a óbito por complicações provocadas pela COVID-19.
A fala emocionada de Bruno foi gravada e o vídeo teve enorme repercussão, tendo sido, inclusive, transmitida no RJTV, jornal de grande audiência na capital carioca (https://globoplay.globo.com/v/8627087). Uma matéria no site do Jornal O Globo, também repercutiu a questão, onde pode ser visto o vídeo na íntegra (https://oglobo.globo.com/rio/gari-denuncia-falta-de-epi-critica-plano-de-flexibilizacao-da-prefeitura-do-rio-sera-uma-carnificina-veja-video-1-24489865).
O resultado? Bruno recebe uma suspensão de 5 dias.
Em decorrência, os trabalhadores do local de trabalho de Bruno organizam novo abaixo-assinado contra a punição a ele imposta. A Câmara Municipal, o sindicato que representa a sua categoria e a Comissão de Trabalho da ALERJ fazem apelo pela revogação da punição. Mas a punição não é revertida.
Em fevereiro de 2021, Bruno é novamente eleito em assembleia geral para integrar a Comissão de Negociação da campanha salarial.
Após dois anos de salários congelados e 3 anos com outros benefícios econômicos sem reajuste, em setembro de 2021, a COMLURB decide, sem prévio aviso, trocar o plano de saúde, atingindo tratamentos, cirurgias marcadas e acompanhamentos médicos.
No dia 5 de Outubro, Bruno e outros ativistas convocam uma reunião para discutir a situação. Trabalhadores de mais de 30 locais diferentes participam da reunião, na qual se decide pleitear ao sindicato a convocação de uma assembleia geral para tratar do assunto.
No dia 7 de outubro/2021, após ato na porta do sindicato, os trabalhadores decidem ir até a sede da empresa para protocolar uma petição na qual pediam esclarecimentos a respeito do plano de saúde. A fala de Bruno no ato pode ser visualizada em: https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=395483568888440&id=100001410346102&sfnsn=wiwspwa.
Em 18 de outubro de 2021, em virtude da participação nesta mobilização, Bruno é transferido de horário, sem que se atendesse normativo do Acordo Coletivo da categoria que estabelece que mudanças de jornada só devem ser feitas com aviso prévio de 15 dias. Aparentemente, a mudança no horário de trabalho de Bruno se deu, também, para impedi-lo de ir a uma nova manifestação marcada para o dia 20/10.
No dia 20 de outubro de 2021, Bruno ajuda a convocar o novo ato da categoria, mas não pode comparecer, por estar em novo horário de trabalho. O ato ganha muita força e marcha até a prefeitura do Rio de Janeiro.
Por fim (do relato, mas não da história), no dia 22 de outubro de 2021, Bruno é demitido, sob o argumento de que teria invadido a sede da empresa no dia 7 de outubro e que não poderia participar de um ato, já que estava afastado por licença médica.
Tratar desse tema em sala de aula, sobretudo, em um evento público, de modo, inclusive, a conferir efetividade aos propósitos do ensino em uma instituição pública, apresenta-se, pois, como uma providência de extrema relevância.
Afinal, para entender o Brasil é preciso dar visibilidade ao que se passa no mundo do trabalho e nada melhor que um evento de crise, como a greve e, mais ainda, uma greve em período de pandemia, para explicitar os elementos que constituem a nossa história.
A presença no evento, para ouvir e prestar solidariedade, é, igualmente, fundamental.
Fica, então, o convite.
São Paulo, 29 de outubro de 2021